O período que antecedeu a sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que retomou o julgamento dos recursos contra a cassação do governador Antonio Denarium (Progressistas) e do vice Edilson Damião (Republicanos), na noite dessa terça-feira, foi marcado por uma avalanche de mensagens postagens nas redes sociais com várias alegações contra a cassação.
A corrente mais forte segue o argumento sempre utilizado em casos semelhantes quando ocorreram processos de cassação em outras épocas, a do “deixa o homem trabalhar”, sob a justificativa de que os políticos perdedores deveriam aceitar a derrota e se preparar para as próximas eleições, com o visível propósito de normalizar o uso da máquina administrativa para ganhar eleições, como sempre vem ocorrendo desde a instituição do Estado.
Em terra de “gafanhotos” e da “feira-livre da venda de votos” que marcaram a política local em cenas dantescas, normalizar práticas que atentam contra a legalidade de um pleito pode ser comparado à mesma postura de defender o garimpo ilegal como saída para o desenvolvimento de Roraima, sem analisar os reflexos que as ilegalidades provocam não só no desvirtuamento do caráter da sociedade, mas na normalização da corrupção, que é a porta de entrada para vários outros crimes.
O voto da ministra relatora, Isabel Gallotti, que rejeitou os recursos contra a cassação e pede a inelegibilidade apenas de Denarium até 2030, além da realização de uma eleição suplementar para governador e vice, foi bem extenso, detalhado e robusto, a ponto de a leitura se prolongar por quase duas horas e meia, narrando detalhes que não podem passar em branco nem deixar que entrem para um buraco do esquecimento em nome da normalização.
As quatro cassações confirmadas pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) não dizem respeito somente a uma ampliação de programa social em ano eleitoral, que registrou um aumento de 400% no volume de recursos públicos para que fosse executado. Também inclui execução de programa habitacional sem previsão orçamentária que foi seguido de ampla prática de promoção pessoal do governador em suas redes sociais pessoais.
Ainda consta na lista das acusações a transferência de R$70 milhões em recursos extraordinários e em ano eleitoral para 12 municípios comandados por prefeitos aliados do governador, sem que fossem estabelecidos critérios para controle da execução dos recursos. E sem contar que os prefeitos ainda usaram as redes sociais para agradecer os repasses da verba e com pedidos explícitos de votos, sem qualquer preocupação com a legislação eleitoral.
Outro fato destacado no voto foi o festival de publicidade institucional com explícita promoção pessoal, além de divulgações em veículos de imprensa pagos com dinheiro público. Ou seja, o conjunto de todos os recursos apontam o uso da máquina que impossibilitaram a garantia de igualdade na disputa eleitoral, conforme apontou a relatora ao concordar com o pedido de cassação.
Em um passado não distante, normalizaram vender o voto na esquina durante a madrugada, se tornar “gafanhoto” (funcionário fantasma) nos órgãos públicos e fazer fila nos gabinetes para pedir dinheiro para comprar gás, pagar conta de água e luz ou passagens aéreas. O tempo se encarregou de combater essas práticas ilícitas. Agora precisa chegar o momento de não mais permitir o uso desbragado da máquina administrativa para ganhar eleição, como sempre ocorreu em um Estado sempre apontado como “terra fértil para corrupção”.
O pedido de vista de ontem, que suspendeu o julgamento do recurso, precisa ser visto como uma pausa para que os eleitores roraimenses reflitam sobre o preço caro que Roraima vem pagando por instabilidade política provocada por pedidos de cassação. Para o Estado seguir seu caminho rumo ao desenvolvimento tão almejado, é necessário que a política partidária seja depurada desse uso da máquina administrativa para privilegiar candidaturas.
*Colunista