Cada pessoa carrega consigo fragmentos da infância, muitas vezes invisíveis, mas poderosos o suficiente para moldar comportamentos, emoções e relações na vida adulta. Reconhecer essas marcas não é um convite a reviver o passado, mas uma oportunidade de cuidar da própria história e, consequentemente, melhorar a relação com os filhos.
A mulher que se cobra demais, sente culpa por descansar ou tenta resolver tudo sozinha pode, na verdade, estar protegendo uma criança interior que precisou ser forte, madura ou “boa demais” para sobreviver. Na maternidade, esse reencontro se torna ainda mais intenso. O choro de uma criança, suas birras ou pedidos de atenção podem despertar dores antigas, lembranças de momentos em que o acolhimento ou o reconhecimento não foram suficientes.
Da mesma forma, os pais desempenham um papel essencial na construção do apego seguro. Um pai presente, atento e capaz de responder às necessidades emocionais do filho contribui para que a criança desenvolva confiança, autoestima e habilidades para se relacionar de maneira saudável.
Por outro lado, quando o vínculo paterno é marcado por ausências, rejeição ou respostas inconsistentes, os efeitos podem refletir em inseguranças e dificuldades de relacionamento ao longo da vida. Reconhecer e trabalhar as próprias feridas emocionais permite que o pai ofereça um ambiente afetivo seguro, interrompendo padrões antigos e fortalecendo o vínculo com o filho.
A Teoria do Apego, desenvolvida pelo psiquiatra John Bowlby e aprofundada pela psicóloga Mary Ainsworth, mostra que os vínculos formados na infância entre a criança e seus cuidadores determinam como nos relacionamos emocionalmente na vida adulta. Um apego seguro favorece confiança, autoestima e relações equilibradas, enquanto padrões inseguros (ansioso, evitativo ou desorganizado) podem gerar dificuldades emocionais e comportamentais que se refletem em todas as relações familiares.
Especialistas da área reforçam que cuidar da criança interior é um ato de compaixão e autoconhecimento. Significa dar nome e espaço a sentimentos que permanecem sem expressão, interromper padrões repetitivos e permitir-se agir com gentileza consigo mesmo. Quando cuidamos da pessoa que somos hoje, acolhemos a criança que fomos e oferecemos aos filhos um presente ainda maior: a chance de crescer em um ambiente emocionalmente seguro, livre de dores que não lhes pertencem.
Vale ressaltar que a transformação não acontece da noite para o dia. É preciso paciência, autocompaixão e, muitas vezes, o apoio de um terapeuta. Estudos indicam que pais e mães que compreendem seus padrões de apego e trabalham suas feridas emocionais conseguem criar vínculos mais saudáveis, ajudando os filhos a desenvolver confiança, segurança e habilidades socioemocionais sólidas. Cuidar da criança interior, portanto, é também investir no futuro emocional da próxima geração.