JESSÉ SOUZA

Pais cobram transporte escolar, enquanto empresas querem R$4,3 milhões por rotas ‘fantasmas’

José Porfírio Barros e Arlinda Rodrigues dos Santos moram na subida da Serra de Tepequém

Enquanto o Ministério Público de Contas (MPC) investiga cobrança indevida feita por donos de empresas de transporte escolar na rede estadual de ensino de Roraima, muitas famílias de baixa renda que moram no interior do Estado há tempos tentam conseguir o benefício para seus filhos que moram longe da escola. No entanto, suas reivindicações nunca foram atendidas.

Conforme auditoria realizada pelo Departamento de Apoio ao Transporte Escolar, da Secretaria Estadual de Educação (Seed), empresários estão cobrando o valor de R$4,3 milhões por rotas do transporte escolar que não foram executadas nos municípios de Amajari, Normandia, Caracaraí, Uiramutã, Pacaraima, Mucajaí, Cantá e zona rural de Boa Vista. São nesses municípios onde pais têm cobrado o benefício da Seed, sem que sejam ouvidos pelas autoridades.

No Amajari, existem famílias que há anos tentam conseguir transporte escolar para seus filhos, mas o direito dos estudantes vem sendo negado pela Seed ou simplesmente ignorado. Esse é o caso do casal José Porfírio Barros e Arlinda Rodrigues dos Santos, ambos de 69 anos, que moram na Gleba Tepequém, na subida da Serra do Tepequém. Há três anos eles tentam que sua filha de 14 anos tenha direito ao transporte escolar. Já recorreram a vereadores, à sede da escola na Vila Brasil e até mesmo ao Conselho Tutelar, mas nunca foram atendidos.

Os pais da estudante recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC), cujo valor é de um salário mínimo (R$1.518,00), que é a única forma de sustento da família. Como eles não têm condições de ter um transporte, são obrigados a tirar dinheiro do sustento da família para pagar conhecidos para levar e buscar a garota na Vila do Paiva, onde ela estuda no Anexo de Tepequém do Colégio Militarizado Estadual Ovídio Dias de Souza, que funciona no mesmo prédio da Escola Municipal Olavo Bilac.

Mais quatro alunos também estão na mesma situação, sendo uma criança vizinha que mora na subida da Serra de Tepequém e outras três da Vicinal Igarapé Preto,  na zona rural de Tepequém. As famílias desses alunos dependem de carona para que possam chegar à escola, já que elas não têm condições de pagar por um transporte particular. Somente a escola municipal dispõe de transporte escolar para os alunos que moram distante da sede.

José Porfírio Barros e Arlinda Rodrigues dos Santos relatam que, por receberem dois salários mínimos de benefício, não conseguem mais pagar para levar e trazer sua filha, uma vez que o dinheiro que recebem serve também para comprar medicamentos, tanto para a mãe da adolescente, que trata de um câncer no útero, e para a própria filha, que tem problemas nos rins.

Essa é a triste realidade daqueles que buscam por seus direitos em favor de uma educação gratuita e de boa qualidade, conforme determina a Constituição Federal, mas são ignorados pelo poder público. O mais absurdo nesse caso de omissão aos direitos dos estudantes é que os empresários de transporte escolar tentam receber pagamento do governo por rotas que nunca foram realizadas.

Logo, os órgãos fiscalizadores precisam dar uma resposta não apenas na questão sobre esses valores milionários consumidos pelo transporte escolar, mas também em relação aos estudantes que são prejudicados em seus estudos exatamente por falta de transporte a que têm direito.  É inconcebível que os cofres públicos sejam lesados na mesma medida em que direitos dos estudantes são flagrantemente negados.

*Colunista

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