A população brasileira viu uma cena de ataque no debate dos candidatos pela prefeitura de São Paulo, transmitido pela TV Cultura, no último domingo (15). A cadeirada de José Luiz Datena (PSDB) em Pablo Marçal (PRTB) marcou a internet e os veículos de comunicação.
No entanto, essa não seria a primeira vez que ataques, sejam físicos ou morais, ilustraram a política do país e do mundo. Um estudo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do Brasil, que reuniu dados do Instituto Terra de Direitos e a Justiça Global e pelo Sistema Córtex, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, mostram um aumento alarmante na violência contra candidatos nas eleições.
Entre janeiro e novembro de 2020, foram registrados 100 casos de homicídios e tentativas de homicídio contra candidatos, com 14 ocorrências nos dois dias antes do primeiro turno. Além disso, houveram 264 crimes de ameaça e lesão corporal, sendo 201 deles entre setembro e novembro daquele ano. Em comparação, foram 46 ataques em 2018 e 2016, e 136 em 2019, ano pré-eleitoral.
Mais ataques, menos propostas
Os ataques pessoais e lesões corporais durante campanhas eleitorais se tornaram-se uma estratégia, segundo Linoberg Almeida, mestre em Sociologia Política, de candidatos que se encontram em desvantagem nas pesquisas. Os canais de comunicação, mas principalmente as redes sociais e os perfis pessoais, desempenham um papel crucial para os ataques. A consequência disso é menos propostas e péssimas escolhas na urna.
“O eleitor, fruto das mídias sociais, espera o confronto. […] As mídias sociais permitem um retorno mais imediato do ataque, pelo alto poder de engajamento. E como consequência, perdemos esse potencial [da comunicação] como fator que capacita, democratiza acesso, permite conhecer ideias que, quando contrapostas ou debatidas, permitem uma escolha”, observa Almeida.
Para resolver isso, Linoberg reforça que o papel de um cidadão é se informar de diversas fontes antes de tomar decisões. Embora o debate político seja uma ferramenta importante de informação, não deve ser a única para definir a representação política. “O ringue de ataques pessoais tem algo de entretenimento em tempos confusos. A decisão no dia da urna pede mais foco no que realmente importa”, completou o especialista.
Fanatismo político e violência
Para o sociólogo Paulo Racoski, esse cenário de conflitos na política é um reflexo do fanatismo que se intensificou nos últimos anos. Ele destaca que, em contextos de crise e polarização – como direita versus esquerda, o eleitor não apenas apoia um candidato, mas o idolatra, o que leva ao cenário de violência e intolerância. No entanto, isso é um reflexo da falta de esclarecimento da população e do impacto das estratégias de propaganda, mesmo em uma era tão informada.
“Essa defesa sanguínea e feroz das pessoas pouco esclarecidas faz com que elas entrem nessa questão, ignorando as consequências e perpetuando esse ciclo de falta de responsabilidade socio-histórica. Os humanos se animalizam, acreditando que o candidato é seu amigo íntimo. Acabam acreditando que aquele candidato está preocupado com a sua vida pessoal ou familiar. E isso é um grande erro”, ressalta.
O fenômeno da “manada” no Brasil é também um ponto de preocupação para o sociólogo. Racoski critica a forma como a política é tratada como um espetáculo e afirma que o comportamento leva a uma superficialidade do assunto, mantendo o ódio e a desinformação.
“O que temos agora é a agudez e a velocidade das questões, e cada vez mais, porque as pessoas passam mais de seis horas, em média, quem tem acesso à internet e a smartphone, olhando fenômenos e acontecimentos. Elas ficam, a gente poderia dizer, até cegas quanto à racionalidade ou à reflexão sobre os acontecimentos sociais, políticos, econômicos ou culturais. Vão ver a outra pessoa como o inimigo e vão atacar. Tal como o efeito manada”, explicou.