JESSÉ SOUZA

No topo do ‘ranking do ódio’ que alimenta o preconceito contra migrantes  

No topo do ‘ranking do ódio’ que alimenta o preconceito contra migrantes   No topo do ‘ranking do ódio’ que alimenta o preconceito contra migrantes   No topo do ‘ranking do ódio’ que alimenta o preconceito contra migrantes   No topo do ‘ranking do ódio’ que alimenta o preconceito contra migrantes  
Perfil nas redes sociais divulgou ranking que coloca Roraima como o Estado mais odiado (Imagem: Reprodução)

Um perfil que publica vídeos de 60 segundos sobre países, geografia e curiosidades a respeito de rotas divulgou um ranking que coloca Roraima como o Estado “mais odiado do país”. Com 1,4 milhão de visualizações até ontem à tarde, o vídeo foi compartilhado por um perfil local, mesmo que o conteúdo não mereça credibilidade pelo conteúdo sem fonte nem base científica.

A publicação nem mereceria ser comentada devido a sua abordagem vazia de conteúdo, no entanto, por induzir as pessoas a odiarem migrantes, em vez de mostrar dados que possam ser discutidos os problemas que o Estado enfrenta, torna-se importante ser contraposta e contextualizada com base na qualidade de vida das pessoas. A começar pelo fato de a publicação apontar apenas o ódio como motivo para as pessoas supostamente estarem abandonando o Estado de Roraima.

Conforme afirma o vídeo, o motivo para esse ódio seria o fato de a população roraimense ser formada por 20% de imigrantes, fazendo com que os moradores estejam decidindo ir embora devido à crise humanitária e, também, ao abandono por parte dos governos. Uma simples pesquisa na internet já põe por terra esse argumento falacioso apresentado no “ranking do ódio”, mostrando que, ao contrário, ninguém está indo embora.

Conforme os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Roraima registrou o maior crescimento populacional do país entre 2010 e 2023, com aumento de 41,25%. A mais recente estatística confirmou que o Estado foi o que mais cresceu em população em 2024, com um aumento de 12,58%, passando de 636.707 para 716.793 habitantes. Embora tenha registrado o maior crescimento populacional, Roraima ainda possui a menor população entre todos os estados do Brasil.

Mas isso não significa que não tenhamos mazelas e grandes desafios. Sim, a migração de venezuelanos tem ampliado os problemas enfrentados pela população local, inclusive com a chegada de facções venezuelanas, o que ajuda a inflar os problemas advindos do garimpo ilegal. Somos um Estado pobre, isolado dos grandes centros e dependente de transferência de recursos federais e da chamada “economia do contracheque”, com recorrentes apagões energético e de internet.

No entanto, apesar do desafio da migração que exige políticas públicas (a Operação Acolhida ajuda sobremaneira a reduzir os impactos), temos particularidades únicas que proporcionam qualidade de vida à população, inclusive são os números do IBGE de 2023 que confirmam isso, apontando Roraima com o melhor desempenho socioeconômico entre todos os estados brasileiros, com avanço de 32,0% no Índice de Desempenho Socioeconômico (IDS) ao longo de quase uma década, enquanto o do Brasil cresceu 12,8%.  

No que pese os gargalos, os fatos mostram um bom lugar para se viver e boas perspectivas de desenvolvimento, além de grandes empreendimentos que costumam ser divulgados pelos políticos. Acabamos de passar pelo maior festejo junino da Amazônia, em Boa Vista, que registrou um público de 150 mil na primeira noite e encerrou no domingo com mais de 300 mil pessoas, incluindo caravanas vinda de outros estados, que fizeram lotar hotéis e aquecer o setor de serviços, fortalecendo o turismo, que é uma indústria em franco desenvolvimento.

Ainda ontem, representantes de vários setores começaram a discutir a organização do Amazontech 2025, que será sediada em Boa Vista, no Campus da Universidade Federal de Roraima (UFRR), de 4 a 6 de setembro. A estimativa é de um público de 15 mil pessoas em torno do evento internacional de inovação, sustentabilidade e tecnologia de toda a Amazônia Legal. A realização coincidirá com outro grande evento, que é o 17º Encontro Internacional de Motos de Alta Cilindrada, que se tornou tradicional no Estado e atrai milhares de pessoas da Amazônia e países vizinhos.

São apenas algumas pinceladas sobre o Estado traduzidas em eventos que atraem visitantes e turistas de vários estados e países, os quais saem daqui impressionados com uma Capital organizada, arborizada e com praças onde as pessoas podem caminhar a qualquer hora sem o risco de serem assaltadas. A propósito, os comentários positivos contestando o “ranking do ódio” são justamente os de visitantes e pessoas que chegaram de outros estados, enquanto os nascidos aqui são os que ampliam o ódio aos migrantes em seus comentários e enxergam somente as mazelas.

Não é sem sentido que haja essa manifestação de ódio em um país onde existe gente que apoia piadas com negros, indígenas, homossexuais e apologia à pedofilia e ao nazismo. O vídeo sobre Roraima se encaixa muito bem nesse grande movimento de cultivar gratuitamente o ódio nas pessoas, especialmente contra quem mora no Norte de Nordeste, uma vez que a maioria dos estados apontados no “top 5 dos odiados” pertence a essas regiões.

Roraima tem vários problemas que desafiam políticos, governos e a sociedade de uma forma geral, os quais não são exclusivas do Estado. No entanto, no que pese os pontos negativos, a qualidade de vida é o bem mais valioso que esta terra ainda proporciona à sua população. É isso o que precisa ser discutido e refletido por quem mora aqui ou não; e não alimentar campanhas de ódio que anestesiam mentes e corações, impedindo que se discutam saídas para os nossos problemas a fim de que não sejamos vencidos pelas mazelas.

*Colunista

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