Cotidiano

Número de pessoas que procuram atendimentos psicológicos aumenta

Procura por psiquiatria chega a quase 20 mil em um ano; centros oferecem tratamento gratuito

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O assunto ainda é pouco falado, quase como um tabu na sociedade. O indivíduo pode ter diversos sintomas, mas que sem ter acesso às informações, não sabe o que acontece com ele. Tremores, falta de ar, preocupação constante, sentimento de culpa e uma tristeza que não vai embora são apenas alguns sinais de que algo está errado e que pode caracterizar uma doença psicológica.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2017, o Brasil era o país mais ansioso da América Latina, com mais de 23% dos brasileiros com algum tipo de transtorno de ansiedade e 5,8% da população brasileira depressiva. Muitos fatores contribuem diretamente para esse quadro, como desemprego e pobreza.

Em Roraima, os números são alarmantes: somente no Hospital Coronel Mota, no ano passado, foram 18.2016 registros para atendimento de psiquiatria, ficando em primeiro lugar absoluto. Sendo seguido apenas de atendimentos para ortopedia e cardiologia. O que mostra o porquê de o Estado estar entre os cinco principais no número de suicídios no país.

Para tentar diminuir esses impactos e prestar assistência às pessoas que passam por essas circunstâncias, foi criada a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) que trabalha diretamente com programas e centros de acolhimentos a pacientes que apresentam algum tipo de transtorno mental.

Atualmente, sete municípios estão integrados a Rede, com a implantação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) em Pacaraima, Bonfim, Iracema, Mucajaí, Caracaraí, Alto Alegre e Boa Vista, que oferecem atendimento de equipe multidisciplinar para realização de tratamento de acordo com a necessidade de cada paciente.

Conforme o diretor do Departamento de Políticas Públicas de Saúde Mental, Renato Amaral, o lançamento do programa do Governo Federal “Crack, é possível vencer”, em 2012, deu novas iniciativas para a ampliação de tratamentos dentro da saúde mental. Hoje, o Estado oferece 11 leitos de psiquiatria no Hospital Geral de Roraima (HGR), um CAPS III, que funciona 24h, e um CAPS AD, que é voltado para o tratamento de dependência alcoólica e química.

“A demanda precisa ser espontânea. Se você foi lá, vai ser acolhido independente do horário. A partir desse momento, vai ser atendido pela equipe multidisciplinar e se realmente for julgado que você precisa de tratamento, e se for caso para a CAPS, que é a questão do transtorno mental grave e persistente, como esquizofrenia, bipolaridade, entre outros bem sérios, você vai continuar o tratamento. Vai se montar o Projeto Terapêutico Individual (PTI) e permanece até a equipe ver o momento ideal para alta e reinserção familiar e social. É isso que o CAPS trabalha, não é só a questão da patologia, mas sim a reinserção como um todo”, disse Renato.

O diretor informou também que, somente no CAPS III, são 40 funcionários trabalhando e que são mais de 13 mil atendimentos anuais e que o número tem aumentado também em relação a procura por tratamentos dentro do CAPS AD. “A questão do etilismo crônico e da dependência química é muito forte no nosso estado por questão de sermos tríplice fronteira. Venezuela, Guiana e Amazonas são portas de entrada e saída [para o tráfico] porque tem um corredor muito grande, que inicia aqui. E também a questão do aumento da imigração, muitos estão vindo com problema de dependência alcoólica e química”, completou.

AMPLIAÇÃO – Por se tratar de portaria ministerial do Governo Federal, a RAPS trabalha apenas com as normas nacionais, portanto, ainda não pode implantar novos Centros para atendimento. Porém, na semana passada foi lançada a portaria que permitia a inclusão do CAPS IV, que são oferecidos para municípios acima de 280 mil habitantes e que tiveram 10 leitos ocupados com internação de curta duração. O projeto ainda está sendo avaliado pelo Governo de Roraima para saber se será implantado ou não.

