A adolescente Maria Clara Junor Gomes Carvalho, de 16 anos, está desaparecida após ter sido entregue pelo Conselho Tutelar de Boa Vista a uma pessoa desconhecida, segundo denúncia do pai, Jack Jean Gomes Carvalho. O caso ocorreu depois de uma ocorrência policial registrada na madrugada da última segunda-feira (13), envolvendo um desentendimento familiar.
De acordo com o relato do pai à FolhaBV, a filha teria acordado em surto, gritando e discutindo com a mãe. A Polícia Militar foi acionada duas vezes à residência. “Na segunda vez, eles levaram ela. O sargento disse que ia registrar a ocorrência na viatura e levaram as duas, ela e a mãe”, contou o pai.
Na delegacia, ainda segundo ele, o Conselho Tutelar foi acionado. “A conselheira e o conselheiro disseram que não deixariam ela voltar pra casa. Eu pedi pra que ela fosse encaminhada pra um abrigo, porque era mais seguro, mas não foi o que aconteceu”, afirmou.
O pai alega que a adolescente foi colocada dentro de uma viatura do Conselho e seria encaminhada para um abrigo. “Ela não foi pra abrigo nenhum. Depois descobrimos que estava em uma casa de estranhos. Tenho prints dela mandando mensagem pra mãe dentro da viatura’’, disse.
Jack Jean afirmou ainda que o Conselho não comunicou os pais sobre o paradeiro da filha e que apenas soube do desaparecimento ao tentar buscá-la no abrigo. “Fomos em todos, mas ela não estava. Um conselheiro confirmou pra mim que estava errado o que fizeram, porque nem o nosso depoimento tomaram. Disseram que o caso estava em segredo de justiça, mas isso não é verdade”, afirmou.
Denúncia e Acusações
O pai acusa especificamente dois conselheiros de terem entregue a menina sem autorização judicial nem acompanhamento de responsável legal. “A própria promotora disse que o procedimento foi errado. Eu me dispus a assinar qualquer documento pra levar minha filha, mas não deixaram. Agora ela está sumida desde aquela noite”, relatou.
A reportagem teve acesso a um documento assinado pela conselheira autorizando que a adolescente fique com F.G.R.S, que se compromete a cuidar da menina. No entanto, a família alega que não conhece o homem e que ele não faz parte da família. ‘’Como que uma conselheira entrega uma menina para um desconhecido? Alguma autoridade tem que tomar providências quanto a isso’’, questionou o pai, que registrou um boletim de ocorrência contra os conselheiros que atuaram no caso.
Ele também diz que a adolescente faz uso de medicamentos controlados e tem histórico de acompanhamento psicológico. “É uma menina bem cuidada, estudiosa. Só queremos saber onde ela está e que os responsáveis respondam pelo que fizeram.”
Por meio de nota o Conselho Tutelar informou que a adolescente foi entregue a uma pessoa de sua confiança como uma medida protetiva e humanizada. Confira a nota na íntegra:
O Conselho Tutelar – Território I de Boa Vista/RR esclarece que em nenhum momento a adolescente foi entregue a pessoa desconhecida por parte deste Conselho Tutelar.
Conforme consta em relatório oficial e documentado, a adolescente foi atendida após acionar a Polícia Militar, relatando ter sido agredida por sua genitora e sofrer negligência e violência física e psicológica por parte de ambos os pais. A adolescente afirmou ter medo de retornar ao convívio familiar, destacando temer por sua segurança e integridade física.
Diante do risco evidente, foi solicitado ao Poder Judiciário e ao Ministério Público orientação e aplicação das medidas protetivas cabíveis, em conformidade com o que dispõe o art. 101, incisos I e VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90).
Durante o atendimento, a adolescente recusou-se a ser acolhida em abrigo institucional, chegando inclusive a verbalizar intenção de autolesão caso fosse obrigada a tal medida. Ressalte-se que, conforme o art. 34, §1º, do ECA e a Lei nº 14.684/2023, o acolhimento institucional é medida excepcional e temporária, e não pode ser aplicado como forma de punição ou coerção, devendo-se respeitar a vontade, o bem-estar e a segurança do adolescente.
Diante dessa negativa e conforme faculta o art. 101, inciso I, do ECA, a adolescente indicou uma pessoa de sua confiança que se dispôs a acolhê-la de forma provisória, firmando Termo de Compromisso e Responsabilidade perante este Conselho Tutelar, até manifestação judicial.
A decisão observou o princípio da proteção integral e da prioridade absoluta, previsto no art. 227 da Constituição Federal e no art. 4º do ECA, segundo os quais é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à dignidade, à segurança e à convivência livre de violência.
Importante destacar ainda que a afetividade é reconhecida como forma legítima de vínculo e referência protetiva, conforme entendimento consolidado pela Doutrina da Proteção Integral, podendo ser considerada para garantir o melhor interesse da criança ou adolescente. Assim, o acolhimento pela pessoa indicada pela própria adolescente foi medida de caráter protetivo e humanizado, pautada na preservação de sua integridade física e emocional.
Portanto, a atuação do Conselho Tutelar se deu em estrito cumprimento ao dever legal de proteção e garantia de direitos, sem qualquer irregularidade e com base em dispositivos expressos do ECA e nas orientações da Lei Henry Borel (Lei nº 14.811/2024), que reforça a obrigação de atuação imediata diante de casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes.
O Conselho Tutelar reafirma seu compromisso com a defesa dos direitos humanos de crianças e adolescentes, repudiando qualquer forma de violência, negligência ou distorção dos fatos que possam comprometer a imagem e a confiança pública em suas ações.
Investigação e Contato
O caso foi denunciado e deve ser investigado pelo Ministério Público e pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).
A reportagem entrou em contato com a conselheira citada e aguarda resposta.
Quem tiver informações sobre o paradeiro de Maria Clara pode entrar em contato pelo 197 da Polícia Civil ou pelo 190 da Polícia Militar.