A repercussão do caso dos garimpeiros tomou novos rumos. Após a publicação da matéria na Folha, na quarta-feira, 09, em que a entidade que representa os índios Yanomami, a Hutukara, confirmou a morte de seis garimpeiros, familiares do goiano Leandro de Oliveira, 34 anos, estão em busca de informação. Ele deixou Rio Verde (GO) há mais de oito meses para trabalhar no garimpo em Roraima e é um dos desaparecidos.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) afirma que ainda não há confirmação de mortes. Quase dez dias após o ocorrido, os familiares dos seis garimpeiros desaparecidos pensam em fretar um avião para ir até o local onde tudo aconteceu, na região do Homoxi, na Terra Indígena Yanomami, no Município de Alto Alegre, a Centro-Oeste.
Leandro veio a Boa Vista pela primeira vez a convite da cunhada e sobrinho, que trabalham com garimpo há um tempo. A Folha entrou em contato com a esposa de Leandro, em Rio Verde, que continua à espera de informações. “Ele nunca tinha trabalhado com garimpo. Ficou desempregado por conta da crise e aceitou o convite da minha irmã. Saiu daqui dizendo que ia juntar dinheiro para abrirmos um negócio, mas que estaria de volta para passar o Natal comigo e com nosso filho”, disse a esposa Edna Joana da Silva.
Ainda segundo Edna, Leandro atuava como cozinheiro no acampamento dos garimpeiros. “Ele ligava toda semana através de rádio. No dia 25 de outubro, disse que estava tudo bem, que estava feliz e que no dia 13 de dezembro sairia de Boa Vista para voltar a Goiás. Disse que lá [Homoxi] era muito difícil, que às vezes faltava comida, mas que ele havia feito amizade com os índios, porque eles sempre almoçavam com os garimpeiros e que estava até ensinando uns a ler e a escrever”, disse.
Por conta dos contatos frequentes com a esposa, Leandro relatava tudo o que acontecia na área indígena, inclusive qual era o método de negociação. “Todas às vezes que os garimpeiros faziam um ‘barranco’, era pago ao tuxaua da comunidade uma quantidade de ouro. Ele chegou a falar em 10 gramas por ‘barranco’. Quem gerenciava os garimpeiros era um tal de ‘Nem’. Tudo era divido com os indígenas: mantimentos, objetos etc.”, relatou a esposa de Leandro.
Ana Maria da Silva, irmã de Edna, também estava na região durante o mesmo período, mas em comunidades indígenas diferentes. De Homoxi até onde Ana trabalhava como garimpeira eram necessários aproximadamente 15 minutos de voo. “Eu e Leandro nos falávamos todos os dias pelo rádio, de um acampamento para o outro. No dia 1º [quando aconteceu a suposta chacina], ele ligou de manhã cedo para a central pedindo que reservassem as nossas passagem de volta para Goiás. Após o meio-dia, ele ligou de novo, tentou falar alguma coisa, ouvimos muito barulho e a ligação caiu. Foi a última vez que mantemos contato”, desabafou Ana.
OUTROS FAMILIARES – A Folha conversou também com outros familiares e garimpeiros que estão visitando com frequência os órgãos em busca de um posicionamento. Segundo relatos, um dos garimpeiros que estava no local, que responde pelo apelido de “Bolacha”, foi mantido refém junto com a esposa e o filho, após a suposta chacina, na pista de pouso. No dia 02 de novembro, “Bolacha” conseguiu contato através do rádio e disse: “Estou falando com calma, mas a situação está muito grave. Manda o avião”.
Ao chegar a Boa Vista, “Bolacha” procurou os familiares e disse que os indígenas haviam assassinado os garimpeiros. A Folha tentou contato com “Bolacha”, mas não obteve resposta.
CONFUSÃO – Mais de uma vez os familiares e representantes do Sindicato dos Garimpeiros de Roraima (Sindigar) foram até a Fundação Nacional do Índio (Funai) em busca de solução para o caso. Na quarta-feira, 09, chegaram a ser barrados na entrada do órgão, mas conseguiram entrar após um bate-boca com servidores do órgão indigenista.
De acordo com Crisnel Ramalho, presidente da Sindigar, após algumas horas um representante da Funai e um delegado da Polícia Federal receberam todos. “Eles disseram que iam ver o que poderia ser feito e que nos dariam uma resposta no dia seguinte. O delegado recomendou que registrássemos um boletim de ocorrência”.
Após saírem da Funai, os familiares e garimpeiros foram até a Ordem dos Advogados do Brasil em Roraima (OAB) e procuraram a Comissão de Direitos Humanos, onde registraram uma nova denúncia. Ontem voltaram à Funai e, mais uma vez, foram barrados inicialmente. Houve discussões e desentendimentos, inclusive com funcionários do local. Após uma conversa com alguns representantes do grupo, ficou acertado que a Funai vai acompanhar hoje os familiares até a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) para tentar contato, via radiofonia, com os líderes indígenas de Homoxi.
A intenção é tentar uma conversa amigável para saber como está a situação na região, se há condições de ir até o local e ter mais notícias. Por telefone, os familiares informaram que também irão procurar o Exército para pedir apoio. “Ao que tudo indica, depois de procurarmos todos os órgãos possíveis, parece que teremos que fretar um avião para ir até o local. Isso foi decidido durante a conversa com a Funai”, afirmou uma das familiares.
FUNAI – Conforme a Funai, nada ainda foi confirmado. “A Hutukara não é a representante daquela região onde supostamente estavam os garimpeiros. A Associação Hwanama é a responsável pela aquela área. A Funai não tem autonomia investigava, mas apoiamos os órgãos competentes para isso. Ontem tivemos uma conversa com alguns garimpeiros e com a Polícia Federal (PF) e estamos buscando um diálogo com os tuxauas da localidade”, informou.
MPF – O Ministério Público Federal em Roraima (MPF/RR) informou que, a partir de denúncia formalizada, instaurou procedimento para apurar os fatos. No momento, está em curso a fase de investigação, tendo sido adotadas providências como requisição de instauração de inquérito policial à Polícia Federal. O MPF só dará mais informações após concluídas as investigações.
PF – Em resposta à solicitação, a assessoria informou que o suposto crime extrapola as atribuições da Polícia Federal.