Transtorno, como a misofonia, pode atrapalhar qualidade de vida das crianças (Foto: Reprodução)
Transtorno, como a misofonia, pode atrapalhar qualidade de vida das crianças (Foto: Reprodução)

Pais que já ouviram filhos reagirem com raiva, medo ou pânico a sons aparentemente banais, como um garfo batendo, alguém mastigando ou o tic tac de um relógio, frequentemente não sabem que aquilo pode ter nome e tratamento. Dois quadros que vêm ganhando atenção entre clínicos e educadores são o transtorno do processamento sensorial (TPS) e a misofonia.

O primeiro envolve dificuldade em organizar e responder adequadamente a estímulos táteis, visuais ou auditivos. Já o segundo descreve reações emocionais e físicas intensas a sons específicos. Ambos podem transformar momentos cotidianos em crises, afetar o rendimento escolar e tensionar relações familiares se não houver entendimento e intervenções adequadas.

Pesquisas recentes apontam que uma parte significativa da população apresenta sensibilidade a sons desencadeantes, com uma pequena parcela apresentando sintomas moderados a graves que interferem na vida diária. Em crianças e adolescentes, levantamentos clínicos relatam comorbidade frequente com ansiedade, depressão e transtornos do desenvolvimento. Ou seja, muitos jovens que sofrem com reações extremas a sons carregam também um histórico emocional ou neurológico que merece atenção integrada.

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Na prática escolar, essas reações se manifestam de maneiras diversas: um aluno que não suporta o som de colegas mastigando pode se recusar a almoçar na cantina; outro que se irrita com o barulho de lápis pode ter crises durante provas; crianças com hipersensibilidade tátil podem evitar atividades de arte ou recreio por desconforto com texturas.

Para professores e famílias, a tendência inicial é interpretar comportamentos como birra ou dificuldade de adaptação, diagnóstico tardio que só prolonga o sofrimento e agrava o isolamento.

Estudos sobre intervenções sensoriais em contexto escolar mostram que programas de adaptação e estratégias de manejo conduzidas por terapeutas ocupacionais e com orientação dos professores podem melhorar a participação e o bem-estar das crianças. Essas intervenções incluem ajustes no ambiente (áreas silenciosas, uso de fones de ouvido, horários ajustados) e atividades que ajudam a modular a resposta sensorial.

Na família, ouvir sem minimizar e buscar avaliação especializada são passos-chave. Profissionais recomendam registrar padrões (quais sons desencadeiam, quando e com que intensidade), tentar mudanças ambientais (mudar lugar das refeições, diminuir ruídos de fundo) e ensinar estratégias de enfrentamento como técnicas de respiração, deslocamento temporário a um espaço silencioso, uso de sons de substituição que ofereçam sensação de controle. Em casos moderados a graves, avaliação psiquiátrica ou psicológica é indicada para tratar comorbidades como ansiedade e depressão, que amplificam a sensibilidade e o impacto funcional.

Em resumo: quando sons ou sensações desencadeiam crises, é preciso mais escuta e menos julgamento. Identificar, adaptar o ambiente e buscar intervenções terapêuticas combinadas transformam o dia a dia de crianças e adolescentes afetados, evita prejuízos educacionais e protege relações familiares.