JESSÉ SOUZA

Quinze anos de manobras enquanto muitas cifras da poluição jorraram pelos dutos

Quinze anos de manobras enquanto muitas cifras da poluição jorraram pelos dutos
Enquanto obra de Tucuruí eram travadas, população roraimense sofria com apagões (Foto: Divulgação)

Foram quase 15 anos de espera até a chegada definitiva da energia fornecida pelo Linhão de Tucuruí entre Manaus (AM) e Boa Vista, que entrou em operação no dia 16 passado, finalmente integrando Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Durante essa uma década e meia, foram muitas mentiras e manobras de políticos, os quais sempre tentaram se passar como o “pai da criança”.

Porém, muitas forças nem tão ocultas agiram para emperrar o projeto, pois havia um interesse milionário em jogo diante da dependência de termelétricas movidas a diesel, que faturavam alto em Roraima. Para se ter noção das cifras, de janeiro a agosto de 2024 o Estado teve que gastar cerca de R$ 324 milhões em combustível para manter as usinas funcionando, valor este que representa cerca de 53 milhões de dólares.

Não foi difícil manter essa farsa. Bastou jogar a culpa nos povos indígenas e nas “Ongs ambientalistas”, como sempre fizeram para manter o Estado de Roraima no cabresto dessa política mantida pela corrupção. Para isso, essas forças trabalharam para ignorar e não reconhecer a proposta de compensação às comunidades da Terra Indígena Waimiri-Atroari, emperrando as tratativas para que as obras deslanchassem no menor prazo possível.  

A consequência dessa manobra não poderia ter sido outra. A Justiça determinou que a continuidade da obra só poderia seguir se houvesse o pagamento da compensação ambiental ao atender um pedido do Ministério Público Federal (MPF) junto à 1ª Vara Cível da Justiça Federal do Amazonas, cobrando o valor de R$133 milhões exigidos pelo povo Kinja pela passagem de 123Km de linha de transmissão, cujo valor era “insignificante diante do lucro que será gerado pela exploração da matriz energética”.

A questão só foi resolvida em setembro de 2022, mediante a assinatura de um acordo na Justiça Federal entre União, Ministério Público Federal (MPF), a concessionária Transnorte Energia e a Associação Comunidade Waimiri Atroari (ACWA). Mas os entraves seguiram, enquanto muita grana rolava na compra de diesel para abastecer as máquinas de poluição que abasteciam o Estado. A questão era tão séria que, em 2021, Roraima liderou o ranking nacional de emissões de CO2 per capita, com 94 toneladas por habitante, que representava 15 vezes a média mundial, conforme o Observatório do Clima.

Os últimos acordos para que a obra prosseguisse representou um duro golpe na política energética brasileira. Tucuruí entrou como um penduricalho de contrapartida para aprovar a Medida Provisária (MP) 1.031 que privatizou a Eletrobras e representou o passo final para desestatizar o setor energético brasileiro, cujo significado para o consumidor brasileiro, especialmente o de Roraima, foi o pagamento de tarifa de energia mais cara. Foi só mais uma cena dentro do teatro da ludibriação.

Traduzindo: entregaram o setor energético para a iniciativa privada e deram de lambuja Tucuruí para outra empresa privada, um consórcio que terá uma receita anual permitida de R$395,6 milhões por um período de 27 anos, projeto este que recebeu um investimento de R$ 2,6 bilhões do Governo Federal. Valendo ressaltar que a obra foi licitada em 2011,   ainda no governo de Dilma Rousseff (PT), e foi concluída no atual governo Lula da Silva (PT).

Mas que ninguém pense que o linhão irá significar uma redenção imediata de Roraima. Enquanto se espera que uma matriz energética confiável possa desenvolver o Estado, um dos políticos que se diz “pai da criança” e que já foi indicado para um cargo vitalício, mas não larga o osso do mandato parlamentar, continua distribuindo presentes em vicinais inacessíveis no Sul do Roraima.

Ou seja: o desenvolvimento só irá chegar, de verdade, quando essa forma de fazer política for dizimada. Então, é possível imaginar o que ainda nos aguarda até uma redenção econômica chegar. O Linhão de Tucuruí é apenas um processo longo, assim como ocorreu com outros empreendimentos.   

*Colunista

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