(Foto: Wenderson Cabral/FolhaBV).
(Foto: Wenderson Cabral/FolhaBV).

A Primeira Turma da Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) decidiu, por unanimidade, manter a sentença que obriga a Prefeitura de Boa Vista a criar uma estrutura permanente para o manejo de animais de rua. O acórdão, publicado no dia 18 de novembro, rejeitou o recurso apresentado pelo Município e confirmou a omissão prolongada na implementação de políticas públicas essenciais.

A decisão decorre de uma Ação Civil Pública apresentada pela Associação Rede de Apoio e Defesa dos Animais de Roraima (Radarr), representada por Palmira Leão de Souza. A associação levou ao Judiciário denúncias sobre a falta de controle populacional, o crescimento de animais errantes e a ausência de medidas permanentes de proteção animal.

Pela determinação judicial, a Prefeitura terá 180 dias para construir um abrigo público destinado ao recolhimento e atendimento de animais abandonados, doentes ou vítimas de maus-tratos. O local deverá contar com equipe médico-veterinária, fornecimento de medicamentos e alimentação contínua.

Além disso, o Município precisará comprovar, em até 90 dias, a execução de programas regulares de castração e adoção responsável. O descumprimento acarretará multa diária de R$ 1 mil, limitada a R$ 100 mil.

No voto, o relator, desembargador Almiro Padilha, afirmou que a atuação do Judiciário não viola a separação dos poderes, como alegou o Município. Segundo ele, a intervenção é legítima quando há omissão estatal que compromete direitos fundamentais ligados à saúde pública e à proteção ambiental. “Não se trata de substituir o administrador, mas de assegurar o cumprimento de deveres mínimos impostos pela ordem jurídica”, argumentou.

A multa fixada pela sentença de primeiro grau foi mantida, considerada proporcional diante da complexidade das obrigações e da omissão estatal comprovada.

Omissão há mais de 50 anos

Segundo o acórdão, a omissão municipal é comprovada por dados oficiais. A Lei Municipal nº 18/1974 determina, há mais de 50 anos, o recolhimento de animais soltos em vias públicas. Uma obrigação que, conforme o Tribunal, não vem sendo cumprida.

Entre 2021 e 2024, o Corpo de Bombeiros registrou 720 ocorrências de captura de animais e 116 acidentes de trânsito envolvendo animais soltos. No mesmo período, o Hospital Geral de Roraima notificou 518 atendimentos por mordeduras de cães.

A Corte também considerou insuficiente o programa “Castra Móvel”, apontado pela Prefeitura como ação em execução. Conforme o acórdão, o serviço atende apenas animais com tutor e mediante inscrição, deixando de fora justamente os animais abandonados, que são o foco central da demanda.

O que diz a Prefeitura

A Procuradoria-Geral do Município (PGM) informou por meio de nota que já tomou conhecimento da decisão judicial e está analisando-a, tecnicamente, para orientar os próximos passos da administração municipal.

Até porque a Prefeitura de Boa Vista atua com responsabilidade, sensibilidade e compromisso com o bem-estar animal, tanto no cuidado de cães e gatos quanto na proteção da fauna silvestre resgatada, como ocorre no Bosque dos Papagaios. Entre as ações estruturadas e contínuas voltadas à saúde e ao bem-estar animal, que são administradas pela Unidade de Vigilância e Controle de Zoonozes (UVCZ), estão a castração gratuita, atendimento veterinário, vacinação, microchipagem, controle e tratamento de doenças e preparo para doação. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente também administra pontos de hidratação de água potável pela cidade e planeja ampliar as ações de proteção, com um programa voltado especificamente para animais de rua vítimas de maus-tratos. O objetivo é oferecer cuidado, reabilitação e campanhas de adoção responsável, com previsão de início no primeiro semestre de 2026.
A Prefeitura reafirma seu compromisso com políticas públicas responsáveis, humanizadas e baseadas em critérios técnicos, e esclarece que seguirá atuando dentro das determinações legais, sempre priorizando a saúde, a segurança e o bem-estar da população e dos animais.