SAÚDE ESTADUAL

Três recém-nascidos morreram na Maternidade por falta de diálise ou técnica inadequada, diz denúncia

Denunciante afirma em relatório que pacientes tinham de 25% a 50% de chance de recuperação, quando aplicada a técnica correta

Familiares devem entrar em contato com o setor de Serviço Social da maternidade (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)
Familiares devem entrar em contato com o setor de Serviço Social da maternidade (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

Um médico denunciou que a precarização das diálises do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth pode ter custado a vida de pelo menos três recém-nascidos internados na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) pediátrica entre 17 e 21 de julho.

O denunciante, que pede sigilo total por receio de possíveis retaliações da gestão estadual, disse ter encaminhado o relatório, que inclui prontuários e pareceres do estado de saúde de pacientes, a três órgãos de fiscalização, para cobrar a apuração dos casos.

O Ministério Público de Roraima (MPRR) confirmou ter recebido a denúncia e disse que abriu procedimento para investigar os fatos relatados para, então, adotar as medidas necessárias.

O Conselho Regional de Medicina (CRM-RR) diz que apura rigorosamente todas as denúncias que chegam à instituição, confirmou que soube da nova reclamação e que vai adotar todas as medidas cabíveis.

A Folha não conseguiu falar com o presidente da Comissão de Saúde e Saneamento da ALE-RR (Assembleia Legislativa de Roraima), deputado Cláudio Cirurgião (União Brasil).

Em nota (que pode ser lida na íntegra ao final da reportagem), a Sesau (Secretaria Estadual de Saúde) disse que até o momento não foi notificada por qualquer órgão fiscalizador sobre a falta ou precarização da diálise, afirmou que, quando receber a denúncia, vai apurar o assunto “com o rigor que merece” e negou as acusações de assédio moral contra médicos nefrologistas.

“A secretaria reafirma o compromisso público em fornecer todos os esclarecimentos relevantes sobre o atendimento prestado aos pacientes envolvidos, e coloca-se à disposição para colaborar com os órgãos públicos de controle em quaisquer investigações necessárias”, finaliza a pasta.

As mortes

O denunciante narra que uma médica nefrologista solicitou diálise urgente às 19h15 de 17 de julho para um recém-nascido internado com pneumonia grave. Ele não encontrou indícios de que foi instalado o cateter do procedimento no paciente, cujo quadro evoluiu a óbito.

Para um outro recém-nascido, que evoluía com insuficiência renal aguda, o pediatra plantonista solicitou avaliação da nefrologista, que indicou a diálise imediata às 12h35 de 19 de julho. O procedimento iniciou somente à 1h30 do dia seguinte e, segundo o denunciante, era inadequado, porque incluiu o uso de cateter adulto adaptado para criança no abdômen. “O procedimento da forma que foi executado, com atraso de mais de 2 horas para o início, além da má técnica aplicada podem ter contribuído para o óbito da criança”, diz.

No caso de outro recém-nascido internado com evolução para insuficiência renal aguda, o médico avaliou a criança às 20h de 20 de julho e indicou início imediato de diálise com cateter neonatal adequado e com balança de precisão para medir fluidos de entrada e saída, além de aparato adequado para aquecimento e controle de temperatura do fluido usado na diálise. Às 6h30 de 21 de julho, a criança ainda estava sem o cateter e a diálise, o que contribuiu para sua morte, segundo o denunciante.

Na denúncia, o médico explica que pacientes com essas características têm de 25% a 50% de chance de recuperação, quando aplicada a técnica correta. “Portanto rechaço possível narrativa de que a criança evoluiria de qualquer forma para óbito”, diz o denunciante, que aponta irresponsabilidade do governo estadual e da empresa credenciada.

Assédio moral

O denunciante finaliza a reclamação citando supostos assédios morais praticados por gestores, incluindo a secretária de Saúde, Cecilia Lorenzon. “Estes estão promovendo verdadeira perseguição com os médicos nefrologistas estatutários gerando doenças psíquicas e afastamentos”, relata.

Nota completa da Sesau

“A Secretaria de Saúde esclarece que, até o momento, não recebeu notificação de qualquer órgão de fiscalização e controle acerca de falta ou precarização nos procedimentos de diálise no Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth.

Ressalta ainda que, assim que receber a denúncia, irá apurar e investigar o assunto com o rigor que merece, a fim de verificar se houve ou não negligência.

No que se refere às acusações de assédio moral contra médicos nefrologistas, a pasta ressalta que não faz parte da conduta da atual gestão a prática de tais medidas, e estranha o fato de a discussão surgir justamente quando houve perda de exclusividade do contrato da empresa responsável pela prestação do serviço, da qual os médicos mencionados são sócios proprietários. Informa ainda que, até o momento, não recebeu nenhuma denúncia de assédio moral na Ouvidoria da Saúde.

Vale ressaltar que não há médicos locais aptos ao exercício da especialidade, visto que todos os servidores do quadro efetivo apresentaram atestado psiquiátrico de afastamento. No entanto, o serviço permanece sendo realizado por meio de especialistas de fora do Estado, contratados pela Sesau.

A secretaria reafirma o compromisso público em fornecer todos os esclarecimentos relevantes sobre o atendimento prestado aos pacientes envolvidos, e coloca-se à disposição para colaborar com os órgãos públicos de controle em quaisquer investigações necessárias.”