A presença de crianças e adolescentes nos semáforos de Boa Vista é cada vez mais constante, expondo-as a riscos e vulnerabilidade social. A equipe de reportagem da Folha esteve, por uma semana, em diferentes locais da Capital e flagrou inúmeros casos.
No semáforo da Avenida Terêncio Lima, bairro Mecejana, zona oeste, duas crianças, uma de 10 anos e outra de 12 direcionavam-se aos carros para pedir ajuda. O pai dos menores, um homem de 38 anos, de nacionalidade venezuelana, com um cartaz nas mãos buscava emprego.
À Folha, o cidadão relatou ter chegado a Roraima há uma semana, trazendo incertezas e em busca de um recomeço. Indagado por estar com seus filhos naquele lugar em situação de vulnerabilidade, A.G. afirmou que não tinha com quem deixar as crianças e nem um teto para viver com elas, sendo a alternativa para tê-las mais próximas e “seguras”.
Na Avenida General Ataíde Teive, bairro Caimbé, uma indígena com duas crianças se aproximava dos veículos pedindo dinheiro. No mesmo local, uma mulher venezuelana com três crianças, sendo uma de colo, buscava ajuda. No Centro de Boa Vista, na Rua Inácio Magalhães, outra situação foi constatada próximo ao centro comercial Caxambu. No local, uma indígena estava com duas crianças sentadas e ao mesmo tempo comendo, sem aparentar nenhuma higienização.
Perto do meio dia, da sexta-feira, 19, na Avenida Ville Roy, cruzamento com a Avenida Santos Dumont, inúmeras famílias de origem venezuelana, com aproximadamente 12 crianças, se arriscavam entre os carros. Sensibilizados, alguns condutores ajudavam as crianças.
Em entrevista à Folha, a chefe de Divisão de Proteção da 1ª Vara da Infância e Juventude de Roraima, Lorrane Costa, disse que desde 2014 a Justiça realiza trabalhos para coibir a presença de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, no entanto, faltam políticas públicas para efetivação.
Segundo Lorrane, a Divisão de Proteção tem mediado com Município e Estado a implementação de políticas públicas, no entanto, sem êxito. “Buscamos junto ao poder público a parceria para proporcionar a essas pessoas um local adequado pra viver com essas crianças, pois só assim é possível fazer a remoção delas das ruas”, disse. “Se não tem onde colocar essas famílias, não é possível fazer as diligências. Não podemos retirá-las das ruas e levá-las para outro lugar que não lhes propõe segurança”, acrescentou.
A chefe de Divisão de Proteção reforçou que, independente da nacionalidade, as crianças que entram no Brasil são resguardadas pela lei brasileira. Caso as medidas não sejam atendidas, será aberto um processo de medida protetiva.
PREFEITURA – Em nota, a Secretaria Municipal de Gestão Social (Semges) informou que tem promovido abordagens sociais nas ruas e em algumas praças da capital orientando os migrantes venezuelanos quanto à permanência deles nesses locais, além de fazer os encaminhamentos necessários.
“A Prefeitura de Boa Vista promove diversas ações de amparo aos venezuelanos em áreas como educação, por meio das matrículas de crianças na escola; de saúde, com atendimentos nos postos de saúde e Hospital da Criança Santo Antônio; e no social, com o levantamento e cadastramento junto aos programas sociais, porém, a inclusão em programas e projetos sociais requer a regularização no país. Além disso, é estudada junto ao Governo Federal a criação de abrigos para atender aos migrantes”, acrescentou em nota.
GOVERNO – Por meio de nota, a Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) informou que possui em sua estrutura o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti-RR), responsável por fiscalizar, coordenar, prestar apoio técnico, assessoria e acompanhamento aos municípios, incluindo Conselhos Tutelares e Centros de Referência Especializado em Assistência Social (Creas), sendo estas as responsáveis pela busca ativa das situações de vulnerabilidade envolvendo crianças, ação direta e execução de ações de combate ao trabalho infantil, incluindo o público imigrante.
“Neste contexto, existe ainda a Divisão de Ações de Média Complexidade (DAMC), que presta assessoria, supervisiona e monitora os serviços ofertados nos Creas implantados no estado de Roraima. Tanto a equipe do Peti-RR como da DAMC disseminam informações, promovem a capacitação de profissionais a nível municipal e auxilia na realização de audiências públicas para organizar e fortalecer a rede de proteção”, informou.
A Setrabes ressaltou que os Creas são as unidades públicas municipais que ofertam serviços continuados de proteção social especial de média complexidade e destina-se ao atendimento e acompanhamento de famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social, cujos direitos tenham sido violados ou ameaçados.
Já o Conselho Tutelar é o órgão essencial ao Sistema de Garantia de Direitos, responsável por zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes, concebido pela Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990, para garantir proteção integral de toda a criança e adolescente no Brasil.
Ainda em nota, reforçou que o Governo do Estado mantém três abrigos que atendem mais de 1.300 imigrantes venezuelanos, sendo dois em Boa Vista e um em Pacaraima. “De qualquer forma, no caso das crianças que se encontram em situação de vulnerabilidade, o Conselho Tutelar é acionado para avaliar cada caso”, pontuou. (E.M)