Depois de uma sessão que se estendeu por mais de 12 horas, foi adiada a votação do relatório final da CPI do Sistema Prisional por falta de quórum. No final da sessão, por volta das 21h de ontem, apenas nove parlamentares estavam presentes ao plenário, o que inviabilizou a votação do relatório, pois para uma votação como essa é necessária maioria simples.
A sessão, uma das mais longas do parlamento roraimense, foi cheia de manobras, atrasos e negociações de bastidores. Começou em clima de indefinição, pois, pela manhã, no início da sessão, não havia quórum suficiente para a realização da sessão ordinária. Após o presidente interino, deputado Gerson Chagas (PRTB), dar o tempo regimental para a chegada dos parlamentares, o quórum foi completado apesar da ausência de seis deputados pela parte da manhã.
Outro ponto interessante, ocorrido após a abertura da sessão, é que a ordem do dia distribuída para a imprensa não continha a votação do relatório da CPI do Sistema Prisional, que estava marcada em ordem anterior. Mas, logo em seguida, um novo boletim foi liberado, já com a votação do relatório constando novamente.
PORTAS FECHADAS – Antes do início efetivo da votação, os parlamentares ficaram mais de duas horas conversando a portas fechadas. A conversa contou com a presença de enviados governistas, como o secretário estadual João Pizzolati. Como não houve acordo entre oposição e governo, os deputados resolveram suspender a sessão, que só foi retomada às 17h.
Durante a tarde, o clima ficou mais tenso com os parlamentares da base aliada discutindo a legalidade de votação do relatório e fazendo a todo momento pedido de vistas, o que era negado pela Mesa Diretora. No final, ficou definido que o relatório, que continha mais de 217 páginas, seria lido pelo primeiro secretário Izaias Maia (PTdB). A leitura durou mais de três horas e os deputados foram aos poucos abandonando a sessão. Chicão da Silveira (PP) ainda chegou a pedir a suspensão da leitura do relatório, o que foi negado pelo presidente Gerson Chagas.
Só ficaram até o final da sessão os deputados Marcelo Cabral (PMDB), Gerson Chagas (PRTB), Izaias Maia(PTdB), Joaquim Ruiz (PTN), Jorge Everton (PMDB), Valdenir Ferreira (PV) e Lenir Rodrigues (PPS). Os deputados Aurelina Medeiros (PTN), Soldado Sampaio (PCdB) e Mecias de Jesus (PRB), que pediram a leitura na íntegra do relatório da CPI, não ficaram até o final da sessão.
O relator Jorge Everton criticou o posicionamento dos seus pares. “Os deputados que pediram para ler na íntegra o relatório sequer estão no momento na sessão. Não poderemos fazer a votação por falta de compromisso desses parlamentares com a verdade. Eu espero sinceramente que nesta quarta-feira a gente possa tirar essa indefinição e votar de uma vez esse relatório”, declarou.
O presidente interino da Casa, deputado Gerson Chagas, afirmou que o relatório será votado na sessão desta quarta-feira. “Agradecemos o compromisso do deputado Izaias Maia e de todos que se encontram presentes até o final da sessão. Mas, para haver votação, precisaríamos de maioria simples, ou seja, a presença de 13 deputados em plenário. Portanto, por falta de quórum transferimos a votação para esta quarta-feira”.
Relatório pede indiciamento de 15 pessoas
O relatório com 217 páginas da CPI do Sistema Prisional pede indiciamento de 15 pessoas, entre servidores públicos, empresários e dois secretários estaduais. O texto foi aprovado na semana passada pelos integrantes da Comissão por dois votos a um, em uma votação acirrada.
Formada pelos deputados Lenir Rodrigues (PPS), presidente; Jorge Everton (PMDB), relator; Chico Mozart (PRP), vice-presidente; e como membros Soldado Sampaio (PCdoB) e Mecias de Jesus (PRB), a CPI é resultado de um requerimento apresentado em 2016, por Jorge Everton, para apurar as falhas no sistema prisional de Roraima.
