Roraima tornou-se um lugar de esperança por uma vida melhor para centenas de haitianos com idade entre 20 e 40 anos. Eles chegam ao Estado em número cada vez maior em busca de oportunidades no mercado de trabalho. Com dificuldade de comunicação por conta da língua, muitos deles sobrevivem no Brasil e sustentam suas famílias no país de origem desempenhando atividades no mercado informal, como por exemplo, a venda de picolés.
Tornou-se cena comum caminhar pelas ruas de Boa Vista e deparar-se com um vendedor de picolés ou de outros produtos com sotaque estrangeiro proveniente do francês. Isso é devido a um grande número de imigrantes haitianos que, fugindo das dificuldades enfrentadas em seu país, vêm para o extremo Norte do Brasil em busca de oportunidade. Eles estão dispostos a qualquer desafio e conseguem se manter e sustentar suas famílias no Haiti.
A Folha conversou com alguns desses imigrantes. Eles afirmaram que nem sempre conseguem aquilo que eles vêm em busca, mas a dedicação é um ponto forte para superar as dificuldades. Eliazar Baltheazar, de 38 anos, que chegou a Roraima há um ano, disse que levou três meses para chegar ao Brasil. Ele gastou, em média, 2.900 dólares.
Os intermediários são um dos fatores que encarece a viagem, chamados de “coiotes”, que facilitam a travessia, mas exigem dinheiro em troca. Em Roraima, Baltheazar procurou trabalho no mercado formal, mas não conseguiu, por isso encarou o mercado informal com a venda de picolés. “Paguei caro para chegar. As travessias deixam as passagens caras. Vim em busca de trabalho, mas não consegui no mercado formal, então resolvi vender picolé”, comentou.
Segundo ele, com a venda de picolés é possível pagar aluguel no Brasil, se alimentar e mandar dinheiro para manter a esposa e quatro filhos que ficaram no Haiti. Ele comentou que não é fácil. A caminhada diária empurrando um carrinho é longa para que consiga uma boa venda.
Quando chove, as vendas caem, mas mesmo assim é possível conseguir cumprir com as despesas. “É muito cansativo, difícil. Ando muito todos os dias. À noite fico muito cansado. A chuva diminui as vendas, mas consigo me alimentar e mandar alimento para minha família”, salientou.
Stlic Ceval de 48 anos, outro imigrante haitiano que vive no Estado, alegou que o motivo para deixar seu país foi a busca por melhores oportunidades de trabalho, uma tentativa de ajudar a família que ficou pra trás, além do terremoto que devastou o país em 2010 e a violência. Ele também vive da venda de picolés e com muita dificuldade tem conseguido viver no Brasil e manda alimentos para a família.
“A vida lá no Hiati não está boa. Não se pode viver em paz, não se tem possibilidade de ir ao hospital e não se tem segurança nas atividades. Somos roubados em nossos pequenos comércios”, narrou o imigrante ao falar da situação de seu país. (E.S)
Estrangeiros também procuram por chances de estudo em Roraima
A jovem Fabiana Obas, de 25 anos, chegou a Roraima há um ano com seu marido e filha com um objetivo: realizar o sonho de cursar Enfermagem. No momento, a haitiana, que está no sétimo mês de gestação do seu segundo filho, teve que colocar o seu sonho em espera, mas disse que não vai desistir. “Depois que meu filho nascer, quero procurar um trabalho fixo para poder me firmar economicamente e assim poder viver meu sonho de cursar Enfermagem”, disse.
A jovem procurou por trabalho fixo desde que chegou ao Brasil, porém, não conseguiu uma chance. Para ela, a principal dificuldade encontrada foi o idioma, considerando que no seu país as pessoas se comunicam pela língua oficial, o crioulo haitiano e o francês. “Agora eu consigo entender o português e falar um pouco de espanhol, mas foi só de tanto ouvir as pessoas falando por aqui e conversando”, disse.
Além disso, com a segunda gestação, as possibilidades de contratação diminuíram ainda mais. Por isso, Fabiana contribui na geração de renda da família produzindo seus próprios produtos, sapatos e roupas de crochê para crianças, e vendendo próximo à Avenida Jaime Brasil, no Centro. O marido dela, Benjamin, conseguiu trabalho em uma pizzaria. Mesmo com as dificuldades, a jovem afirma que não tem pretensão de voltar para o Haiti.
“Quando decidi vir para cá, foi de tanto escutar que quando uma pessoa estuda no estrangeiro e quando chega de volta no Haiti, consegue trabalho mais fácil”, comentou. “Mas agora que estou aqui, não quero mais voltar, pelo menos agora. Nós somos tratados muito bem no Brasil, somos bem-vindos, as pessoas não têm preconceito com a gente. Sempre ouvi as pessoas falando muito bem de nós, como trabalhadores, que não mexem com as pessoas”.
Já o haitiano Robert Carre tem 38 anos e conseguiu emprego na venda de picolés. Ele, que já trabalhou na área de recursos humanos no Haiti, também decidiu vir ao Brasil em busca de uma melhor qualidade de vida e de um curso profissionalizante. “Quero trabalhar com administração e sei que tenho mais chances no Brasil. Agora eu vendo picolés e não tenho problemas porque é um emprego digno. Mas, com o estudo, vou trabalhar com aquilo que quero e também poder ajudar minha família”, comentou.