Cultura

Cultura gastronômica atravessa fronteiras de Roraima

Ramo alimentício internacional já faz parte do cotidiano roraimense, ganha cada vez mais público e fomenta economia local

Você já imaginou que um dia comeria peixe cru? E que poderia experimentar a carne preparada conforme a cultura árabe ou sentir a pimenta mexicana? A globalização não se resume à tecnologia e se estende à aproximação das culturas de diversos países em um único lugar. Roraima, com a tradicional farinha de mandioca e paçoca de carne seca, já tem espaço para esses novos paladares.

Mesmo entre duas fronteiras, o ramo culinário internacional no Estado ainda era tímido até poucos anos atrás. Contudo, a chegada de franquias e a quebra de barreiras permitiram que houvesse a expansão desse novo cenário, cada vez mais certeiro no território roraimense.

Pelo menos uma vez ao mês, o analista de sistemas Josafá Mandulão come sushi. Ao contrário da cultura indígena em que nasceu, a preparação do peixe de uma forma diferente era a chance de conhecer novas experiências.

“Gostar de uma comida de um país que nunca visitou é bem diferente, mas eu acho que para poder definir do que se gosta tem de experimentar. Se tivesse oportunidade, experimentaria comida de todos os países possíveis”, relatou.

O analista ressalta que o acesso mais fácil às comidas internacionais é benéfico para a aproximação cultural. Para ele, seria ótimo que fosse possível que pessoas do exterior pudessem experimentar a damurida, prato típico de peixe com pimenta, e ter mais conhecimento sobre a Região Norte. “Tem um sabor, é um modo de preparo. Mas tem outros e vejo isso, conhecer é bom”, enfatizou.

ABERTURA – Há nove anos no mercado, uma rede de restaurante japonês se consolidou em Roraima. Numa população formada por migrantes, a demanda de pessoas que já gostavam de sushi e procuravam pela comida era grande e assim se abriram as portas para esse novo público.

“Hoje, são diversas lojas espalhadas pela cidade. Isso passa para novas pessoas, que acabam aderindo. E está em pleno crescimento. Pelo menos 50% da população hoje é adepta dessa culinária”, disse o gerente Anderson Santana.

A Itália fica do outro lado do Japão, mas em Roraima basta atravessar o corredor de um shopping local para saborear um prato de massas. A pizzaria é franqueada de São Paulo e chegou ao Estado após um estudo de mercado mostrar que por aqui o consumo de pizzas e lasanhas é preferido dos consumidores. Esta é apenas uma das variedades encontradas em toda a extensão da cidade, que tem a diversidade local e internacional ao mesmo tempo muito forte.

(Foto: Priscilla Torres/Folha BV)

Roraima é formado por diversidade cultural, avalia antropólogo

O fomento da culinária é uma forma de introdução de hábitos e práticas novas na cultura local, conforme avalia o antropólogo Édio Barbosa. Segundo ele, a cultura é dinâmica, portanto, modifica-se com o tempo.

“Nós temos essas alterações sendo promovidas por fatores internos e externos. O exemplo da culinária se enquadra nos fatores externos. Eles são mais perceptíveis e imediatos”, afirmou.

Em Roraima, há uma diversidade cultural que alcança diferentes classes. Tanto com os vocabulários Inglês e Espanhol, como com a influência direta das línguas indígenas.

“Passamos a ouvir ritmos, a aderir estilos de roupas e maquiagens, a formar relações diferentes. Ou seja, o nosso modo de ser, agir e sentir foi alterado ao longo do tempo, no contato com o ‘outro’”, completou.

O antropólogo enfatizou que as crianças inseridas nessa nova sociedade globalizada terão mais facilidade para se relacionar com pessoas de diferentes culturas e não terão ações xenófobas.

Ramo alimentício fomenta economia local

Para a economia local, a abertura dessas lojas é positiva. Com mais empregos, há o aumento da renda em circulação.

“Apesar da crise que tivemos em Roraima, a iniciativa privada teve uma melhora. Mesmo com alguns dados demonstrando demissão, no geral, acabou tendo um saldo positivo no setor de comércio, segmentos de alojamento e alimentação”, avaliou o economista Fábio Martinez.

Os riscos para esse tipo de negócio existem, de acordo com o especialista, seja pela simples falta de faturamento para manter a estrutura montada. Mas é um risco que deve ser tomado para quem tem o interesse em abrir um empreendimento no ramo. A Federação do Comércio do Estado de Roraima (Fecomércio) contabilizou que o saldo de empregos em restaurantes fechou em 85 postos no ano de 2018.

Outras localidades já têm interesse na culinária roraimense

A falta de barreiras na culinária permite que, além de conhecer a cultura de outros países, as pessoas tenham o conhecimento da comida roraimense. De acordo com o chef Beto Beline, Roraima é um Estado com características peculiares que ainda chamam atenção de quem não conhece a região.

“Há certo mistério, sobretudo às questões indígenas que são muito fortes por aqui. Convivemos com isso lado a lado, diferentemente de outros lugares em que há um maior distanciamento. Isso gera uma áurea exótica. A gastronomia de Roraima representa várias culturas diferentes que ajudaram a construir este Estado. Eu chamo de um ‘caldeirão cultural’, um mini Brasil dentro do Brasil”, destacou.

O chef revelou que os insumos da região já estão sendo introduzidos aos poucos em outros Estados e que já há um interesse para o conhecimento da culinária roraimense, que vai do beiju até a damurida. (A.P.L)