OPINIÃO

O olhar da janela

Walber Aguiar*

O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar.   Drummond

  Meu coração vislumbrou uma janela. Entendeu que há necessidade de saltarmos, olharmos, contemplarmos por e através dela. Estava ali, presente na vida de pais e fillhos. Afinal, diante das angústias que corroem a alma, ela pode jogar-se da janela do quinto andar, pois nada é fácil de entender. Traz à tona o pai, a figura paterna que tantas vezes se debruçou naquele espaço vazio, tanto quanto seu coração.

E por falar em espaços vazios, tanta angústia, tanta vaziez, tantas almas perdidas em busca de afeto, tantos corpos em busca da conjugalidade. Por isso há tanto vislumbre, tanto desejo de achar a outra metade, de contemplar o céu do desejo, da transcendência, daquilo que lateja na conflitividade dos nossos mais quentes afetos.

Ora, entre a mesmice no olhar e o cotidiano sem aventura, os olhos flertam com a distância, o coração mergulha naquilo que, de alguma forma pode preenchê-lo. Daí nasce o estranhamento, o inédito, o inusitado; a vontade de caminhar por trilhas estranhas, à semelhança dos “dois caminhos”, do poeta americano Robert Frost.

Ali havia o chão batido, explorado, tão pisado pelos pés da história e do tempo, dos peregrinos, andejos e andantes deste mundo. Do outro lado o caminho cerrado, o coração sufocado pela angústia da indiferença, do medo que causa o desafio de ser e de ir adiante.

Mas, ali estava a janela. Não era uma porta ampla, enorme, cheia de variadas possibilidades. Era o espaço da esperança, a geografia do ainda não, alguma coisa aberta para o novo e sua realidade histórica concreta. Era preciso sonhar, mas entregar-se aos dias insossos e apressados, ao desejo de captar alguma coisa boa, algum bocado de afeto e ternura, ainda que os monstros do existir nos persigam a alma cansada e fadada à desistência.

Mas, à semelhança do coração que busca a paixão, o amor, num salto quântico e cheio de encanto, o pai correu mais uma vez na direção do inusitado. E lá vinha ele, o menino que caíra em si, o peregrino errante que se aproximava tímido, acanhado e sem graça. Ali, o olhar do pai, o abraço. E celebraram, se olharam, se abraçaram, dançaram a valsinha de Chico e perceberam que haviam nascido um para o outro.

A janela continua ali, até hoje, à espera do filho pródigo, da menina linda, do olhar apaixonado e cheio de um amor que não apenas sente, mas sobretudo, decide amar…

*Advogado, poeta, historiador, Mestre em Letras, Professor de filosofia e membro da Academia Roraimense de Letras.