Polícia

Internos matam, desmembram e decapitam colega de quarto no CSE

A barbárie entre membros de facções criminosas se tornou símbolo de banalização pela vida

Faz alguns anos holofotes põem em evidência o Centro Socioeducativo Homero de Souza Cruz Filho (CSE), na região do Bom Intento, zona rural de Boa Vista. Era noite do sábado, dia 21, quando o adolescente Paulo Henrique Medeiros Soares, de 16 anos, foi morto, decapitado e desmembrado por outros internos. A vítima deu entrada no CSE na sexta-feira, dia 20 e foi morto no dia seguinte.

Conforme informações da Polícia os sócio-orientadores avistaram um menor sujo de sangue e perguntaram o que havia acontecido. Ele confessou que, na companhia de outros infratores, matara o menor dentro do banheiro, no interior do quarto.

A equipe de plantão do CSE entrou no quarto I do Bloco C, para saber a procedência dos fatos e se deparou com uma barbárie. O corpo estava sem a cabeça, sem uma das pernas e sem um braço. As partes separadas do corpo foram colocadas dentro de um vaso sanitário. Os menores foram retirados do dormitório e levados para uma sala da Unidade de detenção.

A Perícia Criminalística esteve no local para analisar a cena do crime e as condições do cadáver. Após procedimentos técnicos, o rabecão do Instituto de Medicina Legal (IML) fez a remoção do corpo para ser submetido a exame de necropsia.

No total, 15 internos foram conduzidos à Central de Flagrantes do 5º DP para prestarem depoimento. Só um deles tinha completado 18 anos. Tanto para os agentes sócio-orientadores quanto na Delegacia, em depoimento, os adolescentes relataram que a motivação do crime foi o fato da vítima ser colaborador de uma facção criminosa rival.

Um dos infratores disse desconfiar que a vítima era da facção rival porque já o conhecia e sabia que ele sempre esteve aliado ao grupo adversário. Para matá-lo, um dos elementos desferiu os primeiros golpes no peito e no abdômen do adolescente usando um vergalhão. A vítima estava no banheiro quando foi atacada.

O infrator contou que tomou o vergalhão e acertou mais alguns golpes na região do pescoço e na barriga. Não satisfeitos, depois de matarem o menor, o interno disse que se armou com um pedaço de louça e decapitou o suposto rival, desmembrando, uma das pernas. Ele não soube informar quem foi o responsável por retirar o braço do adolescente, mas que com exceção de dois adolescentes que estavam no quarto, todos tiveram participação na morte. Após a degola, os adolescentes cantaram músicas que fazem apologia ao crime e bateram palmas.

Um dos menores declarou que o adolescente era conhecido por acompanhar três membros da facção rival, vulgarmente chamados de “Bactéria”, “Coruja” e “Luxúria” e que eles já teriam matado mais de vinte integrantes do bando contrário.

Ao fim dos depoimentos, os 15 conduzidos foram recolhidos novamente ao CSE, onde darão continuidade às medidas socioeducativas, mas 12 deles tiveram o Auto de Apreensão em Flagrante por Ato Infracional (AAFAI) lavrado em desfavor, enquanto um indivíduo, de 18 anos, foi Autuado em Flagrante. Dois adolescentes não foram autuados por não existirem provas de que participaram do crime.

O caso foi encaminhado ao Departamento de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) que deve fazer uma investigação dos fatos. 

GOVERNO – Em nota, a Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc) informou que as circunstâncias do fato são investigadas pela Polícia Civil e que o adolescente ingressou na unidade sexta-feira, 20, por roubo, como prevê o artigo 157 do Código Penal Brasileiro (CPB).

“A Sejuc esclarece ainda que adotou todas as medidas administrativas e acionou o IML (Instituto Médico Legal) para a remoção do corpo do adolescente decapitado”, respondeu o governo. (J.B)

Sindicato diz que avisou ao governo sobre mortes no CSE

O Sindicato dos Trabalhadores Civis Efetivos do Poder Executivo do Estado de Roraima (Sintraima) procurou a reportagem da Folha na manhã de ontem, dia 22, para relatar que previam mortes com crueldade nas dependências do Centro Socioeducativo Homero de Souza Cruz Filho (CSE) e que uma série de recomendações e reivindicações em ofícios foi expedida ao governo, a fim de impedir que crimes ocorressem na Unidade.

O Sintraima demonstrou preocupação com a causa e culpou o governo pela morte, tendo em vista que, segundo o sindicato, há mais de um ano comunica sobre o risco iminente de mortes entre os internos e risco à vida de quem trabalha nas dependências da Unidade de detenção para menores.

“Nós já tínhamos avisado a Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social [Setrabes] sobre essa questão do sistema socioeducativo. O sindicato sempre esteve atento a isso. A preocupação é com os servidores porque sempre avisamos que existia uma divisão de grupos no sistema e nunca tomaram as providências. A culpa é do governo”, declarou.

A inquietação do Sindicato visa impedir que outras ocorrências iguais aconteçam, bem como minimizar as chances de que agentes sejam reféns da violência pelos menores infratores.

“Nós estamos preocupados com os servidores que estão trabalhando porque proporcionalmente, eles podem fazer com os agentes o que fizeram com o garoto, a mesma crueldade. Nós já enviamos muitos ofícios alertando e sugerindo sobre este assunto. Eles ainda não chamaram os aprovados no concurso, que a posse tinha que ser imediata. Ao longo dos dias diminui a quantidade de servidores que lá trabalham”, reforçou.

Dentre os ofícios emitidos pelo Sindicato, há um pedido para que os servidores que exercem atividades com infratores recebam gratificação por risco de vida. Além disso, os documentos reivindicam mais agentes para atender a demanda crescente do Centro Socioeducativo, além de quatro veículos, capacitação em defesa pessoal, gerenciamento de crise, leitura labial, escola de Sinase [Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo] para que os internos tenham acesso à educação. (J.B)

Governo diz que medidas estão sendo adotadas

Após a denúncia do Sintraima, a Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania informou que estão em andamento a reforma e o reforço da estrutura física do prédio do CSE. Na obra está inclusa a contenção interna, garantindo que, em situações de conflito, os agentes públicos estejam seguros e tenham tempo para reação. O término desses trabalhos é nos próximos 20 dias. 

Em relação ao efetivo, disse a Setrabes (Secretaria Estadual do Trabalho e Bem-Estar Social) trabalha para convocar sócio-orientadores aprovados no último concurso, aumentando o quadro de servidores do CSE. 

Em relação à morte do adolescente, a Sejuc ressalta que adotou as medidas de segurança com o ingresso dele na unidade. Considerando a situação verificada no sistema carcerário nacional e nas unidades socioeducativas de todo o País, de conflitos entre pessoas de facções rivais, ele foi colocado num alojamento em que estavam adolescentes autodenominados da mesma facção. 

“Portanto tratou-se de um fato atípico e imprevisível. Ainda em relação ao homicídio, a Sejuc esclarece que as medidas administrativas cabíveis para a situação foram praticadas”, concluiu a nota.