NOS BASTIDORES DA BOLA

Preparador físico roraimense revela os desafios por trás do apito inicial

Moisés Loureiro fala sobre o trabalho silencioso que mantém atletas em campo e comenta a nova fase no GAS

Preparador físico roraimense revela os desafios por trás do apito inicial

Emprestado ao Grêmio Atlético Sampaio (GAS) junto com a comissão técnica liderada por Chiquinho Viana, o preparador físico Moisés Loureiro segue trabalhando com atletas de alto rendimento na disputa da Série D do Campeonato Brasileiro.

Em entrevista à FolhaBV, ele falou sobre os bastidores da preparação física no futebol roraimense, destacou os desafios enfrentados durante o estadual pelo São Raimundo e explicou como vem conduzindo o trabalho com o elenco do Leão dourado.

Ex-atleta de futsal, Moisés atuava como goleiro até o momento em que precisou deixar os treinos para começar a trabalhar. A virada veio após uma conversa com um antigo professor, com quem já havia ajudado na preparação de goleiros da base. “Voltei a ajudar ele nos treinos e acabei sendo incluído no trabalho da escolinha de futebol. Comecei ali, na escolinha do Flamengo, no Jardim Floresta, e fui pegando experiência”, conta Moisés.

Com o incentivo de um amigo, decidiu cursar Educação Física. “Ele falou: ‘Tu já tá dentro, já trabalha com isso, por que não faz a faculdade?’ E aí uma coisa foi levando à outra.” A partir dali, Moisés passou a se dedicar à preparação física de atletas, primeiro na base, depois no amador e, por fim, no futebol profissional.

Entrada no profissional

A primeira oportunidade no futebol profissional veio em 2021, com o São Raimundo. Desde então, ele esteve envolvido diretamente na preparação física dos atletas, inclusive no sub-20 que disputou a Copinha de 2022. “A gente caiu numa chave com o Internacional, atual campeão na época. Foi pesado, mas uma experiência que abriu os olhos sobre o nível competitivo fora daqui”, conta Loureiro.

Durante o estadual de 2023, o desafio foi outro, o calendário apertado. “Era jogo atrás de jogo, quase sem tempo de recuperar. Tivemos que poupar atletas, ajustar a carga. A pré-temporada daquele ano foi a melhor que a gente teve desde que estou no clube”, diz o preparador físico.

Calendário apertado e desgaste

Além do Campeonato Roraimense, o São Raimundo ganhou uma vaga inesperada na Copa Verde após a desistência de clubes como Cuiabá e Atlético-GO. Com apenas 15 dias para se preparar, a comissão técnica montou uma pré-temporada mais leve, focado em força, velocidade e potência, sem repetir o modelo de treinos em dois turnos que gerava sobrecarga nos anos anteriores. “Foi a melhor pré-temporada desde que estou no clube. Trabalhamos com equilíbrio e conseguimos deixar os atletas prontos para a estreia”, afirmou Moisés


A experiência do grupo, que já conhecia bem o modelo de jogo intenso do técnico Chiquinho Viana, foi essencial para a boa campanha que culminou com a inédita semifinal da Copa Verde, um feito histórico para o futebol roraimense.

No entanto, o calendário apertado trouxe consequências. Viagens longas, pouco tempo de recuperação entre os jogos e número limitado de passagens dificultaram a logística. “A gente jogava praticamente dia sim, dia não. Isso não é compatível com o rendimento de um atleta que precisa de pelo menos 48 horas para se recuperar”, explica o preparador físico.

O resultado foi o aumento das lesões e a queda de desempenho em momentos decisivos, como na derrota para o Rio Negro, que quebrou uma invencibilidade de 19 anos. “Chegou um ponto em que a gente parou de treinar. Só mantinha o trabalho e entregava os atletas para o jogo. Quem não chegou bem condicionado da pré-temporada, não conseguiu manter o nível”, disse Moisés.

A semifinal contra o GAS, sob sol forte no Canarinho, foi o ponto final da campanha prejudicada, segundo Moisés, pela sequência pesada de jogos e pela falta de tempo para recuperação adequada.

Chegada ao GAS e reformulação do grupo

Com o fim do estadual, o São Raimundo ficou sem calendário e, como de costume, liberou os profissionais até a próxima temporada. Foi então que veio um convite inesperado: o técnico Chiquinho Viana, emprestado ao GAS, indicou o nome de Moisés para compor a nova comissão. Além da indicação, membros da diretoria do clube já vinham acompanhando o trabalho dele e consideravam seu nome para reforçar a equipe física do Leão.

Chegou e encontrou uma realidade bem diferente. “Os atletas estavam abaixo fisicamente. Para o estilo de jogo do professor Chiquinho, só três ou quatro estavam aptos. A gente teve que reformular tudo”, disse o preparador.

A estratégia foi reduzir carga, focar na prevenção e melhorar aspectos como alimentação, sono e suplementação. Deu resultado: “O número de lesões caiu em 80%. O fisioterapeuta comentou isso. É um trabalho que vai além do treino em campo.”

Ele também falou sobre os casos mais comuns entre os atletas. “Lesão muscular, principalmente na posterior da coxa, é a que mais tira jogador de competição. Tem que cuidar com treino, alimentação e descanso. E até mesmo as cãibras mostram quando algo não tá certo.”

Atualmente cursando pós-graduação em Fisiologia do Exercício, Moisés acredita que o futebol local pode crescer muito se tiver mais estrutura. “Lá fora tem GPS, exames precisos. Aqui, a gente vai no diálogo, perguntando como o atleta tá, como dormiu, como se sentiu. É no olho, na conversa”, reata o profissional.

Mesmo com os desafios, ele segue firme. “Trabalhar com futebol é isso: entender que o atleta não é máquina. Ele precisa estar bem por dentro e por fora. E esse cuidado começa bem antes do apito inicial.”

ML treinamento

Paralelo ao trabalho nos clubes profissionais, Moisés também comanda a ML Treinamento, projeto voltado à formação de atletas de base. O foco principal é desenvolver crianças e adolescentes para o alto rendimento, com treinos específicos de técnica, preparação física e coordenação motora. “Tem atleta que começou comigo aos cinco anos e hoje está no Fluminense. É o caso do Brian Lucas, roraimense, que hoje representa o estado no sub-10 do clube carioca”, conta com orgulho.

A ML funciona hoje no modelo de seleção: são escolhidos atletas com potencial, que passam a treinar com metodologia própria e a disputar torneios representando a equipe. A iniciativa já levou meninos para campeonatos como a Gol Cup, em Goiás, o maior campeonato infantil do mundo e para a Iberleague, no Amazonas, onde foi campeã na categoria sub-10 e vice no sub-11. “A ideia é preparar para competir em alto nível e abrir portas em clubes de fora”, explica.

Com poucos campeonatos de base sendo realizados em Roraima, o projeto sobrevive graças ao apoio de parceiros como o deputado Coronel Chagas e a vereadora Aline Resende, que ajudam a viabilizar transporte, estrutura e arbitragem. “Hoje, se não for por iniciativa nossa, os meninos ficam sem jogar. A gente organiza, corre atrás, convida escolinhas do interior e monta as competições. Porque talento a gente tem de sobra. O que falta mesmo é oportunidade”, completa Moisés.

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