Cotidiano

Produtores rurais de Mucajaí se preocupam com o próximo verão

Moradores precisam se descolar até vilas e vicinais próximas para encontrar água; a sugestão é a aquisição de caixas de água

Em julho, choveu apenas 60 mm. Essa é a realidade da localidade do Tamandaré, subdividida nas vicinais da Serra Dourada e Lago do Manoel. Assim, mesmo durante o inverno, os moradores do interior de Mucajaí sofrem com o desabastecimento de água. O local, que está a cerca de 500 metros acima do nível do mar, concentra o maior número de pequenos agricultores e colonos na região que convivem com a seca.

“Por aqui, nós só tivemos 60 mm de chuva neste mês. Numa época dessas, é de se estranhar. O que preocupa é que muitas famílias dependem da água para tudo e simplesmente não está sendo suficiente”, desabafou o coordenador da Defesa Civil municipal, Antônio Fernandes, que guiou a visita da equipe da Defesa Civil estadual, formada pelos sargentos do Corpo de Bombeiros Militar Fernando Saraiva Marques Enisson Rodrigues de Freitas, às vicinais desabastecidas de água.

Na Vila Tamandaré, a 16 quilômetros da sede de Mucajaí, existe um poço artesiano que abastece os habitantes da localidade de água potável. Mas, ultimamente, os colonos que vivem nas vicinais próximas à vila também precisam utilizar o recurso.

Na vicinal 4, também conhecida como ‘Lago do Manoel’, vivem algumas famílias que necessitam se deslocar todos os dias para abastecerem no poço. “Todo dia precisamos buscar água lá [na Vila Tamandaré]. O poço do nosso sítio está baixo e não é suficiente para tudo que a gente precisa”, disse o produtor rural Mário Leal à reportagem da Folha. Ele e sua família trabalham numa pequena lavoura de mandioca. A matéria-prima é processada para a produção artesanal de farinha, que é vendida para as feiras de Boa Vista. “Está difícil”, desabafou, garantindo que a situação já esteve pior durante a estiagem. “Há uns meses atrás não tinha um pingo d’água”, complementou, apontando para o manancial.

A filha de Mário, a pescadora Chirlânia Pereira Leal, afirmou que no momento a solução viável é deslocar-se de carro até a sede da vila. “O poço que temos já é muito fundo, não tem como cavar mais. E a gente também não tem dinheiro para cavar outro. É muito caro”, observou.

Já na região da Serra Dourada, a cerca de 40 quilômetros de Mucajaí, a produtora rural Maria de Fátima Sousa esclareceu que o problema hídrico é recorrente desde a metade do ano passado, apesar de ter se intensificado recentemente: “Estamos com doze linhas e meia de roça de mandioca que plantamos no ano passado. Já era para estarmos colhendo. Mas não dá. As raízes não se desenvolveram porque o inverno não foi suficiente. As laranjeiras, que começaram a florescer, provavelmente não vão render muito fruto”, lamentou.

Maria de Fátima mencionou ainda que a falta d’água também incidiu nas poucas cabeças de gado que ela e sua família possuem: “Até o capim que a gente plantou está morrendo. Vamos ter prejuízo mais uma vez”. O coordenador da Defesa Civil municipal garantiu, durante a conversa, que alguns animais morreram de sede na região da Serra Dourada durante a estiagem.

A produtora destacou que a assistência da Defesa Civil pôde ‘segurar um pouco’ a problemática. “Estamos fazendo algo que nunca pensamos que íamos precisar aqui na Amazônia: economizar na água. Todo litro para a gente é precioso”, declarou Maria.

Durante a viagem, a Defesa Civil estadual passou pelas propriedades de algumas pessoas que haviam pedido auxílio previamente. Em algumas visitas, os terrenos estavam simplesmente abandonados, sem qualquer pessoa que cuidasse das roças, inclusive já próximas do período de colheita. Para o coordenador municipal, a situação é alarmante. “Em 98 eu estava aqui e não houve isso de maneira nenhuma. É verdade que teve muito fogo, mas nestes dois últimos anos, a coisa está muito feia. Essas pessoas não têm nem água para beber”, lamentou Antônio, referindo-se aos grandes incêndios que assolaram Roraima naquele ano.

Ele também acredita que o problema pode desencadear uma cadeia de eventos que incida diretamente na sociedade e na economia local. “Se continuar sem chover, com certeza a coisa vai piorar, pode esperar! E se o produtor desistir de cultivar, o Estado vai ficar carecido de tudo. Vamos ter gente sem emprego fugindo para capital. Além do que, vai faltar comida e o preço vai encarecer muito”, acrescentou. (J.P.P)

Distribuição de caixas de água pode amenizar futura estiagem

Mesmo que numa pequena escala, o coordenador da Defesa Civil de Mucajaí, Antônio Fernandes, propõe que, junto com a Defesa Civil do Estado, sejam instaladas algumas caixas d’água de 5 mil litros em lugares estratégicos das localidades. “Se fizermos como foi feito da última vez, deixando de casa em casa, vai ficar mais difícil e custoso. A gente precisa sentar para mostrar o problema e sugerir essa solução, conversando e para evitar um problema maior depois”, adiantou o coordenador.

Fernandes ressaltou que a parceria com a Defesa Civil do Estado, o Exército e os governos é muito importante no trabalho. “Tem que ser acompanhado de forma conjunta. Se nós não trabalhamos juntos, não tem como amenizar essa situação de jeito nenhum”, frisou. (J.P.P)