Dentro de um ranking que aponta como está a qualidade de vida não só das capitais brasileiras, mas também dos municípios brasileiros, Roraima tem três cidades com os piores índices do país. O ranking de 2025, divulgado nesta quinta-feira, 29, é medido pelo Índice de Progresso Social (IPS), desenvolvido pela organização Social Progress Imperative, o IPS, que mede a qualidade de vida considerando o desempenho social e ambiental de diferentes territórios.
Na lista das 20 capitais com melhor qualidade de vida, Boa Vista ficou na 19ª colocação. Entre as 20 cidades com as piores pontuações no índice de qualidade de vida se destacam Uiramutã, Jacarecanga (PA), Amajari, Bannach (PA) e Alto Alegre. O índice é construído com base em três dimensões principais: Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos do Bem-estar e Oportunidades.
No item sobre necessidades humanas básicas é avaliado o seguinte: se as pessoas têm alimento suficiente para comer, se recebem assistência médica básica, saneamento básico, se as pessoas podem beber água e manterem-se limpas sem ficar doentes, moradia adequada com serviços básicos e segurança pessoal, ou seja, se estão seguras.
Nos fundamentos do bem-estar é avaliado: se as pessoas têm acesso a conhecimento básico e educação, a informação e comunicação, se podem acessar livremente ideias e informações de qualquer lugar do mundo, se vivem uma vida saudável e a qualidade do meio ambiente para que possa influenciar o bem-estar social.
Ainda são consideradas as oportunidades: se os direitos individuais das pessoas estão protegidos, se as pessoas estão livres para fazer suas próprias escolhas, se ninguém está excluído da oportunidade de ser um membro contribuinte da sociedade e acesso à educação superior.
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No caso de Uiramutã, ao Norte do Estado, o isolamento geográfico em uma área de serras que inclui as estradas de acesso com as piores condições de tráfico, o que dificulta ainda mais a chegada de políticas públicas, o município tem o desafio de ficar ilhado no meio da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em que os interesses dos povos indígenas muitas vezes divergem dos interesses de quem vive na cidade, entre indígenas e não indígenas.
Desde 2024 que Uiramutã vem aparecendo como uma cidade com baixo IPS, a mais baixa entre todas as cidades avaliadas, com uma população que registra renda baixa e um abismo social entre seus moradores. Além da oferta de serviços básicos precária, o que contribui para o péssimo desempenho no IPS. O aspecto mais crítico da cidade é o de moradia. Outros itens, como coleta de lixo e iluminação, também tiveram avaliação ruim. O acesso a saúde e educação são limitados.
Além disso, com o cerco montando pelo Governo Federal contra o garimpo ilegal na Terra Yanomami, muitos garimpeiros estão migrando para aquela região, não só pela possibilidade de expandir ilegalmente o garimpo em terras indígenas, mas também na vizinha Guiana, onde o garimpo tem atraído moradores de Uiramutã e das comunidades indígenas. E isso pode ampliar ainda mais mazelas em um município pobre, isolado e vivendo intensos dilemas e conflitos com e entre os indígenas.
No caso do Amajari, também ao Norte do Estado, a realidade mostra um espaço dividido entre comunidades indígenas, de um lado, e grandes produtores de gado e o maior produtor de peixe do país, do outro, com exploração extrema dos recursos naturais que favorece a concentração de terras por poucas pessoas. E ainda tem os pequenos produtores e famílias vivendo em projetos de assentamento isolados por estradas ruins com pontes de madeiras sem manutenção.
Essa realidade provoca grandes desigualdades que prejudicam o desenvolvimento sustentável e o combate à pobreza. Enquanto grandes produtores exibem poderio econômico, político e financeiro, Amajari tem uma população pobre. O polo turístico encabeçado pela Serra do Tepequém, com grande potencial para gerar emprego e renda, é ignorada pelos políticos, os quais são todos ligados a essa elite dos grandes produtores historicamente.
Por sua vez, o que chama a atenção no caso de Alto Alegre é que se trata de um município com grande número de migrantes nordestinos e que abriga parte da Terra Indígena Yanomami, onde fica a porta de entrada para os garimpos ilegais, além de repetidos casos de corrupção eleitoral com cassação e prisão de prefeitos, inclusive com uma eleição suplementar que foi decidida na base do flagrante uso da máquina pública estadual.
Além de ficar com a pior parte do garimpo ilegal, como a criminalidade, tráfico de droga e prostituição, a população de Alto Alegre ainda sofre as duras consequências da corrupção eleitoral, em que políticas públicas estão longe de ser bandeira das disputas eleitorais, o que impacta na pobreza da população, aliciada a ficar dependente de uma estrutura carcomida pelas mazelas.
No geral, além das peculiaridades que concorrem para os piores índices de Uiramutã, Amajari e Alto Alegre, a verdade é que a maioria dos municípios do interior roraimense vive uma realidade de mazelas alimentadas por uma política velhaca mantida por currais eleitorais e sob o punho de ferro de coronéis que mandam e desmandam na política dessas localidades, em que a população só tem a opção de viver a “política do quanto pior, melhor”. E isso é decisivo para a qualidade de vida das populações.
*Colunista