Cotidiano

Venezuelanos fazem filas por combustíveis no único posto de Pacaraima

Problema expõe batalha judicial entre empresário e Prefeitura de Pacaraima em torno de autorização para abertura de um posto de combustíveis fixo na fronteira do Brasil com a Venezuela

Venezuelanos fazem filas por combustíveis no único posto de Pacaraima Venezuelanos fazem filas por combustíveis no único posto de Pacaraima Venezuelanos fazem filas por combustíveis no único posto de Pacaraima Venezuelanos fazem filas por combustíveis no único posto de Pacaraima

Num passado não tão distante, o brasileiro atravessava a fronteira para comprar gasolina barata na Venezuela. Mas hoje, o processo é inverso: o venezuelano cruza a divisa para adquirir o combustível como forma de driblar a crise de desabastecimento ou racionamento em seu País.

A Venezuela, dona de uma das maiores reservas mundiais de petróleo, chegou a produzir três milhões de barris por dia no final dos anos 1990. A produção diária diminuiu drasticamente e, no fim de 2021, voltou a atingir o patamar de 1 milhão.


Posto da PDVSA, fechado, em Santa Elena de Uairén, na fronteira da Venezuela com o Brasil (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

É nesse cenário que venezuelanos de Santa Elena de Uairén vão a Pacaraima, na fronteira do Brasil com a Venezuela, para abastecer no único posto de combustíveis provisório na cidade. Construído há três anos, o local funciona das 7h às 19h e vende gasolina a R$ 7,70 e o óleo diesel a R$ 7,50 – preços semelhantes aos praticados no lado vizinho.

A alta procura tem culminado em grandes filas no estabelecimento. Pressionado pela população do Município, o posto precisou organizar carros com placa brasileira e venezuelana em duas filas. “Se não criasse a fila, teria confusão. Muitos brasileiros daqui não iriam conseguir abastecer seu carro”, explicou o gerente Alexsandro Matos Abreu.

Um dos clientes do posto é o taxista venezuelano Giover Velasquez, que citou o desabastecimento em Santa Elena de Uairén, onde mora. “A solução é vir para o Brasil. Vou colocar 100 reais”.

“Chega muito pouco combustível em Santa Elena. Não conseguem atender todo mundo. O limite de abastecimento lá é de 20 litros por veículo”, relatou o dentista Miguel Moura, dono de uma clínica médica em Santa Elena de Uairén.


Posto organizou duas filas após reclamação de brasileiros (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

Por outro lado, a reclamação dos brasileiros é sobre o preço dos combustíveis após o último reajuste da Petrobras. “Como os venezuelanos não têm gasolina, o fluxo aumentou, mas não tá tão difícil não, tá tranquilo. Mas o preço da gasolina tá alto, salgado”, pontuou o taxista convencional Joziel Oliveira, que abastece a cada dois dias.

O motorista Franksmar Souza de Santos acredita que a abertura de mais um posto no Município poderia resolver as filas. “Mas não adianta colocar dez postos se o preço fica o mesmo, ou mesmo aumentar”.

Posto pronto


Dono de posto pronto há mais de um ano pede na Justiça autorização para empreendimento funcionar (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

Com a falta de um posto permanente, empresários decidiram construir dois estabelecimentos fixos no Município. Um deles está pronto há um ano e o dono, o mesmo que administra o posto temporário, reclama, desde outubro, por meio de mandado de segurança na Justiça de Roraima, que o pedido pela certidão de viabilidade está parado na Prefeitura de Pacaraima, sem justificativa.

Em novembro passado, o prefeito Juliano Torquato (Republicanos) foi obrigado a analisar o pedido, sob pena de multa diária de R$ 1 mil. Mas, sem resposta, o chefe do Poder Executivo ganhou mais dez dias para se manifestar, o que não aconteceu nos autos.

