O marco da criminalidade levada pelo garimpo ilegal a comunidades da Terra Indígena Raposa Serra do Sol foi o triplo homicídio que ocorreu em abril de 2022, no Município de Normandia, quando uma família foi atacada ao retornar do garimpo na Comunidade da Raposa. Os assassinatos ocorreram em uma emboscada na entrada da Comunidade Coqueirinho, caso este que impôs medo e silêncio naquela região em relação aos garimpeiros.
Desde lá, o garimpo ilegal se intensificou a ponto de transformar a realidade social da Raposa, onde muitos não apenas passaram a apoiar a atividade ilegal como também a fazer vistas grossas às invasões, drogas e alcoolismo, que abrem as portas para a violência, conflitos familiares e desagregação comunitária, com venda de terras para garimpeiros e outros não indígenas. Houve até caso de tuxaua destituído do cargo de liderança da comunidade por apoiar as atividades garimpeiras.
No entanto, uma ação contra o garimpo ilegal, realizada na semana passada por meio da Operação Fox Uno, que destruiu estruturas de garimpo ilegal e prendeu dez pessoas, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, foi um passo importante para impor ordem na região. A operação foi realizada em comunidades de Uiramutã e Normandia durante ação conjunta da Polícia Federal, Exército Brasileiro, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Ministério Público Federal (MPF).
Enquanto os defensores do garimpo esperneiam, acreditando que a ilegalidade irá imperar novamente, é importante que os envolvidos em atividades ilícitas repensem seus atos, pois essa operação realizada na semana passada foi apenas o início de uma operação ainda maior, que está sendo preparada para ocupar toda a região fronteiriça. Nesse ínterim, enquanto as ilegalidades estarão sendo combatidas, é importante que as comunidades indígenas se reorganizem para definitivamente expurgar o garimpo ilegal e suas consequências danosas.
Está sendo preparada a Operação Atlas, que é o maior exercício militar conjunto das Forças Armadas Brasileiras planejado para este ano, com foco principal no Estado de Roraima, na fronteira com a Venezuela e a Guiana, coordenada pelo Ministério da Defesa, reunindo Exército, Marinha e Força Aérea Brasileira. Um dia antes da operação realizada na Raposa Serra do Sol, dia 23, foi iniciado o deslocamento de estrutura e logística do Sistema Astros para Roraima.
Esse deslocamento estratégico está sendo feito pela 1ª Bateria de Mísseis e Foguetes do 16º GMF, que saiu de Formosa (GO) em direção a Belém (PA), que serve como ponto de apoio logístico. Depois seguirá por meio fluvial para Manaus (AM) e, por terra, até Roraima. A missão envolverá cerca de 8 mil militares e uma grande quantidade de veículos blindados e não blindados, incluindo sistema de artilharia de foguetes de longo alcance e alta precisão, chamado de Sistema Astros.
Embora não seja uma operação focada em combate a ilícitos, os militares irão fiscalizar toda região fronteiriça dentro da terra indígena, obviamente agindo diante de qualquer ilegalidade que for constatada. A operação responde a preocupações com movimentações militares venezuelanas na fronteira, como a construção de pistas de pouso, pontes provisórias e acampamentos entrincheirados, que sugerem intenções do presidente venezuelano Nicolás Maduro de manter pressão sobre a região de Essequibo, sob domínio da Guiana.
Como o exercício ocorrerá de 27 de setembro a 11 de outubro na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, no mesmo período da realização da 30ª Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas, a COP, que será realizada em Belém, a Operação Atlas será uma forma demonstrar a capacidade do Brasil de projetar poder militar em áreas remotas, reforçando a soberania nacional e a estabilidade regional, além de enviar um recado às potências ocidentais sobre a autonomia brasileira na defesa de seus interesses.
Então, esse será um momento importante para controlar o garimpo ilegal e outros ilícitos nas fronteiras com a Venezuela e Guiana, tempo este também essencial para as comunidades indígenas se realinharem em suas organizações. Até aqui, o garimpo ilegal avançou sobremaneira nas comunidades, em que muitos foram silenciados pelo temor de denunciarem, principalmente a partir do triplo homicídio em 2022, e por meio da cooptação de indígenas que passaram a apoiar e a praticar as atividades ilícitas.
Se o controle efetivo não ocorrer agora, com as forças estaduais e federais seguirem atuando após o fim da operação, o crime organizado está pronto para entrar para esses garimpos, alguns deles comandados por indígenas, que se venderam pelo brilho dourado apresentado pelos aliciadores, entre eles políticos e empresários de garimpo que saíram da Terra Indígena Yanomami.
*Colunista