ATENÇÃO AOS INDÍGENAS

TRF-1 mantém Funai obrigada a executar plano de atendimento a indígenas venezuelanos em Roraima

Corte concluiu pela “evidente omissão da Funai no que se refere à acolhida, à assistência e à preservação dos povos indígenas venezuelanos"

Indígenas venezuelanos Warao em abrigo improvisado (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
Indígenas venezuelanos Warao em abrigo improvisado (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou, por unanimidade, um recurso da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e da União e manteve o órgão obrigado a executar plano de ação para atendimento a indígenas venezuelanos refugiados em Roraima.

Na sentença do processo iniciado em 2019, o relator desembargador federal Souza Prudente explica que “a inércia em promover medidas práticas para a proteção dos refugiados venezuelanos compromete os direitos sociais dos povos indígenas, bem como a política indigenista como um todo, caracterizando omissão do Poder Público”.

A Corte fundamentou a decisão no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que garante a brasileiros e estrangeiros residentes no País uma série de direitos, também estendidos a estrangeiros não residentes.

Citando leis e decretos federais, sobre princípios e diretrizes da política migratória e medidas de assistência emergencial para acolhimento a refugiados por crise humanitária, além de acordos e convenções internacionais, o tribunal concluiu pela “evidente omissão da Funai no que se refere à acolhida, à assistência e à preservação dos povos indígenas venezuelanos que se encontram em fluxo migratório para o Brasil”.

O plano

O plano destinado aos povos venezuelanos Warao e E’ñepá foi idealizado pela própria Funai em 2018, após recomendações do Ministério Público Federal (MPF), mas até hoje não foi executado.

Diante da omissão da Funai, que atribuiu o atraso à falta de recursos orçamentários, o MPF entrou com ação visando a proteção da cultura e da saúde dos indígenas que se encontram em situação de extrema vulnerabilidade e precariedade desde 2015.

O MPF entende que o Poder Público não pode alegar limitação orçamentária para justificar a omissão na prestação de serviços públicos imprescindíveis à garantia de direitos mínimos.

Em 2021, ao julgar procedente a ação, a Justiça Federal de Roraima determinou que a União fornecesse todos os recursos financeiros e técnicos necessários e que a Funai comprovasse o cumprimento de ações concretas na implementação das políticas públicas.

Na sentença, a Justiça citou ainda relatos de alcoolismo, consumo de drogas por crianças e adolescentes, cooptação de indígenas para prática de condutas ilícitas como tráfico de entorpecentes, além da superlotação de abrigos e indígenas em situação de rua.

Em março de 2022, o MPF apresentou pedido de cumprimento provisório da sentença, alegando que aguardar o final do julgamento colaboraria com a morosidade na implementação do plano de ação. No documento, o procurador da República, Alisson Marugal, pediu a intimação da Funai e da União, para que comprovassem o cumprimento da sentença, sob pena de multa.

Marugal apontou que as políticas públicas efetivadas anteriormente estão sendo limitadas ou descontinuadas por conta de cortes orçamentários da União e que a atuação da Funai continua discreta e insuficiente.

“Se o plano estivesse sendo cumprido, certamente a Funai estaria exercendo função de protagonismo nas mencionadas tratativas, contribuindo para a efetivação de um diálogo permanente e eficaz entre os indígenas venezuelanos e as autoridades brasileiras”, destaca trecho do documento.

O procurador ressalta ainda que, apesar da atribuição constitucional do Ministério Público de defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas, “o órgão com expertise e competência para fazer a intermediação culturalmente adequada nesse caso delicado é a Funai, responsável por estabelecer as diretrizes e garantir o cumprimento da política indigenista no Brasil”.