Cotidiano

Sem poder trabalhar, mecânico desabafa contra demora de TFD

Jander Ednei, de 43 anos, fraturou o ombro esquerdo e agora está devendo dois meses de aluguel e está sem condições nem para comprar remédio 

Depender do Sistema Único de Saúde (SUS) é a única opção para a maior parte da sociedade brasileira. A burocracia e os longos períodos de espera são alguns dos empecilhos enfrentados por pacientes que aguardam a liberação para Tratamento Fora do Domicílio (TFD) na busca pela recuperação.                  

Há pouco mais de dois meses, esta tem sido a luta do mecânico Jander Ednei, de 43 anos, que após sofrer um acidente de carro teve o ombro esquerdo fraturado em duas partes. Ele que sempre fez serviços braçais, se vê hoje em dia impossibilitado de gerar a própria renda e dependendo da pouca ajuda recebida por vizinhos e amigos.

Tudo começou em 14 de outubro deste ano, quando Jander estava no município de Pacaraima realizando um serviço para a empresa onde trabalhava havia pouco tempo, sem carteira assinada. Sem conseguir finalizar o serviço devido a um contratempo, o mecânico precisava retornar à Boa Vista, mas não tinha dinheiro para a passagem. Foi quando recebeu a proposta de carona vinda de um desconhecido.

Como no outro dia precisaria se apresentar na empresa, Jander aceitou a carona. Porém, em uma curva o veículo em que ele estava colidiu com outro carro e capotou algumas vezes na rodovia.

 “Como não tinha cinto atrás, eu estava sem. Só os dois da frente que tinham e não aconteceu nada com eles. Fiquei 10 dias internado e mandei um laudo pra empresa que eu trabalhava. Lá, ele [o dono] também se negou a me ajudar porque minha carteira não era assinada, sendo que ele tinha prometido fazer isso e falou aqui na minha casa. E hoje em dia eu estou assim, sendo penalizado”, lamentou.

Sem ter como trabalhar, o aluguel do apartamento onde mora, no Asa Branca, já está no segundo mês de atraso e três contas de energia se acumulam no armário onde ele e a esposa Maria da Glória, de 53 anos, guardam alguns documentos e exames que mostram a gravidade da situação.

O pequeno espaço onde vivem já foi solicitado pelo proprietário e agora o casal que vive junto há 15 anos precisa encontrar alguma forma para quitar a dívida ou outro local para morar até o início de janeiro. Nem mesmo Maria pode realizar os serviços casuais como diarista em que tirava entre R$ 50 a R$ 60. Devido a condição de Jander, ela agora precisa ajudar o marido a fazer pequenas tarefas, como vestir a própria roupa. 

“É complicado. Ele sente dor e eu não posso fazer nada. Não tem remédio pra ele tomar, porque o médico passou só dipirona. Mas como não temos dinheiro, não temos como comprar. O que doam pra gente é comida. São noites que ele passa com o braço doendo, eu não posso fazer nada. Às vezes eu passo um pouco de gel pra ver se ele consegue dormir, mas é muito difícil. Isso é algo que nunca aconteceu”, compartilhou Maria.

A espera pela liberação do TFD incomoda e a cada dia a mais o braço de Jander, segundo ele, fica mais roxo. Já sem aguentar sentir tanta dor na madrugada desta quarta-feira (18), o mecânico foi até o Pronto Atendimento Dr. Airton Rocha para ver o que podia ser feito, mas saiu de lá sem muitas mudanças no seu quadro clínico. 

“Sempre que pergunto do TFD, eles dizem que já encaminharam e que preciso aguardar. Fui no hospital, pedi um raio x e disseram que não precisava porque isso não iria alterar e nem resolver nada. Não me deram nem remédio. Não tem dipirona no hospital”, reclamou o paciente que passou a perceber o enrijecimento dos movimentos da mão.

O mecânico também deu entrada no Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre, mais conhecido como Seguro DPVAT, porém foi informado que só terá resposta da liberação ou não após março de 2020.

“Eu sempre trabalhei e nunca passei por isso. Talvez se o rapaz da empresa tivesse assinado a minha carteira, eu poderia estar recebendo uma pensão do INSS. Eu tenho poucas coisas e a maioria eu já vendi pra não ter que pedir dinheiro pra ninguém. Já não tenho mais o que vender. Se eu fizer isso, vou ficar com o que?”, indagou Jander.

GOVERNO – A reportagem da Folha procurou a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) para obter informações sobre o processo de liberação do TFD para o mecânico, porém a pasta não respondeu nosso questionamento até o fechamento desta matéria. O espaço permanecerá aberto para pronunciamento.