O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para proibi-lo de assentar colonos, abrir estradas ou incentivar a exploração de lotes do Projeto de Assentamento (PA) Jatapu, em Caroebe, na região Sul de Roraima. Esses locais ficam em área de sobreposição com a Terra Indígena Trombetas-Mapuera.
O MPF exige, na petição, que o Incra providencie urgentemente o reassentamento dos colonos fixados na área de sobreposição, preferencialmente, em outros lotes de Jatapu.
Em nota, o Incra informou que a criação do PA é anterior à demarcação da reserva indígena, e que está providenciando a retirada do único ocupante existente na área sobreposta. Ressaltou, ainda, que tão logo seja oficiado pela AGU (Advocacia-Geral da União), prestará todas as informações necessárias, para esclarecer os fatos em juízo.
A AGU, que representa judicialmente os órgãos federais brasileiros, confirmou que a autarquia foi intimada da ação. Afirmou, ainda, que aguarda subsídios da autarquia para se manifestar nos autos.
O órgão ministerial também pede na ação que o Incra informe os colonos fixados nesses lotes quanto à irregularidade de seu assentamento, determinando que não sejam abertos novos pastos e estradas, e que não haja supressão de vegetação.
Ademais, solicita que o Incra anule títulos e direitos deferidos a pessoas naturais e jurídicas sobre terras situadas na área da sobreposição, e promova o georreferenciamento da área do projeto Jatapu e redelimite sua linha poligonal, para excluir os lotes em interseção com o território indígena.
O MPF também pede que a autarquia seja obrigada a recuperar as áreas degradadas em decorrência do assentamento indevido e a indenizar os danos.
Além disso, o Incra deve indenizar os danos remanescentes, se verificada a inviabilidade de restabelecer o meio ambiente da terra indígena, no valor de R$ 10.742,00 por hectare, bem como o dano moral coletivo, decorrente do assentamento de colonos em terra indígena e dos prejuízos ao meio ambiente, aos povos indígenas e aos próprios assentados, no valor de R$ 300 mil.
Motivos da ação
Segundo a ação movida pelo procurador da República Alisson Marugal, a terra indígena é habitada de forma permanente e imemorial por grupos originários do chamado complexo cultural Tarumã/Parukoto. Ela se estende por Roraima, Amazonas e Pará, e a homologação de sua demarcação se deu em dezembro de 2009. Já a implantação do projeto Jatapu foi iniciada pelo Incra na década de 1980 e o assentamento foi gradualmente expandido.
O MPF esclarece na petição que a Terra Indígena Trombetas-Mapuera passou por interdição administrativa da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em novembro de 1987, tendo em vista a possível presença de povos isolados.
Foi no início dos anos 2000, quando foram realizados estudos de campo de identificação e delimitação, que se percebeu sobreposição entre a extensão Sul do PA e o perímetro da interdição administrativa.
À época dessa constatação, o Incra, a Funai e lideranças Wai-Wai chegaram a um acordo: por um lado, o perímetro da interdição administrativa seria redelimitado para preservar os lotes já ocupados pelo PA Jatapu. Por outro, o Incra excluiria os últimos lotes da vicinal 20, tendo em vista que ainda não tinham sido ocupados por colonos e que ali se localizava uma roça dos índios Karapawyana.
Apenas a Funai cumpriu o acordo, limitando a Trombetas-Mapuera à área homologada pelo decreto de dezembro de 2009 e excluindo os lotes já ocupados pelo assentamento Jatapu que estavam sobrepostos à terra indígena. O Incra, por sua vez, além de não excluir os lotes do final da vicinal 20, assentou novos colonos na área nos últimos anos.
Em 2019, a Funai encontrou uma roça instalada por não-indígenas dentro da terra indígena, no fim da vicinal 20. E em maio de 2020, constatou o prolongamento da estrada, o surgimento de várias ocupações de colonos e o desmatamento de 25 hectares com supressão total da vegetação nativa.