A mãe relata que a filha hoje apresenta comportamentos que não condizem com sua idade (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)
A mãe relata que a filha hoje apresenta comportamentos que não condizem com sua idade (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

Dois anos após denunciar o ex-companheiro, que atua como procurador do Estado, por suposto abuso sexual contra a filha que hoje tem 5 anos, uma mãe em Boa Vista segue enfrentando as consequências emocionais e judiciais do caso. O julgamento do recurso que pede a revisão da sentença de primeira instância, que considerou o pai inocente, está marcado para o dia 3 de novembro.

Desde a decisão anterior, que contrariou as expectativas da família e reconheceu dúvidas quanto à autoria do crime, a mulher diz que vive entre a esperança e o medo. “Foi um choque muito grande. Eu jamais imaginei que o juiz ficaria em dúvida diante de tantas provas, relatórios psicológicos e testemunhos. Entrei em depressão profunda”, contou.

A mulher, servidora pública e advogada, tenta retomar a rotina ao lado da filha, mas admite que o trauma ainda dita o ritmo dos dias. “Tenho medo de sair sozinha, medo de levar minha filha ao parquinho, medo de tudo. A gente nunca voltou a ter uma vida normal”, desabafou.

Ela relatou que, após o término do relacionamento, chegou a ser ameaçada e perseguida pelo ex-companheiro. As medidas protetivas concedidas pela Justiça trouxeram algum alívio, mas não eliminaram o temor. “Quando ele foi advertido judicialmente e proibido de entrar em contato, senti um pouco de paz. Mesmo assim, vivo em alerta”, disse a mulher.

Impactos na infância e na saúde mental

A filha, hoje com 5 anos, segue em acompanhamento psicológico por conta dos traumas. Segundo a mãe, os atendimentos foram interrompidos por questões financeiras e pessoais das profissionais que a acompanhavam. “O tratamento é essencial, mas as sessões custam R$400 cada. A advogada pediu que a Justiça determine que o pai arque com esse valor, já que o dano foi consequência do que aconteceu”, explicou.

Ela conta que a criança apresenta comportamentos que exigem atenção contínua. “Ela fala sobre namoro, beijo, coisas que não são próprias da idade. Isso tudo vem da confusão que ela viveu. Ao mesmo tempo, sente falta da presença paterna. Precisa entender, com o apoio de psicólogos, que não foi abandono, e sim uma forma de protegê-la.”

Perdas e reconstrução

As consequências do caso ultrapassaram o campo emocional. A mulher relata que sua carreira e sua saúde foram profundamente abaladas. “Eu estava muito bem profissionalmente, cheia de clientes, e perdi tudo. Engordei, desenvolvi problemas hormonais e vivi um período de isolamento. Hoje tento recomeçar, mas ainda com medo. Tenho dificuldade em confiar nas pessoas, principalmente nos homens”, disse.

“A minha filha é meu bem mais precioso. Quero apenas que ela tenha paz, que cresça protegida e que a justiça seja feita. O que mais espero é que a lei seja aplicada de forma correta e que ela nunca mais precise ser revitimizada.”

O caso

A mãe suspeitou dos abusos, após a criança ter utilizado uma roupa que causou assaduras ao retornar da casa do pai. Quando a mãe foi higienizá-la e passar uma pomada, a menina teria relatado “é assim que o papai faz”. Momento em que a mulher pegou o aparelho celular e começou a gravar o diálogo com a filha, que confirmou que era tocada nas partes íntimas pelo homem. Ainda de acordo com a denúncia, a babá da criança e uma enfermeira foram testemunhas do caso.

No entanto, um juiz da Vara de Crimes Contra Vulneráveis, julgou improcedente a ação, após considerar que “pairam diversas objeções em relação aos fatos imputados ao acusado e, portanto, depreende-se que a imputação contida na denúncia não restou integralmente comprovada no decorrer da instrução processual”, diz trecho da sentença.

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