Política

Bolsonaro negocia diretamente com as bancadas

Equipe do presidente eleito, tenta se equilibrar entre indicações próprias e nomes que agradem a aliados

A decisão de colocar Ricardo Vélez Rodríguez no Ministério da Educação mostra que a cota individual de escolha dos futuros auxiliares para o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL) pode se esgotar. A pressão da bancada evangélica contra a indicação do professor Mozart Neves, diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna, faz parte do jogo. A cúpula política do governo de transição quer evitar desgastes com aliados, para começar a gestão com o poder de governabilidade aguardado.

A escolha por Vélez não foi uma indicação da bancada evangélica, que preferia o procurador Guilherme Schelb. Mas agrada aos religiosos, visto pelo setor como um defensor do Escola sem Partido, diferentemente de Mozart. O Correio apurou que o diretor do Instituto Ayrton Senna era o mais cotado, mas o escolhido por Bolsonaro tem uma ligação bem próxima com a ideologia defendida pela bancada.

Em carta divulgada ontem, Vélez revela o desejo de colocar a gestão educacional do país e a elaboração de normas no contexto da “preservação de valores caros” à sociedade brasileira que, na avaliação dele, é conservadora. “E avessa a experiências que pretendem passar por cima de valores tradicionais ligados à preservação da família e da moral humanista”, destacou.

O ministro indicado é favorável ao Escola sem Partido. Sugeriu que o país precisa de uma educação que não seja instrumentalizada com “finalidade político-partidária”. “(E) Sim a uma educação que olha para as pessoas, preservando os seus valores e a sua liberdade”, sustentou. O teor da carta agradou aos parlamentares evangélicos. Porém, os perfis destoantes entre os nomes cogitados indicam que Bolsonaro está mais suscetível a ceder a pressões, pondera o cientista político Enrico Ribeiro, coordenador legislativo da Queiroz Assessoria Parlamentar e Sindical.

A tendência de um governo suscetível a influências de frentes parlamentares, alerta Ribeiro, deve se repetir ao longo do governo. “As bancadas vão cobrar postura de interesse delas”, analisou. A causa é uma consequência da própria articulação de Bolsonaro que, para evitar o fisiologismo político — o famoso “toma lá da cá” — optou por negociar com bancadas. “Na prática, ele não vai ter uma vida relativamente fácil. A prova disso é o fato de deputados eleitos na esteira do discurso bolsonarista estarem cobrando coerência dele”, acrescentou o analista da Queiroz.

Bolsonaro tentou apagar o incêndio entre integrantes do PSL marcando presença em uma reunião com integrantes do partido na quarta-feira, mas só isso é insuficiente, avalia o cientista político Creomar de Souza, professor da Universidade Católica de Brasília (UCB). “Então, o poder de escolha da frente evangélica faz sentido. Nomes que foram ventilados, e não agradaram, acabaram vetados”, explicou.

Líderes da bancada evangélica admitem ter conversado na quarta-feira com o futuro ministro-chefe da Casa Civil e coordenador do gabinete de transição, Onyx Lorenzoni (DEM), mas negam ter pressionado Bolsonaro e equipe. “A escolha dele não foi fruto da nossa pressão, pois, segundo o que o ministro disse, foi um nome plantado pela imprensa. Apenas fomos levar a nossa insatisfação caso houvesse, de fato, a intenção de indicá-lo”, justificou o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ).

*INFORMAÇÕES: Correio Brasiliense.