OPINIÃO

Marina Silva: Entre o Compromisso Ambiental e os Ataques Misóginos no Senado

Ronildo Rodrigues dos Santos

Cientista Social

Na tarde de terça-feira, 27 de maio de 2025, o Senado Federal protagonizou um episódio lamentável que expôs, com crueza, a resistência de setores conservadores às pautas ambientais e a persistência de atitudes misóginas no coração do poder legislativo brasileiro. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, foi alvo de ataques pessoais e ofensas durante uma audiência pública na Comissão de Infraestrutura. A sessão, que deveria ser um espaço de diálogo sobre a criação de quatro unidades de conservação marítimas no Amapá — medida alinhada com os compromissos internacionais do Brasil no combate às mudanças climáticas — acabou transformada em um palco de desrespeito institucional, discursos raivosos e agressões que nada têm a ver com a função pública que aqueles senadores deveriam exercer.

O senador Plínio Valério (PSDB-AM) expressou uma das falas mais ofensivas ao afirmar que gostaria de “separar a mulher da ministra”, dizendo que a mulher merecia respeito, mas a ministra não. Tal frase, além de profundamente desrespeitosa, desvela um tipo de violência política que visa desqualificar a atuação de uma mulher pública justamente por ela se posicionar com firmeza em defesa do meio ambiente e da legalidade. Não bastasse isso, o senador Marcos Rogério (PL-RO), presidente da comissão, agiu de maneira grosseira e autoritária ao tentar interromper Marina Silva, ironizando sua postura e exigindo que ela “se colocasse no seu lugar”. Quando a ministra reagiu dizendo que não era uma mulher submissa, ouviu como resposta: “Agora é sexismo, ministra? Me respeite. Se ponha no seu lugar”. Não é aceitável, em hipótese alguma, que uma autoridade legitimamente convidada a uma audiência pública seja tratada com tamanha hostilidade, especialmente por representar, com sua presença, não apenas o governo, mas uma trajetória de décadas em defesa da vida e da sustentabilidade.

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Marina Silva é uma das vozes mais respeitadas do planeta quando o assunto é meio ambiente. Nascida em um seringal no Acre, analfabeta até os 17 anos, formou-se em História e tornou-se uma das mais reconhecidas líderes socioambientais do mundo. Foi senadora, ministra, candidata à presidência da República em três eleições e coleciona prêmios internacionais, como o “Champions of the Earth”, das Nações Unidas, e o Prêmio Sophie, da Noruega. Sua história é exemplo de superação, inteligência política e compromisso ético. Seu retorno ao Ministério do Meio Ambiente no atual governo tem promovido uma guinada significativa na agenda ambiental brasileira. Sob sua gestão, o desmatamento caiu mais de 60% em menos de dois anos. E mais: suas políticas sustentáveis contribuíram para abrir ou manter negócios com quase 200 mercados internacionais. O agronegócio brasileiro, quando comprometido com boas práticas, é valorizado globalmente justamente por causa da credibilidade que gestoras como Marina Silva emprestam à imagem do país. Ao contrário do que sugerem seus detratores, ela não é inimiga da produção rural; é aliada da agricultura responsável, que compreende que cuidar da natureza é também garantir a continuidade dos negócios e da vida.

Por isso, foi particularmente vergonhoso assistir a um grupo de homens — senadores da República — usando o microfone do Senado para desferir ataques agressivos, debochados e misóginos contra uma mulher pública que jamais fugiu do debate. Esses homens não estavam ali para construir, mas para desqualificar. Seus discursos, marcados por um tom raivoso, violento e desumano, ignoram não apenas a compostura mínima esperada de um parlamentar, mas também os direitos das pessoas mais vulneráveis, que são as primeiras a sofrerem com os efeitos das mudanças climáticas. O negacionismo ambiental, travestido de falsa defesa do desenvolvimento, revela um Senado ainda alheio às pautas ambientais mais urgentes do nosso tempo. É justamente a falta de compromisso com essas questões que aprofunda o sofrimento de populações humildes, que veem suas casas serem arrastadas por enchentes, suas lavouras secarem pela estiagem e seus modos de vida desaparecerem sob o avanço desordenado de uma lógica extrativista e predatória.

O que se viu no Senado foi mais do que um ataque à ministra Marina Silva. Foi um ataque ao meio ambiente, à ciência, ao bom senso e, sobretudo, a todas as mulheres que ousam ocupar posições de liderança com coragem e competência. Marina representa uma política de Estado, não de ocasião. E os que a atacam com violência e desrespeito apenas revelam o quanto ainda estamos distantes de uma política verdadeiramente comprometida com o futuro do Brasil e do planeta. Esses episódios, ainda que revoltantes, devem servir como alerta: não se constrói um país justo e sustentável calando as vozes que lutam pela vida.

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