Entrar numa cirurgia plástica costuma ser movido por desejo de transformação. Seja corrigir um traço, recuperar a autoestima, reinventar o espelho ou até mesmo por uma condição de necessidade. Mas quando o resultado falha, ou pior, quando o procedimento causa mutilação ou sequelas estéticas, o impacto vai além do físico e atinge a identidade, a confiança e a vida emocional do paciente. No Brasil, o volume de cirurgias plásticas estéticas é expressivo e, paralelamente, vem crescendo de forma acentuada a judicialização de casos de erro médico.

Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) indicam que em 2024 foram registradas 74.358 ações relacionadas a falhas em procedimentos de saúde, um aumento de 506% em relação ao ano anterior.  Na esfera da cirurgia plástica, levantamento do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) mostra que cerca de 97% dos médicos processados nesse tipo de procedimento não eram especialistas na área, reforçando a vulnerabilidade dos pacientes.

Além da dor física, o estrago psicológico pode ser devastador.

O erro médico em cirurgia plástica não atinge apenas o corpo, atinge o projeto de vida, a autoestima, o direito de sentir‑se bem consigo mesmo e seguro. Entretanto, ainda que o paciente que busca um resultado estético esteja investindo, em tempo, dinheiro e expectativas, e, portanto, o padrão de cuidado exigido é ainda mais elevado. Quando o prestador assume não só a execução técnica, mas a promessa de transformação, ele passa a responder por obrigações mais intensas.

Sob a ótica jurídica, as cirurgias plásticas estéticas podem configurar obrigação de resultado, uma espécie de garantia de estética, ou de meio, que se dá a atenção e técnica adequada, conforme o caso. Em muitos julgados, os tribunais têm admitido responsabilidade civil e obrigação de indenização quando se demonstra negligência, imperícia ou imprudência. Falhas tais como falta de especialização do cirurgião, infração às boas práticas, consentimento inadequado ou pós‑operatório mal conduzido.

Contudo, o paciente lesado tem direito à reparação não apenas do físico, mas também do dano existencial, moral e econômico que devem considerar os prejuízos à autoimagem, à sociabilidade, à autoestima. Não podemos esquecer que, além de cliente do cirurgião, o paciente é uma pessoa.

Caso o paciente se encontre diante de resultado errado, complica­ções como assimetria, necrose, infecção, deformação ou queda da prótese, o caminho inclui buscar o prontuário médico, verificar o termo de consentimento, solicitar laudos, imagens e periciar os danos. A ação pode ser proposta com base no Código de Defesa do Consumidor  ou no Código Civil. Ter um advogado especializado desde o início é essencial para avaliar se se trata de erro médico, complicação inevitável ou risco aceito, e definir valor de indenização, requisitos de prova e responsabilidade solidária da clínica, do cirurgião e dos insumos utilizados. 

O resultado pode até parecer superficial, mas para o paciente que confia sua imagem e autonomia ao bisturi, o dano estético‑psíquico é real e duradouro. O Estado e o sistema jurídico precisam garantir que as transformações prometidas não gerem vulnerabilidades e que quem lucra com a estética arque também com o ônus quando falha.

O autor é o advogado Thayan Fernando Ferreira, especialista em direito público e direito de saúde, membro da Comissão de Direito Médico da OAB-MG e diretor do escritório Ferreira Cruz Advogados – [email protected]