Os invasores da Fazenda Brasilândia, na região do Bom intento, zona rural de Boa Vista, continuam no local e alegam que não estão cometendo crime ambiental. Eles dizem que os proprietários não possuem título definitivo e que por isso a terra pertence ao Estado, logo, deveria ser destinada à agricultura familiar. A propriedade pertence à empresa Esmeralda, que tem com sócio o ex-secretário municipal de Saúde, Rodrigo Jucá, filho do senador Romero Jucá (PMDB).
Os ocupantes alegam ainda que estão há mais de um ano na área e que já se consideram posseiros de parte da fazenda, onde afirmam que darão continuidade à produção de frutas e hortaliças. Os argumentos dos ocupantes se baseiam no histórico e documentação atual da área. Segundo o presidente da Associação dos Produtores da Agricultura Familiar de Roraima (Asproagrifa), Ivan Ipuchima, a terra foi cedida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em 1991, sendo destinada à produção agrícola dentro de programas federais de reforma agrária.
“Inicialmente, a terra foi cedida para que se cumpra a função social, que é favorecer pessoas que não possuem local para plantar. Os que se dizem proprietários não têm título definitivo, e como era do Incra, hoje é do Estado, porque a União repassou recentemente glebas para Roraima. Então, se é do Estado, temos direito de produzir na região”, argumentou Ipuchima.
Para ele, a documentação que os proprietários possuem não é definitiva, porque se trata de um registro no Cartório de Imóveis. “Desde 1996 não se produz nada naquela área. A única produção que havia era a nossa, que foi destruída pelos agentes dos órgãos da Prefeitura quando houve reintegração de posse mediante alegação de ocupação de área de preservação ambiental”, frisou.
Ele disse que os ocupantes não cometeram crime ambiental porque estão numa parte mais distante dos mananciais, conforme prevê as leis ambientais. Citou a vala aberta pelos proprietários para impedir o acesso de invasores à área como causadora de danos ao meio ambiente. “A água escoa por essa vala para o igarapé Água Boa, levando todo tipo de impureza às águas”, afirmou.
Ivan Ipuchima reclamou da forma como a reintegração foi conduzida na semana passada. “Não fomos comunicados previamente. Chegaram de forma violenta e destruíram tudo que viram pela frente, de forma brusca, pondo em risco a integridade física dos que lá estavam”, afirmou.
PREFEITURA – A Empresa Municipal de Habitação e Urbanismo (Emhur) esclareceu, por meio de nota, que foram feitas visitas pelas equipes sociais orientando e solicitando a saída voluntária. “A atuação do município na ação é remover barracos e piquetes. No caso de resistência, a Guarda Municipal atua no sentido de garantir a integridade física dos fiscais”, diz.
FAZENDA – O advogado dos proprietários da fazenda, Rafael Pimenta, reforçou a legalidade da documentação da fazenda. Disse que o Incra cedeu a terra em 1991 para uma família tradicional de Roraima, quando foi titulada. “A terra é legalmente documentada e não é passiva de invasão”, disse ao informar que em 2008 a propriedade foi adquirida numa sociedade entre a empresa Esmeralda e pessoas, incluindo Rodrigo Jucá, quando já estava devidamente titulada. “O Judiciário tem de se manifestar e por um ponto final nisso”, frisou.
O CASO – A reintegração de parte da fazenda Brasilândia, que possui 2.400 hectares, foi realizada no dia 13 deste mês por guardas municipais, servidores da Secretaria Municipal de Gestão Ambiental e Assuntos Indígenas (SMGA) e da Empresa de Desenvolvimento Urbano e Habitacional (Emhur) por se tratar de ocupação em Área de Preservação Ambiental (APP).
A ação foi realizada após o Ministério Público Estadual (MPRR) instaurar procedimento para investigar o caso, baseado em denúncia anônima. A Lei nº 9.605/98 prevê crime ambiental qualquer intervenção nessas áreas, passível de pena de detenção de um a três anos, mais multa.
Mesmo assim, os integrantes do movimento voltaram a ocupar parte da fazenda no dia seguinte e permanecem até hoje. A área fica próxima ao igarapé Água Boa de cima. O processo de disputa movido pelos proprietários da terra tramita na 3ª Vara Civil da Justiça estadual e o juiz Bruno Fernando Alves ainda não decidiu o caso.
Iteraima investiga validade do título definitivo da Fazenda Brasilândia
O Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima) abriu procedimento administrativo para verificar se há irregularidade ou não na validade do título definitivo da Fazenda Brasilândia, no Bom Intento. No entanto, em nota, informou que a terra em questão é área particular. “Sendo assim, não cabe ao instituto qualquer intervenção quanto à retirada das famílias ou regularização dos lotes. Somente após a conclusão do procedimento será possível identificar se houve ou não irregularidades na concessão”, diz.
Esclareceu que recebe diariamente requerimentos de solicitação de lotes urbanos, os quais são analisados individualmente para apurar se as famílias atendem aos requisitos legais. De acordo com a nota, com a publicação da Lei nº 1063/16, no dia 16, de autoria do Executivo Estadual, que trata da regularização de terras do Estado em áreas urbanas, será possível identificar áreas para serem destinadas a famílias de baixa renda que se enquadrem nos requisitos legais.
“As famílias que desejarem ser contempladas com lotes urbanos para fins de moradia devem fazer a solicitação junto ao Iteraima e aguardar a análise do pedido, bem como a disponibilização de áreas a serem destinadas para assentamento, uma vez que a solicitação junto ao instituto não gera garantia de contemplação de lotes e nem direitos sobre áreas ocupadas irregularmente”, complementou.
Esclareceu ainda que o Iteraima não autoriza e nem compactua com invasões de áreas públicas ou privadas e que trabalha no sentido de coibir o crescimento de ocupações irregulares em áreas pertencentes ao Estado.