Um marco histórico para o acesso à justiça indígena no país, a unidade criada pela Defensoria Pública do Estado de Roraima, é a primeira do tipo e totalmente gerida por agentes indígenas (Foto Defensoria Publica de Roraima)
Um marco histórico para o acesso à justiça indígena no país, a unidade criada pela Defensoria Pública do Estado de Roraima, é a primeira do tipo e totalmente gerida por agentes indígenas (Foto Defensoria Publica de Roraima)

Localizada na divisa entre Roraima e Amazonas, às margens da BR-174, a Terra Indígena Waimiri Atroari abriga um marco histórico para os povos originários do Brasil: a 1ª Central de Atendimento e Peticionamento Inicial Indígena (CAPI). Criada para garantir que os Waimiri Atroari — ou Kinjas, como se autodenominam — tivessem acesso à documentação e à justiça sem precisar sair de seu território, a CAPI é gerida integralmente por agentes indígenas, consolidando-se como um exemplo de autonomia e fortalecimento comunitário.

O Núcleo de Apoio Waimiri Atroari (NAWA) comemora quatro anos de funcionamento da central, que se tornou referência nacional em protagonismo indígena na gestão de serviços públicos. Desde agosto, a comunidade alcançou mais um passo importante: com a parceria entre a Associação Comunidade Waimiri Atroari e a Receita Federal, o CPF passou a ser emitido dentro do território indígena. Em poucos meses, já foram realizados 193 atendimentos para emissão do documento.

A medida nasceu de uma demanda direta dos próprios Kinjas, expressa durante visita de representantes da Receita Federal à aldeia. Hoje, são os próprios indígenas, capacitados pela Defensoria Pública e pela Receita, que realizam todo o atendimento — uma conquista que reafirma o princípio da autonomia e da autogestão.

Com cerca de 2.700 indígenas vivendo na Terra Waimiri Atroari, a CAPI ultrapassa a função de emissão de documentos. O espaço se transformou em um símbolo de fortalecimento cultural e aproximação institucional entre o povo Kinja e o Estado brasileiro, sem que isso signifique perda de identidade ou dependência externa.

“A aceitação da comunidade é o que mostra o sucesso do projeto. Eles se apropriaram da iniciativa e a transformaram em um exemplo de autonomia indígena”, afirma a defensora pública Elceni Diogo, responsável por acompanhar a implantação da central.

O modelo Waimiri Atroari já foi reconhecido nacionalmente, recebendo o primeiro lugar no Concurso de Práticas Exitosas do Congresso Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (CONADEP), em 2022. Inspirada pela experiência, a Defensoria, em diálogo com as comunidades, planeja expandir o modelo para os povos Ingarikó e Wai-Wai, fortalecendo a presença indígena na condução de políticas públicas.

Mais do que uma iniciativa institucional, a CAPI representa um passo concreto na construção da autonomia indígena e no exercício pleno da cidadania dentro dos próprios territórios, reafirmando o papel dos povos originários como protagonistas da sua história e de seu futuro.