
As recorrentes notícias sobre apreensões de minério, especialmente cassiterita, e o desenrolar de operações na Terra Indígena Yanomami contra o garimpo ilegal, mostram que as ilegalidades ainda persistem, embora as ações coordenadas pelo governo tenham reduzido em 94,11% as atividades garimpeiras, conforme dados da Casa de Governo, que coordena as ações conjuntas de órgãos de segurança, como a Polícia Federal (PF), a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP), além das Forças Armadas.
Com o controle cada vez mais rigoroso sobre a atividade ilegal naquela terra indígena, os garimpeiros têm migrado para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, com destaque para os municípios do Uiramutã, ao Norte, e Normandia, a Leste. Nos últimos dias, o Exército tem realizado ações de fiscalização em Normandia, com incursões pelas regiões das comunidades Raposa e Napoleão, inclusive com uso de blindado, onde maquinários e casas que dão apoio ao garimpo foram destruídos.
O garimpo ilegal nessas regiões se intensificou em 2020, quando o então presidente Jair Bolsonaro, sob articulação do senador Chico Rodrigues, aliou-se à Sociedade de Defesa dos Índios de Roraima (Sodiurr), entidade que sempre esteve aliada ao governo local. Apesar desse apoio, a Polícia Federal, com apoio do Exército, fez duas operações na região para frear a onda de invasões iniciada na região, chegando a registrar até 900 garimpeiros. Foram presos indígenas e empresários de garimpo, além de maquinários de mineração de ouro apreendidos.
No mesmo ano, a mesma realidade foi registrada em Uiramutã ao longo dos rios Maú, Cotingo e Quinô, onde as atividades garimpeiras avançaram no mesmo momento do recrudescimento do coronavírus. Atualmente, os garimpeiros retirados da Terra Yanomami continuam se instalando na região, cujo movimento se intensificou nos últimos anos reforçado pela atividade do garimpo do outro lado da fronteira, na Guiana.
Já naquela época, em 2020, estava em curso um projeto do governo bolsonarista de tentar legalizar o garimpo para atender aos interesses de empresas multinacionais americanas e canadenses, conforme denunciaram lideranças indígenas do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Inclusive, fazia parte do grande plano nomear o deputado federal Eduardo Bolsonaro como embaixador nos Estados Unidos, que acabou não ocorrendo.
Empenhado em articular esse projeto entre os indígenas, o senador Chico Rodrigues chegou a ir a uma reunião na Região das Serras, em março daquele mesmo ano, para debater a legalização do garimpo. No calor das discussões, as lideranças indígenas ofereceram ao parlamentar um copo com água com mercúrio para que ele bebesse em sinal de que esse metal seria inofensivo, conforme ele argumentava. Foi o fim de debate.
Os indígenas da Raposa Serra do Sol continuam sendo aliciados por empresários de garimpo e políticos. O garimpo ilegal tem provocado efeitos catastróficos nas comunidades indígenas onde os garimpos estão instalados e no seu entorno, como alcoolismo, venda de drogas, domínio por facção, prostituição, desagregação familiar e êxodo para a cidade. Muitos indígenas foram convencidos a se tornarem garimpeiros, em troca de pequenas porcentagens ou favores, os quais passam a defender os interesses dos empresários de garimpo e políticos, em prejuízo a suas comunidades.
*Colunista