Em 2016, houve um interesse por parte o Município de Boa Vista em fazer a construção do CAPS Infantil. A verba foi recebida pela Prefeitura de Boa Vista, mas houve desistência e o dinheiro foi devolvido para o Ministério da Saúde.

Em relação a implantação do CAPS Infantil, a Prefeitura de Boa Vista afirmou que é “importante esclarecer que para a construção de qualquer unidade, embora haja um investimento do Ministério da Saúde, a prefeitura deve dar uma contrapartida. No entanto, na época, o valor requerido era muito alto para o município arcar”. As crianças do município recebem atendimento com psicólogos e psiquiatras no Centro de Atenção Psicossocial – CAPS II e também no Hospital da Criança Santo Antônio.

Pacientes ainda encontram dificuldades para conseguir atendimento

Mesmo com a ampliação da Rede e dos serviços oferecidos, ainda existem algumas barreiras enfrentadas para quem procura esse tipo de serviço no estado. Uma servidora pública que não quis ser identificada contou que passou por empecilhos dentro da Unidade Básica de Saúde, onde devem acontecer os primeiros atendimentos em relação a pacientes que apresentam doenças mentais. Segundo ela, os médicos não conseguiam identificar os motivos que levavam a falta de ar que ela sentia, que era o resultado de um transtorno de ansiedade.

“Eu comecei a ter esses sintomas aos 11 anos e só fui descobrir ano passado o que era. Eles têm dificuldade em identificar isso. Eu tive ansiedade, depressão, passei por vários médicos e eles diziam que eu não tinha nada. Ia aos postos de saúde e eles pediam exame e eles viam que não tinha nenhum problema respiratório. Eu fui diagnosticada com ansiedade dentro de uma sala do meu trabalho pelos próprios servidores”, relembrou. A servidora confirmou ainda que foi somente após ter sido encaminhada para o Hospital Coronel Mota que conseguiu dar início ao tratamento.

Segundo Renato Amaral, a situação é frequente e a rede municipal acaba transferindo pacientes que poderiam ser atendidos na rede básica para a estadual. “É muito complicado quando a gente fala de rede, parece é uma briga pessoal. Rede funciona interligada. A partir do momento que nós temos dentro da rede um município que joga para o estado a responsabilidade de fazer o papel é dele, complica. Onera a rede, nós inchamos a rede, não temos mais fluxos. Transtorno mental leve deve ser procurado dentro da rede do programa nacional atenção básica”, reforçou o diretor.

Para Renato, a situação estaria melhor desenvolvida se a empatia dos servidores fosse maior. “Isso é despreparo. Em um município que tem o CAPS implantado, subtende-se que aqueles servidores têm preparo para treinar essa rede básica. Os servidores do CAPS I e II [que são de responsabilidade municipal] têm que ter preparo, porque o estado ofereceu para eles treinamento. Só que o problema disso é mudança de gestão, então brinca-se com a saúde mental que é uma coisa séria. A saúde mental só é lembrada quando os gestores maiores têm problemas dentro de casa”, completou.

OUTRO LADO – A Prefeitura de Boa Vista informou, por meio de nota, que todas as unidades de saúde da rede municipal estão aptas para acolher qualquer pessoa que tenha um transtorno mental e fazer o encaminhamento adequado. “Faz parte da rotina das unidades básicas também a orientação à população sobre a importância da saúde mental através de palestras e rodas de conversas”, frisou.

O atendimento com profissional, psicólogo, não faz parte da constituição da estratégia de saúde da família, mas é um serviço especializado que pode ser oferecido nas unidades básicas de saúde de acordo com as condições orçamentárias.

Em algumas unidades, a prefeitura possui psicólogos que fazem parte do quadro de servidores. Não há nenhum relato de dificuldade de acesso ao acolhimento de pessoas com transtornos psicológicos nas unidades. “É importante ressaltar o trabalho realizado pelo Centro de Atenção Psicossocial – CAPS II, que também está de portas abertas para dar suporte às pessoas que precisam de acolhimento e que enfrentam momentos de crise”, afirmou. (A.P.L)

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