
Há um velho ensinamento atribuído a Abraham Lincoln: “Se você quer testar o caráter de um homem, dê-lhe poder.” A frase nunca pareceu tão atual. O que se vê hoje, em diversos ambientes, entre eles, as empresas, repartições, órgãos públicos, famílias, escolas ou até mesmo círculos sociais, é um fenômeno corrosivo, tão silencioso quanto devastador: a síndrome do pequeno poder.
Não estamos diante de um simples desvio de comportamento. Estamos diante de algo vil, deformado, que distorce a natureza das relações humanas e transforma pequenos cargos, funções triviais ou migalhas de autoridade em armas de humilhação. A síndrome do pequeno poder é, na essência, uma perversão do ego: um desequilíbrio que faz com que pessoas comuns se torne carrascos de gente que apenas deseja seguir sua vida com dignidade e respeito.
A síndrome do pequeno poder nasce quando alguém recebe um fragmento de autoridade e, incapaz de compreendê-lo com maturidade, passa a se comportar como se fosse soberano de um território imaginário. São pessoas que confundem responsabilidade com domínio; que acreditam que o mundo gira ao redor de seus caprichos; que exigem reverência onde deveriam oferecer respeito.
Para o “ser humano” (entre aspas mesmo) que sofre da síndrome do pequeno poder, um carimbo vira cetro, uma assinatura vira sentença e um crachá vira coroação.
De repente, gente sem preparo emocional e sem grande relevância hierárquica se comporta como se estivesse acima de profissionais mais experientes, acima de seus superiores, acima da sociedade e, pior, acima do próprio senso de humanidade.
Para quem sofre dessa síndrome, o poder limitado torna-se palco para o autoritarismo ilimitado, feita de arrogância e covardia.
Essa síndrome não nasce da força. Ela nasce da fraqueza. Ela não cresce na coragem. Ela cresce na insegurança.
O indivíduo acometido pelo pequeno poder é, na verdade, alguém profundamente intimidado pela própria irrelevância. Como não possui poder real, busca compensar seu vazio interior subjugando quem está ao seu alcance. Humilha, desrespeita, ameaça, persegue, cria dificuldades fantasiosas e impõe barreiras inúteis, tudo para sustentar uma imagem patética de grandeza.
Esse comportamento é autoritário, abusivo e antissocial. É o tipo de comportamento que degrada ambientes, que aprisiona, que intimida, que paralisa.
Heleieth Saffioti descreve esse fenômeno como um problema social, não individual, e ela tem razão: nossa sociedade alimenta e tolera pequenos ditadores. O problema não é só quem exerce o abuso, mas a cultura que permite que esse abuso floresça.
E aqui existe uma verdade incômoda: O pequeno poder revela quem alguém realmente é. Quem é grande por dentro não precisa gritar; quem é justo não precisa humilhar e quem é legítimo não precisa impor medo.
Por outro lado, quem transforma uma função limitada em instrumento de opressão mostra que, por trás do uniforme, do crachá, do setor, do balcão ou do título, existe um ser humano vazio, carente de validação e incapaz de compreender que autoridade não se impõe, ela se conquista.
Gente assim não comanda, controla; não orienta, oprime; não lidera, domina; não ajuda, atrapalha e o mais grave, acredita sinceramente que está certa.
Lidar com alguém acometido pela síndrome do pequeno poder é vivenciar um território de desgaste permanente. Pessoas assim criam ambientes sufocantes, relações tensas e climas organizacionais adoecidos. Basta sua presença para que o ar pese.
A convivência se torna um campo minado; cada frase vira ameaça; cada solicitação vira prova de resistência e cada erro vira espetáculo de humilhação.
Essa postura destrói equipes, enfraquece laços, desencoraja talentos, mata iniciativas e espalha medo. Nos ambientes públicos, atrasa serviços, viola direitos e aumenta a ineficiência que tanto se critica. Na família, transforma lares em trincheiras. Na sociedade, gera indivíduos que se julgam acima da lei e da ética.
Por que a síndrome do pequeno poder é tão abominável? Porque ela desmonta o valor essencial que sustenta qualquer convivência humana: o respeito.
A síndrome do pequeno poder é abominável porque desumaniza ao tratar pessoas como objetos; corrompe ao transforma autoridade em arma; adoece quando destrói emocionalmente quem convive ao redor; revela a pior face da vaidade humana e cria pequenos tiranos que acreditam serem gigantes.
Ela é abominável porque é injusta, porque se alimenta do medo, porque floresce na falta de limites, porque se mascara como disciplina, mas não passa de opressão.
E, sobretudo, porque não existe nada mais triste do que ver alguém desperdiçar humanidade para exercer um poder que nem existe de verdade.
Lidar com esse tipo de comportamento exige coragem, não a coragem de brigar, mas a de se manter íntegro em meio ao abuso. É preciso estabelecer limites, documentar abusos, buscar instâncias superiores, proteger a própria saúde emocional e jamais aceitar que humilhação seja normal.
Ambientes maduros e profissionais precisam deixar claro: Pequenos tiranos não têm lugar em grandes instituições.
O poder é responsabilidade não é arma; não é muro; não é palco e muito menos escudo para inseguranças pessoais. Poder não revela grandeza e sim, revela caráter
No fim, a síndrome do pequeno poder é o retrato de gente que perdeu o senso de proporção, que acredita que autoridade é licença para arbitrariedade, e que confunde hierarquia com soberania.
O verdadeiro poder não oprime, ele serve; ele acolhe; ele conduz e eleva. Quem precisa humilhar para se sentir grande, na verdade, já é pequeno, tão pequeno que precisa vestir a fantasia de autoridade para esconder o vazio que o corrói por dentro.
A síndrome do pequeno poder é, e sempre será, um dos comportamentos mais lamentáveis da condição humana. E só existe um caminho diante dela: repudiar, denunciar, limitar e defender o respeito como fundamento básico de qualquer relação.
Só quem é pequeno por dentro tenta parecer grande por fora.
E, como Lincoln lembrou, é exatamente nesse ponto que o caráter é testado.
Lembre-se: “As pessoas não vão lembrar de você pelo que você tem, pelo seu status ou pela posição social, lembrarão sim, para a vida toda pela forma como você as tratou”
Por: Weber Negreiros
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