Com isso, em fevereiro, o juiz de Pacaraima, Cleber Gonçalves Filho, deu prazo de 48 horas para Torquato conceder a carta de viabilidade, sob pena de multa diária de R$ 5 mil. O prefeito recorreu da decisão, mas teve o pedido negado.

No momento, o processo aguarda manifestação do Ministério Público Estadual (MPE-RR). O órgão informou à FolhaBV que o prazo iniciou na última terça-feira (22) e segue até 1º de abril. “Nesse período, a Promotoria de Justiça analisará os autos e as provas anexadas, para emitir o parecer final e remeter o processo novamente ao Judiciário para fins de sentença”, explicou.

Motivo pessoal?

A situação motivou a população local a colher mais de 300 assinaturas em um abaixo-assinado, protocolado na Câmara Municipal de Pacaraima, como forma de pressionar a Prefeitura a autorizar a abertura dos postos.

Sobre o empreendimento do empresário que move ação na Justiça contra o Poder Executivo, o vereador Júnior da Teia (PRTB) relatou que o prefeito não libera a carta de viabilidade por motivo pessoal. “Ele deixou claro pra mim que a única situação a ser feita é dar carta de viabilidade para o dono do posto, pro empresário, só que ele, por problemas e situações pessoais com o empresário, falou que, enquanto ele tivesse ali como prefeito, ele não vai dar essa carta”, disse o parlamentar, que avalia que a situação prejudica a geração de empregos em Pacaraima, que, por sua vez, deixa de recolher mais receitas por meio de impostos.

“O que era da nossa parte, fizemos. Encaminhamos o documento ao MP [Ministério Público] e pedimos resposta do prefeito”, disse a presidente da Câmara, vereadora Dila Santos (Solidariedade).

O que dizem os envolvidos

O prefeito Juliano Torquato disse que não pode emitir a carta de viabilidade ao posto porque isso depende de autorização do Ibama, pois o Município de Pacaraima está dentro de uma terra indígena. Ele rechaçou a ideia de que não concede carta de viabilidade por uma questão pessoal, ao alegar que está guardando o Município de ser, futuramente, multado por obra que funcione sem licenciamento ambiental.

“O que burocratiza Pacaraima, na questão de licença ambiental, é que o Município fica dentro de terra indígena. Da minha parte de gestão pública, a ideia é privar o Município de, futuramente, responder um processo […]. Pacaraima tem multas milionárias por obras sem licenciamento ambiental. Tou prevendo que o Município não pague mais caro, como no passado”, explicou, dizendo que recorreu novamente da decisão judicial e que aguarda nova sentença do caso.

Por sua vez, o advogado do posto, Felipe Tomas da Luz, disse que a decisão do prefeito de conceder ou não a certidão de viabilidade independe da emissão de licenças ambientais por outros órgãos. Além disso, ele reforçou que o funcionamento de um posto em Pacaraima, por si só, já demonstra que é viável um estabelecimento como esse no Município.

“Carta de viabilidade não tem nada a ver com licença de operação ambiental. Ela é o primeiro passo no processo de construção do posto de combustível, onde o interessado pelo empreendimento leva até a Prefeitura, que fala: ‘é viável um posto de combustível aqui na cidade’”, explicou.

Perfil Lucas Luckezie
Lucas Luckezie

Jornalista

Formado pela UFRR. Iniciou a carreira em 2013 na Folha, onde está em sua 2ª passagem. Já trabalhou na Câmara de Boa Vista e na afiliada da TV Globo (Rede Amazônica), além de ter colaborado com SporTV, Globo e CNN Brasil. Tem experiência multimídia como repórter, apresentador, editor-chefe e assessor.

Formado pela UFRR. Iniciou a carreira em 2013 na Folha, onde está em sua 2ª passagem. Já trabalhou na Câmara de Boa Vista e na afiliada da TV Globo (Rede Amazônica), além de ter colaborado com SporTV, Globo e CNN Brasil. Tem experiência multimídia como repórter, apresentador, editor-chefe e assessor.

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