“Os indiciamentos feitos decorrem de tudo aquilo que já foi relatado durante toda a instrução da CPI e pelos documentos requisitados. A necessidade de se concluir os trabalhos da comissão, a fim de se dar uma resposta à sociedade, bem como garantir que os órgãos de controle adotem em tempo hábil as medidas sugeridas, entendemos não ser necessária à coleta de depoimento de todos os indiciados, pois, como já dito, os depoimentos foram uma das inúmeras fontes de provas das irregularidades”, disse o relator da CPI deputado Jorge Everton, que espera uma votação unânime na provação do relatório.
“Espero sinceramente que os deputados analisem o nosso relatório de forma técnica, obedecendo ao princípio da legalidade. Eu aprovei o relatório indiciando 15 pessoas e acredito que esses indiciamentos serão mantidos”, disse o relator.
Governo diz que chefe do Executivo não tem responsabilidade por atos de terceiros
O relatório da CPI do Sistema Prisional imputa à governadora Suely Campos (PP) supostos crimes de responsabilidade, com fundamento na Teoria do Domínio do Fato. O Relator da CPI, Jorge Everton, afirma que a governadora, ao expedir decreto emergencial, assinou um “cheque em branco” em mãos do titular da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc), visando tão somente mascarar contratações diretas e irregulares.
“Registre-se que ao expedir o Decreto nº 20.760-E/2016, a governadora instituiu grupos técnicos para acompanhar a situação emergencial do sistema prisional, inclusive com os dois principais órgãos de controle interno do Estado, a saber, Procuradoria–Geral do Estado (PGE/RR) e Controladoria-Geral do Estado (CGE/RR). Além disso, as emergências surgidas não nasceram de uma mera arbitrariedade por parte da chefe do Poder Executivo, pois o STF, na ADPF 347, reconheceu o estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro, assim, caso pensemos que o decreto foi uma fraude, a decisão do STF terá padecido do mesmo vício, mas sabemos que não é o caso”, diz o governo por meio de nota.
Em relação à denúncia de que a governadora teria passado um “cheque em branco” ao deixar que os secretários fizessem o gerenciamento dos recursos do sistema prisional, o governo afirmou que o decreto emergencial não pode fundamentar uma contratação direta. “Portanto, o ato de expedir decreto emergencial é uma atividade própria do chefe do Poder Executivo, não podendo ser indevidamente confundido com ato ilícito ou fraudulento. Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. Mas a posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção [“dever de saber”] é do direito anglo-saxão e não é correta”, destacou.
Para o governo, em nenhuma passagem do relatório existe qualquer indicação que prove o comando intelectual da governadora, tanto que uma das premissas para se configurar a Teoria do Domínio do Fato é manter o controle das atuações para o cometimento de crimes. “Diga-se de passagem que a única citação à palavra ‘governadora’, em todos os depoimentos, se resume à afirmação que ‘nunca recebemos nenhuma imposição de nenhum governador, nem governadora ou de chefe nenhum, obrigando a gente a fazer determinadas coisas ou fazer coisas erradas’. Se realmente a governadora tivesse o domínio do fato, ela teria criado mecanismos efetivos para a concretização de ilícitos, o que, evidentemente, não ocorreu, pois os órgãos de controle como a PGE/RR, por exemplo, tiveram atuação importante, opinando pela impossibilidade de utilização de contratações irregulares. Logicamente, se alguém porventura descumpriu os pareceres da PGE não foi a Chefe do Poder Executivo”.
O governo conclui a nota afirmando que é totalmente leviana qualquer imposição de condutas de terceiros a chefe do Executivo, pois viola o princípio da intranscendência subjetiva das sanções e individualização da conduta, sem falar na indevida responsabilização objetiva em caráter penal.