Cotidiano

Carteiros dizem que condições de trabalho nos Correios são precárias

Enquanto a população reclama da demora na entrega das encomendas e cartas, funcionários e sindicato relatam veículos quebrados e jornada de trabalho de segunda a domingo

Veículos quebrados e trabalhos de segunda a domingo. Estas são algumas das queixas de servidores dos Correios em Roraima.

Um carteiro que trabalha há 20 anos na função, denunciou que ele e os colegas, apesar das horas extras remuneradas, não aguentam mais trabalhar até aos fins de semana, “sem direito a trocar por folga”. Ele, que pediu anonimato, diz que desenvolveu um problema ortopédico por conta da sobrecarga de trabalho.

“As pressões estão ficando insuportáveis. Eu mesmo estou com calcificação no ombro devido ao esforço repetitivo e a grande quantidade de peso manuseado todos os dias. Algumas horas extras são pagas sim, a empresa pode usar isso como desculpa. Mas, na realidade, muitos acabam trabalhando bem mais que as duas horas extras permitidas por lei”, relatou o carteiro, que mostrou à FolhaBV seu diagnóstico médico.

A população, por exemplo, sofre com a demora na entrega de encomendas e cartas em Roraima. Para essa reclamação, a empresa chegou a dizer, em nota, que adota medidas como o remanejamento de empregados de outras unidades e a contratação de terceirizados, e admitiu o pagamento de horas extras e a realização de plantões aos fins de semana para atender a população.

“As encomendas, devido a pandemia, só aumentam. Por esses motivos, as convocações para trabalho extra têm se tornado rotineiras. Agora também aos domingos, sem direito a trocar por folga”, denunciou o carteiro.

O assessor jurídico do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios e Telégrafos e Similares (Sintect/RR), Ariomar Farias de Lima, acrescenta outros fatores a esse cenário.

“As motocicletas e bicicletas vivem quebradas e quebrando, prejudicando o trabalho e os carros não estão diferentes. Mas, mesmo que tudo isso estivesse funcionando 100%, ainda não seria possível fazer as cartas e encomendas chegarem sem atraso na casa do cliente, pois falta o principal: o ser humano, o trabalhador”, declarou.

Lima lembra que a companhia não realiza um grande concurso público nacional desde 2011, quando 9.190 candidatos foram aprovados e convocados imediatamente em todo o país, em cargos como o de carteiro. Além disso, reforça que as últimas contratações de carteiros em Roraima foram realizadas em 2014.

“Desse período para cá, os trabalhadores que se aposentaram e aqueles que saíram nos dois programas de demissão voluntária e outros que passaram em outros concursos, chegaremos a uma única conclusão: não é possível fazer os Correios funcionar em Roraima com a qualidade que a população deseja e espera, mesmo com a sobrecarga desumana que é imposta aos profissionais que ainda restam na empresa aqui no nosso estado”, explicou.

Ariomar Farias de Lima defende a realização de concurso público e o investimento dos lucros da empresa em todo o Brasil (R$ 1,53 bilhão em 2020, os maiores em uma década) na valorização dos trabalhadores. Em um intervalo ainda maior, de 20 anos, os Correios geraram ganhos de R$ 12,4 bilhões e repassaram 73% desse montante ao governo federal, segundo o site UOL.

Por outro lado, o governo Bolsonaro pensa em desestatizar a companhia. Na quinta-feira, 5, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto do Poder Executivo que autoriza a privatização e o texto segue para análise do Senado.

“Todo esse caos dos Correios não é um privilégio apenas de Roraima, se espalha pelo país e tem a ver com o sucateamento deliberado da empresa, para desmoralizar a nossa categoria e colocar a opinião pública contra a empresa, facilitando o discurso do governo de que é melhor privatizar. Nesse sentido, no último ano sofremos do governo o maior ataque da nossa história e tivemos o nosso acordo coletivo reduzido a poucas cláusulas, com perdas financeiras irreparáveis para a categoria. […] A nossa realidade é totalmente outra: baixo salário, péssimas condições de trabalho e exploração sem limites, os carteiros em Roraima estão trabalhando nos sábados, domingos e feriados. Isso acarreta problemas de saúde e afastamentos do trabalho, piorando ainda mais o que já está ruim.”, pontuou Lima.

OUTRO LADO – A reportagem da FolhaBV entrou em contato com os Correios que se manifestaram através da seguinte nota:

As informações não procedem. Em razão dos protocolos adotados pelos Correios em prol da segurança de empregados, fornecedores e clientes, podem ocorrer alterações nos serviços prestados pela estatal. No intuito de minimizar os impactos aos clientes e otimizar o atendimento e as operações de distribuição, a empresa está adotando diversas medidas, entre elas, a realização de horas extras e plantões aos fins de semana. As atividades em jornada extraordinária ocorrem com base na legislação trabalhista vigente e são regularmente remuneradas.

Os Correios estão adequando sua força de trabalho e inovando o sistema operacional. Mesmo com as restrições impostas pela pandemia, a empresa absorveu o aumento do fluxo de encomendas do comércio eletrônico e, para isso, tem investido em ações e infraestrutura, de forma a aperfeiçoar os índices de qualidade. Em Roraima, como em todo o país, a estatal está renovando sua frota – neste mês de agosto, estão sendo adquiridos 14 veículos novos.

Na condição de objeto dos estudos do Programa de Parcerias de Investimentos/Ministério da Economia, os Correios não comentam o assunto.