Roraima enfrenta sérios reflexos de organizações criminosas que se fortaleceram a partir do garimpo ilegal (Foto: Divulgação)

Depois que parlamentares da direita tentaram aprovar uma Proposto de Emenda Constitucional (PEC) que tentava dificultar a investigação e o julgamento de parlamentares por crimes, exigindo autorização do Congresso para que ações penais fossem iniciadas contra eles, as mortes durante uma operação policial no Rio de Janeiro impuseram ao Congresso o teste definitivo aos políticos brasileiro, que é a aprovação de medidas urgentes e drásticas contra o crime organizado no país.

Para se ter uma noção do tamanho desafio, apesar do avanço do crime organizado no Brasil, com a expansão de grupos criminosos organizados, como o Primeiro Comando da Capital (PCC), que surgiu em São Paulo, e o Comando Vermelho (CV), oriundo do Rio de Janeiro, a legislação ainda sequer reconhece o conceito de “facção criminosa”, o que demanda a atualização da Lei de Organizações Criminosas. O Estado de Roraima foi a última fronteira conquistada por essas duas principais facções a partir do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami.

O Governo Federal enviou ao Congresso Nacional, na sexta-feira passada, dia 31 de outubro, o Projeto de Lei Antifacção, três dias após a letal operação policial no Rio de Janeiro. O projeto é baseado em cinco eixos principais, um deles diz respeito exatamente sobre a atualização da Lei de Organizações Criminosas, introduzindo o conceito de “facção criminosa”, ainda inexistente na legislação brasileira, prevendo pena mais duras para as organizações criminosas. A proposta é incluir a classificação de crime hediondo para caso de homicídios cometidos a mando das facções

As punições serão agravadas quando houver comprovação de domínio territorial, conexão com outras organizações criminosas, atividades transnacionais ou envolvimento de integrantes na morte ou lesão de agentes de segurança. Essa é a exata realidade em Roraima, onde as facções brasileiras passaram a atuar em consórcio com facções venezuelanas. O único ponto não registrado no Estado são mortes de policiais nos últimos anos, mas com um dado importante: o surgimento de milícias formadas por policiais que passaram a atuar ou dar apoio ao garimpo ilegal.

Esse é um dos eixos em que foi estruturado o PL do governo. O segundo eixo é voltado ao fortalecimento das investigações, propondo técnicas de infiltração de policiais nas facções e autorização de juízes para determinar que provedores de internet, telefonia e empresas de tecnologia forneçam dados de geolocalização em casos de ameaça à vida ou à integridade física de pessoas.

O afastamento de suspeitos infiltrados em órgãos públicos é o terceiro eixo do projeto, que trata da infiltração de facções no poder público e prevê o afastamento de agentes públicos suspeitos, mediante autorização judicial, quando houver indícios de envolvimento com organizações criminosas. Também condenados por participação em facções ficarão impedidos de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais por um período de 14 anos. Aqui é outra questão já observada em Roraima, com vereador, deputado e coronel da Polícia Militar investigados.

Asfixiar poder econômico faz parte do quarto eixo, que tem como meta atacar o poder econômico das facções, facilitando a apreensão de bens em favor da União, a intervenção judicial em empresas usadas para crimes e o bloqueio de operações financeiras. Esse é outro grande desafio, uma vez que as inúmeras operações policiais mostram que grandes empresários e políticos acabam aparecendo nas investigações, incluindo as atividades do garimpo ilegal.

Por fim, no quinto e último eixo do PL, está prevista a redução da capacidade operacional das facções, especialmente no que diz respeito à comunicação entre seus membros. A proposta é monitorar encontros de membros de facções em parlatórios e conceder à administração penitenciária o poder de transferir presos ligados a facções sem autorização judicial prévia em casos de motim, rebelião ou perturbação da ordem interna.

O projeto ainda prevê cooperação policial internacional, a cargo da Polícia Federal, e inclui o setor privado na busca por provas e informações de interesse da investigação, além de parcerias com entidades federais, distritais, estaduais e municipais. Era tudo que já deveria estar sendo feito há muito anos, no entanto, a contaminação da política e da polícia sempre impediram que a legislação fosse atualizada e as ações ampliadas de forma conjunta em todo o país.

Motivada pelo que ocorreu no Rio de Janeiro, a opinião pública tem cobrado respostas por parte das autoridades ao avanço das organizações criminosas. O problema é que já estamos no fim do ano, quando um longo de período de recesso parlamentar deverá contribuir para que o tema esfrie. No entanto, 2026 será ano de eleição, quando a população precisará ficar atenta para expurgar os políticos que tentaram aprovar a PEC da Blindagem e os que mostram ligações com qualquer tipo de crime e organizações criminosas.

O âmago de toda essa questão está nos políticos que serão eleitos em 2026 para o Congresso Nacional, quando facções, mantenedores do garimpo ilegal e de esquemas de corrupção se unem para tentar manter os mesmos políticos envolvidos em ilícitos ou bancados por dinheiro sujo, além de tentarem emplacar novos comparsas para um mandato na política. Eles já estão se movimentando. E o povo precisa ficar atento ao desenrolar de todas essas questões.  

*Colunista

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