Em entrevista ao programa Agenda da Semana neste domingo (13), o ex-conselheiro do Tribunal de Contas de Roraima, Manoel Dantas Dias, fez um balanço crítico de suas quase três décadas no controle público. Com linguagem direta e exemplos concretos, o experiente auditor pintou um quadro preocupante sobre a eficácia da fiscalização no Brasil.
Nascido no interior do esstado, Dantas iniciou sua trajetória em salas de aula improvisadas na região do Tepequém. “Minha mãe e tias eram casadas com garimpeiros. Estudei numa escola isolada que funcionava na igreja, na época nem sabiam direito qual santo colocar, acabaram colocando São Paulo e São Pedro juntos”, recordou.
Sua formação em Ciências Contábeis e Direito o levou ao Tribunal de Contas do Pará, onde foi primeiro lugar no concurso. “Quando o Brigadeiro Otamar me trouxe para Roraima em 1990, eu tinha que criar a auditoria estadual do zero. Fiquei mais de dez anos nessa missão antes de virar conselheiro”.
Com a autoridade de quem viu o sistema por dentro, Dantas foi incisivo. “Quando entrei, os Tribunais de Contas pareciam cartórios do século XIX. Julgávamos contas de dez anos atrás, quando o gestor já tinha morrido ou sumido com o dinheiro. Era um teatro da inutilidade”.
O ex-conselheiro explicou a evolução para um modelo mais ágil. “Hoje fazemos auditorias concomitantes. No caso dos livros didáticos em Roraima, priorizamos que as crianças recebessem o material e depois apuramos as irregularidades. Essa é a mudança de mentalidade que precisamos”.
Sobre o polêmico tema da vitaliciedade, Dantas apresentou uma visão matizada: “A ideia original era nobre – proteger o julgador de pressões políticas. Mas vi muitos colegas que, após 20 anos no cargo, perdiam o entusiasmo e a atualização técnica. O sistema atual não tem mecanismos para lidar com isso”
Questionado sobre a idade mínima de 35 anos, defendeu: “Julgar requer maturidade de vida. Um jovem de 25 anos pode ser brilhante tecnicamente, mas falta a experiência para entender certas nuances da administração pública”.
Sobre o escândalo de São Luiz do Anauá, onde um município de 5 mil habitantes recebeu R$ 100 milhões em emendas, Dantas foi pragmático. “O TCE apura a irregularidade administrativa, mas o crime é do MP. Essa divisão cria uma zona cinzenta onde o dinheiro some e ninguém vai preso”
E completou com um exemplo contundente. “É como ver um assalto ocorrendo e só poder multar o ladrão por estacionamento irregular. A população percebe essa desconexão e perde a fé no sistema”.