Cotidiano

Juiz vai lançar o livro ‘Nobre Deputado’

Autor da Lei Ficha Limpa foi quem escreveu o livro que contra a história de Cândido Peçanha, um político fictício declaradamente corrupto

O criador da Lei da Ficha Limpa, o juiz de direito Marlon Jacinto Reis, que está em Boa Vista para participar do 3º Encontro Luso Brasileiro de Direito Constitucional em Roraima, promovido pelo Centro de Estudos Jurídicos de Roraima (Cejurr), que está ocorrendo no auditório da Faculdade Cathedral, vai lançar em Roraima o livro “Nobre Deputado”, de sua autoria.
O livro conta a história de Cândido Peçanha, um personagem fictício que ensina como se compra um mandato, de onde vem o dinheiro e como se faz para ter certeza da eleição. “Este livro é um manual de como se comprar uma eleição. Apesar do personagem ter sido criado, os fatos não são fictícios, eles foram descobertos em entrevistas que eu elaborei para minha tese de doutorado com políticos que praticam essas condutas, que compram votos e apoio político, que desviam verba para ter dinheiro para fazer isso. Esse é o diferencial desse livro, ele foi escrito com base em relatos reais”, destacou
FICHA LIMPA – O magistrado fez uma análise sobre a Lei 135/10, mais conhecida como a Lei da Ficha Limpa, que foi criada poucos meses antes das eleições de 2010. A lei garante a punição aos cidadãos e candidatos que burlaram a lisura e a ética das eleições ou que tenham contra si condenações na esfera eleitoral, administrativa ou criminal.
A legislação dispõe de 14 hipóteses de inelegibilidades àqueles que nelas se enquadram, os quais são punidos com oito anos de afastamento das urnas como candidatos. A proposta foi aprovada pelo Congresso Nacional no dia 4 de junho de 2010, após receber as assinaturas de 1,3 milhão de brasileiros em apoio às novas regras.
Naquele ano, muitos pedidos de registro de candidatura para deputados, senadores e governadores foram negados pela Justiça Eleitoral em razão dos dispositivos contidos na Lei da Ficha Limpa. Os candidatos “fichas-suja” recorreram e os recursos chegaram ao Supremo Tribunal Federal (STF). Na época, o STF decidiu que a lei não seria aplicável, pois foi editada no mesmo ano da eleição. Devido à decisão tomada na época, o processo eleitoral deste ano será o primeiro em que a lei estará valendo.
O juiz Marlon Jacinto Reis afirmou que, desde a sua criação, ela não passou por muitas modificações. “A lei foi pensada exatamente para ter o conteúdo que tem hoje. Houve algumas alterações durante a tramitação no Congresso, mas elas foram de comum acordo com a sociedade. É uma lei muito boa que, lamentavelmente, às vezes não é aplicada, não por erros ou por brechas, pois ela não tem, mas por dificuldades interpretativas, talvez pelo fato de ser ainda muito recente”, analisou.
Reis destacou que a lei foi criada após manifestações da sociedade e de organizações que fazem parte do movimento de combate à corrupção eleitoral. “Ao transmitir essa ideia, eu e outros que lideraram o processo tínhamos o desejo de passar uma dupla mensagem para a sociedade. A primeira de que é possível fazer lei mesmo contra a vontade, pelo menos aparente, do Congresso nacional, quando a sociedade se mobiliza para conquistá-la. A segunda é que a política não pode ser exercida por qualquer pessoa. É preciso ter um perfil adequado à atividade política. Esse perfil não se compadece de pessoas com casos graves de violação à lei, especialmente em áreas da corrupção”, destacou o magistrado.
Conforme ele, o tema corrupção foi mais ressaltado após a Lei Ficha Limpa. Ele ressaltou que a sociedade está tendo mais elementos para identificar quem está enfrentando processos judiciais e quem teve condenações. “Isso tudo entrou no debate político, coisa que não acontecia antes e sempre eram vistas com naturalidade pessoas que foram condenadas ou então que renunciaram para escapar de cassações, ou que tinham contas rejeitadas pelos tribunais de contas. Sempre participaram normalmente das eleições sem causar nenhum tipo de debate sobre isso. Agora não. Agora isso é um assunto importante, politicamente relevante. Este é o maior mérito da Lei Ficha Limpa”, disse.