
A notícia alvissareira que circulou na imprensa brasileira, durante todo o fim de semana, foi a descoberta de pegadas de dinossauros no interior de Roraima, as quais remontam há 110 milhões de anos. O anúncio traz importantes significados muito além do que está propondo a mídia tradicional, que é o de aguçar o imaginário de que a Amazônia foi habitada por dinossauros e que ainda esconde segredos pré-históricos a serem desvendados.
A descoberta significa um novo capítulo para a ciência brasileira porque propõe-se a reescrever a história geológica do Brasil a partir da ciência produzida em Roraima, por meio de um trabalho de pesquisadores locais da Universidade Federal de Roraima (UFRR), que coloca o Estado na rota da paleontologia não apenas como estudo científico, mas como proposta de fomentar o turismo, que por sua vez exige proteção ambiental em parceria com as comunidades envolvidas.
O grande achado foi resultado de 14 anos de pesquisas de estudiosos da UFRR, depois que o professor de geologia Vladimir de Souza identificou as pegadas no ano de 2011 em uma área de lavrado no Município de Bonfim, a Nordeste do Estado, nas proximidades da fronteira com a República Cooperativista a Guiana (ex-Guiana Inglesa), em uma região habitada por comunidades indígenas e pequenos produtores.
Os pesquisadores informaram ter encontrado pegadas de seis gêneros de dinossauros, entre os gigantes de mais de 10 metros de altura e até os velociraptors de médio porte, chegando a 2m de comprimento. Porém, os estudos ainda podem apontar até mais de 20 gêneros diferentes. Os pesquisadores já falam em transformar o local do achado em um parque geológico, que ficaria aberto à visitação a fim de promover educação científica e turismo sustentável.
Além dessa extraordinária descoberta, as preciosidades pré-históricas que Roraima abriga, e que pode revelar muito mais sobre a origem da vida e da biodiversidade na Amazônia, se estendem por tempos mais remotos ainda. Temos a Serra do Tepequém, ao Norte do Estado, no Município do Amajari, a poucos quilômetros da Venezuela, que é uma verdadeira cápsula do tempo, cujos estudos são tímidos e não há nenhum interesse científico nem político de unir ciência e turismo sustentável.
A formação geológica de Tepequém é a mesma do Monte Roraima, que remonta a 2 bilhões de anos (sim, 2 bi!), quando a África era colada com a Amazônia e os dinossauros ainda nem habitava a Terra, muito menos os primeiros hominídeos. Isso significa que temos uma das áreas mais ricas e enigmáticas do planeta, com uma fauna e flora diferenciada, bem como uma formação geológica que inclui rochas sedimentares de idade Paleoproterozóica. Por ser um Tepuy, guarda também mistérios inexplicáveis.
Tepequém é um testemunho da rica diversidade de paisagens e da evolução dos processos geológicos na região, contribuindo decisivamente para a formação de uma paisagem única dentro do cenário amazônico. Tem mais. Já existem achados arqueológicos nunca estudados e que estão sendo ignorados pelos estudiosos e, obviamente, pelos políticos que sentem arrepios só em falar em turismo, proteção ambiental e estudos científicos.
Com o achado de pegadas de dinossauros em Bonfim, ressurge a esperança de que os pesquisadores locais ganhem não apenas reconhecimento público por seus trabalhos, mas apoio institucional e financeiro, servindo de exemplo e de inspiração para novos pesquisadores, quem sabe com olhos voltados para a Serra do Tepequém, a cápsula do tempo que foi revirada pelo garimpo de diamantes, por cinco décadas, e que agora vive do turismo.
Embora o turismo tenha surgido com a proposta de um desenvolvimento sustentável, no início da década de 2000, fazendo com que as feridas do garimpo começassem a ser curadas, Tepequém segue sendo ameaçada por atividades turísticas sem ordenamento e sem apoio dos governos, que deixam a comunidade sozinha, sem condições de impor o mínimo necessário para frear a poluição, degradação ambiental, as invasões e a especulação imobiliária.
*Colunista