Juiz Parima Veras, titular da 1ª Vara da Infância e Juventude em entrevista à FolhaBV. (Foto: Nilzete Franco)
Juiz Parima Veras, titular da 1ª Vara da Infância e Juventude em entrevista à FolhaBV. (Foto: Nilzete Franco)

Apenas seis crianças e adolescentes estão aptos à adoção em Roraima, enquanto mais de 40 famílias aguardam na fila do Cadastro Nacional de Adoção e Acolhimento. Atualmente, 89 crianças e adolescentes vivem em serviços de acolhimento no estado, sendo 40 crianças e 49 adolescentes.

Os dados são do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), que aponta que a maioria das crianças acolhidas não está disponível para adoção, pois o foco das ações é a reintegração familiar. “O abrigo é uma medida temporária. Nosso trabalho é restabelecer os vínculos familiares sempre que possível”, explicou o juiz Parima Veras, titular da 1ª Vara da Infância e Juventude.

Informações estão disponíveis em tempo real no site do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. (Foto: Reprodução/CNJ)

Reintegração é prioridade

Entre 2020 e 2025, foram registradas 21 adoções em Roraima, enquanto 794 crianças e adolescentes foram reintegrados às famílias de origem. No período de 2023 a 2025, o Tribunal contabilizou seis adoções e 476 reintegrações.

Segundo o magistrado, o dado evidencia que a adoção é a última alternativa prevista pela legislação. “A prioridade é que cada criança seja criada pelos próprios pais, e, na falta deles, por alguém da família extensa, como avós, tios ou irmãos mais velhos”, disse.

As reintegrações ocorrem após acompanhamento das famílias por equipes técnicas formadas por psicólogos, assistentes sociais e pedagogos. “Não devolvemos uma criança sem avaliar as condições da família. O retorno acontece apenas quando há segurança de que ela será acolhida com dignidade”, afirmou Parima.

Desafios e causas do acolhimento

Grande parte das crianças acolhidas vem de famílias afetadas por dependência química, alcoolismo ou transtornos mentais. “O maior desafio é lidar com famílias disfuncionais, pais ou mães adoecidos pelo uso de álcool e drogas. Quando não há recuperação, buscamos outro parente para assumir o cuidado”, explicou o juiz.

Há casos em que, mesmo após a reintegração, a criança precisa voltar ao serviço de acolhimento. “Isso acontece quando a estrutura familiar não se mantém, mas são situações pontuais diante do número de reintegrações bem-sucedidas”, completou.

Adoção e preparo das famílias

Das seis crianças atualmente disponíveis para adoção, algumas apresentam condições de saúde que exigem cuidados contínuos, como alimentação por sonda ou traqueostomia. “Esses casos exigem um perfil de adotante preparado para cuidados especiais, o que torna a colocação mais difícil”, disse o magistrado.

Outras três crianças estão em estágio de convivência e algumas em busca ativa nacional, quando a adoção é articulada com pretendentes de outros estados. “Não temos crianças ‘encalhadas’. O que há é um número muito maior de pretendentes do que de crianças disponíveis”, ressaltou.

Segundo o juiz, todas as famílias interessadas em adotar passam por um curso de preparação e avaliação técnica antes de serem incluídas no cadastro. “A adoção é um ato de amor, mas também de responsabilidade. Quem se prepara adequadamente raramente enfrenta dificuldades”, afirmou.

Entrega voluntária

O juiz também destacou a importância do procedimento de entrega voluntária, previsto em lei, que permite à gestante ou mãe entregar o bebê de forma legal e assistida. “Toda mulher tem direito de decidir, e a lei garante acompanhamento psicológico e jurídico. Após a audiência, ela ainda tem dez dias para se arrepender. É um processo humanizado e seguro”, explicou.

Segundo ele, o objetivo é evitar adoções informais ou ilegais, quando famílias tentam realizar entregas diretas sem seguir os trâmites legais. “É preciso combater a prática de doações irregulares. Quem quer adotar deve procurar a Vara da Infância ou a Defensoria Pública e seguir o caminho certo”, reforçou Parima Veras.

Mais pretendentes do que crianças

Atualmente, Roraima tem entre 41 e 43 famílias habilitadas para adoção. O número é cerca de sete vezes maior que o total de crianças aptas. “Existe um mito de que os abrigos estão cheios de crianças disponíveis. A realidade é o oposto: temos muitos pretendentes e poucas crianças aptas à adoção”, afirmou o magistrado.

Ele explica que, na maioria dos casos, as crianças acolhidas permanecem temporariamente até que seja possível o retorno à família de origem. “A reintegração é o caminho natural, porque o abrigo não é lugar de permanência, e sim de transição”, concluiu.