Cotidiano

Pecuarista denuncia que Mafirr deixou gado sem alimento durante sete dias

Transportadores responsáveis pela entrega do gado também reclamam que foram proibidos de deixar animais no curral

Pecuarista denunciou à Folha que o Matadouro e Frigorífico Industrial de Roraima (Mafirr) manteve, por sete dias, o gado dentro dos currais, sem alimento. Os animais chegaram ao prédio antes de ser interditado, na segunda-feira, 06, devido à quebra de uma peça do abatedouro. A peça foi consertada no dia seguinte e, na manhã de ontem, 09, voltou a ser permitido abater e levar novos animais para o local.

O pecuarista José Luís Zago havia levado 43 bois e vacas para o frigorífico ao meio-dia da sexta-feira, 03, para ser abatido na segunda-feira seguinte. Mas ele disse que o médico veterinário do Mafirr não permitiu o abate, nem alimentou os animais nos dias a mais que passaram no curral. Zago registrou imagens de seu gado magro e machucado devido ao atrito do casco de sua pata com o concreto do curral. Segundo ele, vários produtores ficaram na mesma situação.

“Se eles tivessem avisado que não entrariam mais animais, porque iriam interditar, tudo bem. Mas fechar com o gado lá dentro? E depois de consertada a máquina? São maus-tratos aos animais. A gente cria o boi, o alimenta, para chegar lá e passar fome. Depois que for abatido, ele pode nem servir para muita coisa, pois fica machucado e estressado”, lamentou.

DESCARREGAMENTO – Os motoristas que trabalham com o transporte do gado para o Mafirr também se sentiram prejudicados. Muitos precisaram retornar para as cidades de origem com os animais nas carretas e caminhões. O descarregador Rosenildo Peixoto disse que alguns animais morreram nesta semana durante viagem de volta ao Município de Caracaraí, na região Centro-Sul do Estado.

“Podem ser levados de 22 a 23 bois em pé, durante no máximo quatro horas. Mais do que isso eles se cansam e se deitam. Mas não há espaço dentro do veículo e eles se machucam. Essas carnes machucadas não servem para consumo. Além disso, eles passam fome e podem pegar chuva”, explicou.

Peixoto e Paulo Cunha, que também é descarregador, disseram ter sido impedidos de deixar os animais no frigorífico às 11h do dia 8. Na noite do mesmo dia, foram informados que deveriam entrar na fila para descarregarem às 9h de ontem. Os animais precisaram dormir dentro dos caminhões.

Cunha denunciou que isso já vem acontecendo desde outubro. “Até aquele mês, podíamos deixar o gado 24 horas por dia. Depois, apenas das 6h às 18h, sendo que há dois plantonistas lá e isso não seria necessário”, comentou. Ele disse que é difícil controlar os horários, pois os descarregadores dependem das condições do trânsito, da estrada, do clima e até mesmo das paradas para alimentação. Mas a justificativa que receberam foi que à noite é perigoso abrir e fechar a porteira.

Sindicato dos Urbanitários pede por reforma do matadouro público

O presidente do Sindicato dos Urbanitários de Roraima, João do Povo, defendeu a ação do médico veterinário que interditou o abate após a quebra de uma peça do maquinário do Mafirr. Segundo ele, o profissional tem competência para suspender o serviço em caso de insegurança alimentar, quando o asseio do espaço está inadequado, e de insegurança humana, esta última o motivo da interdição nesta semana.

João do Povo afirmou que o Mafirr foi construído há mais de 30 anos e nunca foi reformado, nem teve seus equipamentos renovados. O máximo pelo que passou foi uma pintura, durante a gestão do governador Anchieta Júnior (2007-2014). Quando há defeitos no maquinário, segundo ele, são feitos remendos na peça antiga e ela é devolvida, ao invés de ser trocada. A empresa conta também com uma única pessoa no cargo de técnico de segurança do trabalho, que é um comissionado.

“Há muito tempo que o sindicato denuncia junto ao Ministério do Trabalho e ao Ministério Público essas situações. No ano passado, uma caldeira gerava risco de explosão. Em 2015, faltava equipamento de proteção individual. Há duas semanas, a tal peça caiu e atingiu uma trabalhadora, não havendo problemas graves. Agora, ela quebrou novamente e os abates retornaram após o seu conserto. O sindicato denuncia esses equipamentos obsoletos, esses reparos paliativos, sempre causando pequenos acidentes de trabalho”, frisou.

Codesaima diz que criadores puderam retirar os animais durante a interdição

O presidente da Companhia de Desenvolvimento de Roraima (Codesaima), Márcio Granjeiro, afirmou que, no dia da interdição do Mafirr, foi avisado aos marchantes (os profissionais que abatem o gado) que era permitido devolver os animais aos proprietários. Quando o frigorífico retomou as atividades, na manhã de ontem, nem todos os animais estavam nos currais, pois alguns criadores os haviam buscado.

Segundo ele, os bovinos que permaneceram no matadouro beberam água durante os três dias de interdição. Granjeiro explicou que o Mafirr se submete às regras do Ministério da Agricultura, que determina, por exemplo, jejum de 18 a 24 horas para todos os animais que serão abatidos.

Essa condição é para esvaziar o seu aparelho digestivo, repor o glicogênio muscular, substância perdida na viagem, porque o boi se estressa, e que afeta a consistência da carne, e assim reduzir os riscos de contaminação na hora de retirar suas vísceras.   “Se ele [pecuarista] queria o abate na segunda-feira, o certo teria sido levar o gado no domingo, pois não fazemos o serviço no fim de semana”, complementou. “É preciso ainda saber em que condições os bois do pecuarista chegaram ao Mafirr, pois poderiam não estar tão gordos”.

Quanto ao horário de descarrego, Márcio Granjeiro esclareceu que, na verdade, é às 17h. “Eu sei que é desconfortável, mas essa atitude do médico veterinário é para assegurar as qualidades sanitárias e organolépticas [propriedades] da carne, que é consumida por todos nós. É mais difícil para os criadores do Sul do Estado, que demoram mais para chegar. O que precisa ocorrer é tanto o pecuarista quanto o transportador estudarem a logística para não chegarem atrasados. Estamos estudando um agendamento do descarrego para não lotar o frigorífico. Vamos averiguar a situação citada na matéria, mas não houve má-fé do Mafirr”, frisou.

O presidente da Codesaima disse ainda que desde setembro têm sido feitos cursos de capacitação para operadores de caldeira, refrigeração, dentre outros. Durante esta semana, segundo ele, quando houve a interdição, a Codesaima realizou cursos rápidos de melhoria na segurança do trabalho.

“Existe um plano de modernização para ser feito em até um ano, mas para o qual já conseguimos alguns recursos e demos início às licitações para novos equipamentos. É prioridade da nossa gestão assegurar a integridade física dos nossos funcionários. Apesar de nossa planta ser velha, temos laudos de engenheiros mecânicos e temos serviços especializados em segurança e medicina do trabalho para assegurar as normas técnicas. Além disso, temos um novo frigorífico em construção”, ressaltou. (NW)

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