História de Roraima é marcado por crimes de pistolagem desde o tempo de Território Federal (Foto: Divulgação)

A prisão do foragido Gessé Diomar Mendes Barros, 67 anos, o Mendes, no fim de semana, no Estado do Acre, tem um importante significado para a realidade de Roraima. Ele foi o mandante do assassinato do empresário Rogério de Oliveira Rosa, o Rogério do BC, um crime cruel e covarde cometido por um pistoleiro em um domingo do Dia dos Pais em 2007, na frente filha do empresário, que era uma criança à época. O motivo foi o aluguel de um prédio.

Foram 18 anos de impunidade, revelando a face de uma realidade aterradora que ainda era vivida pelos roraimenses, com crimes institucionalizados e impunidade de assassinatos de grande repercussão, a exemplo do caso Rogério do BC, que gerou revolta na sociedade, a ponto de os moradores do bairro Raiar do Sol, onde ocorreu o crime, ter se mobilizado para pedir Justiça em uma passeata na avenida principal daquela localidade.

Desde a década de 1980, antes da institucionalização do Estado, quando a pistolagem era a lei, muitos crimes em Roraima ficaram sem solução e os mandantes ou responsáveis seguiram impunes. Um deles foi o assassinato do empresário Chico da Meta (Francisco Mesquita), na noite de 12 de maio de 2011, em crime de tocaia, quando o empresário saía de uma pizzaria. A motivação foi a disputa por um contrato milionário de voos para a terras indígenas.

O mandante do assassinato, Vibaldo Nogueira Barros, o Vivi, proprietário do táxi aéreo Paramazônia,  e o pistoleiro contratado para executar a vítima, Cirilo Barros Ferreira, foram presos, mas conseguiram fugir, em um cenário que era muito comum naquela época de corrupção e impunidade. Vivi fugiu de uma cela especial no Comando da Polícia Militar de Roraima e, ao dar sequência à fuga, morreu carbonizado na queda do avião que ele pilotava.

Cirilo fugiu da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc) pela porta da frente, em 2012, ao pagar R$8 mil de propina para um policial militar. O outro preso que fugiu junto, o ex-policial Josias Severino Chaves, que cumpria de 50 anos por tráfico de drogas, foi recapturado em Santa Catarina em 2022. No entanto, o pistoleiro Cirilo até hoje continua foragido, provavelmente vivendo na Venezuela, servindo de cenário da impunidade que segue reinando em Roraima.

Mas o maior símbolo de impunidade de todos os tempos é o caso do jornalista João Alencar, que acabou se tornando exemplo emblemático de violência institucionalizada e da luta pela liberdade de imprensa em Roraima. Alencar foi executado a tiros em 1982, em uma emboscada no Centro de Boa Vista, em frente onde hoje é a Praça de Alimentação do Portal do Milênio. O crime segue impune até os dias atuais, tornando-se um marco na história da violência política não só no Estado, mas no Brasil.

O caso Alencar é a mistura espúria de política, polícia e pistolagem que dominava o Estado desde o tempo de Território Federal. Alencar foi assassinado após fazer críticas contundentes ao então governador biônico da época, o brigadeiro Ottomar de Sousa Pinto, já falecido. A execução ocorreu no momento em que ele supostamente iria ser propinado para se calar e ir embora.

Esse crime do jornalista é a representação cabal da violência institucionalizada, que gerou cemitério clandestino na década de 1990 e outras mortes igualmente violentadas por meio de pistolagem, como a do auditor fiscal Nestor Leal, que contrariou interesses de empresários poderosos; e a do advogado Paulo Coelho, recém-empossado conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que prometeu contestar a nomeação do desembargador Gonzaga Batista pelo governador Ottomar, cujos filhos do magistrado comandavam a Polícia Civil sob cometimento de crimes e arbitrariedades.

Mas também não pode ser esquecido o assassinato do prefeito de Boa Vista, Silvio Leite, em 9 de outubro de 1987, um evento trágico que marcou a História de Roraima. O político foi alvejado com 19 tiros em um carro oficial, em frente ao Parque Anauá, em uma emboscada noturna. O prefeito foi assassinado por Telmar Mota, irmão do ex-senador Telmário Mota, que hoje cumpre prisão domiciliar sob acusação de ser o mandante do assassinato da mãe de sua própria filha, outro crime de pistolagem.

Aqui está o resumo de um período obscuro vivido em Roraima, onde fazer críticas e denúncias ou contrariar interesses políticos e empresariais era uma sentença de morte. O caso Rogério do BC é resquício dessa época, uma vez que o mandante do crime brutal, ora recapturado, era um elemento perigoso e contumaz em práticas criminosas, figura que reinava absoluta numa realidade de impunidade, corrupção, pistolagem e violência institucionalizada.

Tudo isso precisa ser sempre lembrado para que a sociedade jamais baixe a guarda, a fim de que a Justiça sempre prevaleça. É necessário enfatizar que, para que Roraima possa ser um Estado desenvolvido e próspero, é necessário enterrar todos esses entulhos que ainda nos aterrorizam, como se fossem esqueletos em nossos armários.

*Colunista

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