Com o desabastecimento e a escassez de produtos básicos na Venezuela, decorrentes da grave crise política e econômica do país, o município fronteiriço de Pacaraima, Norte de Roraima, viveu um “boom” no comércio nos últimos meses. Diariamente, centenas de venezuelanos visitavam a cidade em busca de alimentos e remédios, tanto para próprio consumo quanto para revenda. Essa explosão no mercado, no entanto, teve seus dias contados. De acordo com Edson Freitas, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), há aproximadamente um mês as vendas entraram em declínio, uma queda de 90%.
Os fatores que desencadearam esse enfraquecimento nas vendas são distintos: valorização do Bolívar, a intensa fiscalização de órgãos federais e estaduais, a concorrência com empresas de atacado, inclusive de outros estados, e a mudança na vistoria promovida pelo Serviço Nacional Integrado de Administração Aduaneira e Tributária da Venezuela (Seniat).
Para Cleber Wesley, gerente de uma empresa de atacado inaugurada há mais ou menos dois anos na Capital, que exporta produtos de gênero alimentício para o país vizinho, o motivo principal é a desvalorização da moeda venezuelana. “Eles [venezuelanos] não estão conseguindo comprar os produtos aqui do Brasil. Ficou mais difícil e caro para transformar a moeda deles em Real”, explicou.
Um dos empresários procurado pela Folha, que preferiu não se identificar, disse que hoje o Bolívar está valendo aproximadamente 550 por R$1,00 no câmbio negro. O empresário investiu no comércio do município este ano e, mesmo com o quantitativo diminuindo, afirma não ter se arrependido. “Foi uma aposta. Eu tinha capital sobrando e quis investir no negócio. O jeito agora é esperar o mercado normalizar”, disse.
Para o empresário Ricardo Rodrigues não foi diferente. Suas vendas diminuíram cerca de 60%. “Um dos motivos da queda foi o aumento na fiscalização. A Receita Federal e a Sefaz [Secretaria Estadual da Fazenda] estão em cima, até o próprio Seniat começou a cobrar suas taxas. Isso também baixou a procura dos venezuelanos. Fora a situação instável do país, ninguém sabe o que vai acontecer”, declarou.
De acordo com a Associação Comercial e Industrial de Pacaraima, antes da crise na Venezuela havia mais ou menos 15 estabelecimentos que vendiam alimentos. Hoje, este número ultrapassa 100. A solução para esses empresários, segundo o presidente da CDL, é apenas aguardar. “Alguns já estão desistindo e buscando abrir negócios em Boa Vista. Estamos falando de mercado de fronteira e isso que está acontecendo é natural. Não há muito que fazer, o jeito é esperar”, explicou.
O economista Raimundo Keller concorda com Freitas. “Essa é uma queda momentânea. Nossos produtos ficaram caros para eles”. O Seniat passou a restringir um quantitativo de mercadorias que caracterizasse comércio e isso também influenciou na queda. “Até a eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, é um fator importante. O dólar já apresentou elevação e essa variação cambial não é favorável para os venezuelanos”, acrescentou o economista.