
O decreto que oficializou a promoção de oficiais da Polícia Militar de Roraima nesta segunda-feira, 29, trouxe à tona questionamentos sobre os critérios adotados pelo governo do Estado para as promoções. Entre os militares promovidos, constam oficiais que respondem a investigações e ações penais por crimes como violência doméstica, ameaça, lesão corporal e racismo.
Conforme o Decreto nº 39.757-E, publicado no Diário Oficial do Estado em 26 de dezembro de 2025, três tenentes-coronéis foram promovidos ao posto de coronel pelo critério de merecimento.
O mesmo decreto também promoveu seis majores ao posto de tenente-coronel. Dentre os nomes listados está o major Jefferson Gomes da Silva, que figura como réu em ação penal pelos crimes de lesão corporal dolosa, ameaça e racismo, após episódio envolvendo um frentista. O processo segue em andamento, sem trânsito em julgado.
As promoções foram assinadas pelo governador do Estado, Antonio Denarium, e tiveram efeito retroativo a 25 de dezembro de 2025, com base na legislação que rege as promoções dos oficiais da Polícia Militar de Roraima. O texto do decreto não faz qualquer menção à existência de investigações ou ações penais envolvendo os oficiais promovidos.
A cerimônia de promoção está marcada para ocorrer nesta terça-feira, 30, às 17h no Salão Nobre do palácio Senador Hélio Campos.
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Decisão liminar
Nesta segunda-feira, 29, a FolhaBV publicou matéria sobre o Tribunal de Justiça de Roraima ter determinado, por decisão liminar, a reserva de uma vaga para o posto de coronel, diante de indícios de irregularidades em processos promocionais anteriores, como erros administrativos e possível direcionamento de pontuações. A medida judicial tinha como objetivo evitar o esgotamento da única vaga disponível até o julgamento final da ação.
Embora a decisão não tenha suspendido integralmente o processo de promoção, a realização de novas promoções ao posto de coronel gerou questionamentos sobre o cumprimento da ordem judicial e sobre a observância de princípios como a moralidade e a impessoalidade na administração pública.
Moção de repúdio contra promoções foi aprovada pela ALERR em 2024
O Plenário da Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) aprovou, de forma simbólica, em setembro de 2024, a Moção de Repúdio nº 37/2024, protocolada pelo deputado Renato Silva (Podemos), contra a promoção de policiais suspeitos de cometerem agressão e racismo.
Na época, o parlamentar disse que iria acionar a justiça para barrar as promoções.
PM afirma que promoções seguiram critérios legais
A Polícia Militar de Roraima esclarece que as promoções publicadas no Diário Oficial do Estado obedeceram rigorosamente aos critérios legais previstos na legislação vigente que rege a carreira militar estadual.
No que se refere ao posto de coronel, a promoção ocorre por ato discricionário do chefe do Poder Executivo, conforme estabelece a legislação castrense, não se tratando de ato automático ou vinculado.
Sobre o militar citado na decisão judicial, a PMRR informa que a decisão não determinou sua promoção, mas apenas a reserva de vaga ao posto de coronel, em caráter cautelar, para eventual promoção futura, condicionada à existência de decisão judicial definitiva favorável, conforme expressamente consignado nos autos do processo. Dessa forma, não há descumprimento de ordem judicial.
Quanto aos oficiais promovidos por merecimento, a Polícia Militar de Roraima esclarece que a existência de investigação ou ação judicial em curso, sem condenação transitada em julgado, não constitui impedimento legal para promoção, em observância ao princípio constitucional da presunção de inocência.
Assim, não há qualquer irregularidade ou contradição entre o cumprimento das decisões judiciais e os atos administrativos publicados, permanecendo a Polícia Militar de Roraima fiel ao cumprimento da legalidade, da Constituição Federal e das determinações do Poder Judiciário.
Presunção de Inocência
Para o advogado especialista em Direito Administrativo e Militar, Gustavo Hugo de Andrade, a promoção de servidores que respondem a investigações ou ações penais sem condenação definitiva encontra respaldo no entendimento consolidado dos tribunais superiores. Segundo ele, o princípio constitucional da presunção de inocência garante ao militar o direito de concorrer em igualdade de condições enquanto não houver trânsito em julgado.
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça de Roraima é clara ao afirmar que, inexistindo condenação definitiva, não há impedimento legal para a progressão na carreira. Impedir a participação do militar nessas circunstâncias apenas posterga o problema e gera custos adicionais ao Estado”, explica.
O advogado acrescenta que, caso o processo venha a ser arquivado ou resulte em absolvição, o militar passa a ter direito à chamada promoção em ressarcimento de preterição. “Nesses casos, a Administração acaba sendo obrigada a promover o servidor retroativamente, com todos os reflexos financeiros, o que poderia ser evitado com a observância do devido processo legal desde o início”, conclui.