Na minha adolescência, no interior de Roraima, surgiu a oportunidade de fazer parte de uma aventura, a bordo de uma jangada navegando pelo rio Branco. O rio Branco é o mais importante rio do estado de Roraima – da sua nascente, formada pela confluência dos rios Uraricoera e Tacutu, até a sua foz no rio Negro, no Amazonas, são 577 km de extensão. Em alguns trechos, alcança considerável largura, que pode chegar a mil metros. É o rio que banha Boa Vista, a capital de Roraima. A jangada, em questão, não era daquelas usadas há séculos pelos pescadores do Nordeste brasileiro, inclusive no transporte de pessoas. A nossa jangada foi construída por cerca de mil e trezentas estacas de madeira, com aproximadamente dois metros de comprimento por quinze centímetros de diâmetro, amarradas umas às outras, de madeira que não afunda, em razão da sua densidade. Todas as estacas de madeira da jangada eram para comercialização. Vários dias de trabalho com muitas mãos até a jangada ficar pronta. Toda aquela madeira foi transportada da fazenda da nossa família, de carro de boi até a margem do rio, onde foi montada. O destino seria uma fazenda distante muitos quilômetros, rio Branco abaixo – trajeto que durou dois dias e ficou eternizado na minha memória!
A minha participação na aventura de jangada pelo rio Branco tinha sido barrada por ser, à época, um mancebo sonhador, mas depois fui aceito para aquela empreitada. A data para a nossa viagem foi bem apropriada: no período da cheia do rio Branco, que propiciava a navegação com segurança e oferecia cenários arrebatadores – além da beleza das lâminas d’água em constante movimento e da revoada de pássaros e de animais às margens do rio, faziam daquele lugar uma natureza irretocável. Perfeita!
O rio Branco, como todos os rios, no período das cheias, ou seja, quando o nível de suas águas aumenta consideravelmente de volume, gera espetáculos inimagináveis. Ao transbordar além de suas margens, cria a planície de inundação ou igapó – berçários de vida. É uma imensidão de água, formando incríveis correntezas e arrastando tudo pela frente, sobretudo no leito do rio: galhos de árvores, troncos, folhas e espécies da fauna de água doce. Foi nesse panorama que empurramos a grande jangada a favor da correnteza, indiferente a todos nós a bordo, em uma aventura surreal!
Toda a nossa viagem de jangada até a fazenda de destino foi, de certa forma, tranquila, mesmo quando se desprenderam algumas estacas – motivo de preocupação –, mas a nossa inquietação maior era a possibilidade de desintegração da jangada, o que significaria uma tragédia. Uma coisa que aguçou a nossa imaginação foram algumas toras de madeira que, avistadas de longe, descendo pelo rio, nos remetiam aos enormes jacarés e às sucuris-verdes que podem chegar a oito metros de comprimento. Foi assustador. Mas foi pura imaginação. E a água que “lambia” a superfície da jangada era um sinal de que dormir não fazia parte da nossa viagem. Era compreensível! A jangada era auxiliada por um barco com timoneiro, conhecedor das águas que “lavam” as margens do rio Branco, com suas curvas inigualáveis desde remotos tempos.
As aventuras são enriquecedoras em todos os sentidos, estimulam o físico, o mental e proporcionam o convívio social de forma muito positiva à vida. E potencializam a ideia de que viver é o maior espetáculo da Terra!
Luz!
Brasilmar do Nascimento Araújo – Jornalista e Poeta