Recentemente, uma personalidade pública, de enorme alcance nas redes sociais, disse que a família tem culpa em casos de suicídio. A declaração feita em meio ao acalorado debate eleitoral para a gestão municipal da maior cidade do país demonstra, não só irresponsabilidade, mas também desconhecimento sobre um fenômeno que é complexo e multifatorial. Infelizmente, não se trata de um episódio pontual e o Brasil, apesar dos avanços alcançados nos últimos anos, parece ignorar que o suicídio é um problema de saúde pública. Embora não apresente taxas médias elevadas em um contexto global, é preocupante a tendência crescente de mortalidade por suicídio no Brasil e o aumento dos índices em populações específicas. Entre 2010 e 2021, as taxas de mortalidade subiram 42%, passando para 7,5 suicídios por 100 mil habitantes. Em 2021, mais de 15.500 pessoas morreram no país em decorrência do suicídio, o que significa uma morte a cada 34 minutos, de acordo com o Ministério da Saúde. Os dados oficiais mostram aumento dos índices na população mais jovem e entre os povos indígenas. Durante a Assembleia da Organização Mundial da Saúde, em 2013, o Brasil aprovou um acordo de redução da taxa de suicídio em 10% até 2020. Dessa data até então, como o tema foi tratado? Como as ações foram dirigidas para as populações com maior taxa de suicídio, aquelas que elevam a taxa nacional de mortalidade? Não encontramos respostas que permitam uma conclusão sobre o impacto das ações no comportamento suicida da população nesse período, inclusive porque o problema não foi considerado prioritário e, portanto, suas ações, mesmo quando realizadas, não foram coordenadas dentro de uma proposta estratégica. Por isso, a Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS) chama a atenção das autoridades federais, mais especificamente do Ministério da Saúde, para a urgência em reativar o Comitê Gestor responsável pela implantação da Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio. Criado em 2020, o comitê foi dissolvido há um ano e meio para designação de nova composição – após a mudança na gestão federal –, o que até agora não ocorreu. Sem um comitê gestor funcionando, atrasamos ainda mais a implantação de ações planejadas e duradouras, embasadas cientificamente e com dotação orçamentária. A formação de Comitês locais, municipais ou regionais, pode constituir experiências de organização na sociedade em torno de um problema que a impacta. É importante a participação de associações diversas de profissionais e comunitárias, forças de segurança, instituições religiosas, associações de sobreviventes enlutados e todos que queiram participar, motivadas pelo problema do suicídio em um determinado ambiente. A prevenção do suicídio exige ações coordenadas em várias esferas. O V Congresso Brasileiro de Prevenção do Suicídio debate, de 8 a 10 de agosto, abordagens inovadoras, pesquisas recentes e estratégias eficazes na prevenção do suicídio. Realizado em Brasília, mas também com possibilidade de acompanhar a programação online, o evento vai tratar de temas como as políticas públicas de prevenção, suicídio e envelhecimento, as novas tecnologias, prevenção no contexto escolar e o impacto nas populações indígenas. Precisamos falar de prevenção do suicídio o ano todo, não apenas no mês de setembro. Sabemos que não é tarefa fácil e nenhuma sociedade, em tempo algum, conseguiu impedir todos os casos. Mas, se não todas, considerável porção de mortes pode ser evitada.
Início Últimas Notícias Opinião
OPINIÃO
Suicídio: um ato complexo
Carlos Felipe Almeida D’Oliveira, médico e presidente da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS)
Mais notícias
Mais artigosOPINIÃO
“Likes” destrutivos: infâncias roubadas, adultos infantilizados
OPINIÃO
Crianças no semáforo
“Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele.” (Provérbios 22: 6). Os pedintes de esmolas nas esquinas de Boa Vista/RR, não podiam agir dessa forma, pois segundo comentários, essas pessoas, inclusive os deficientes físicos, até prova contrária, recebem o BPC/LOAS do INSS, mas assim mesmo continuam pedindo […]
OPINIÃO
O potencial transformador das juventudes brasileiras
Historicamente, a taxa de desemprego da população jovem no Brasil é bastante alta. Problemas como a falta de experiência e a baixa qualificação contribuem para esses índices. Mas um estudo divulgado recentemente pelo Ministério do Trabalho e Emprego trouxe boas notícias em relação a essa questão. A taxa de desemprego entre os jovens caiu de […]
OPINIÃO
Pacto Antenupcial: O que é e por que fazer?
Vai casar? Então é hora de pensar também na parte jurídica da união. O pacto antenupcial é um documento feito no cartório que permite ao casal escolher o regime de bens que vai valer durante o casamento, além de definir responsabilidades ao casal. O pacto antenupcial é um contrato solene firmado entre os […]