Expulsos da Terra Indígena Yanomami pelo Governo Lula, garimpeiros de várias nacionalidades começaram a migrar em massa para Uiramutã, ao Norte de Roraima. A destruição do meio ambiente provocada pela extração clandestina de ouro e diamante já é visível no Município com 96% de população indígena, maior percentual do Brasil.
Antes com águas cristalinas de cor verde-turquesa, a cachoeira do Urucá, um dos mais belos pontos turísticos do Município, distante a 13 quilômetros da sede, hoje virou uma poça de lama devido à garimpagem ilegal na região. A cachoeira Sete Quedas, o banho do Urucazinho e as corredeiras do Paiuá também sofrem com a poluição e já estão com água barrenta e suja.
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Indígenas de comunidades próximas denunciam a destruição do meio ambiente, provocada pelo garimpo desenfreado na região, mas nada podem fazer porque temem os garimpeiros, que geralmente guardam armas de fogo nos improvisados acampamentos de lona.
“A região do Urucazinho já foi tomada pelos garimpeiros, que utilizam maquinários pesados para extrair ilegalmente ouro e outros minérios preciosos, por isso a lama escorre desses garimpos e suja a água de cachoeiras, rios e corredeiras. Pior. Eles aliciam os indígenas mais novos para trabalhar na extração”, denunciou um indígena, que preferiu não se identificar por medo de represália.
Ainda na região, acima do Urucazinho, os garimpeiros perfuraram uma serra, de onde retiram, segundo apurações, quilos de ouro por mês. A reportagem assistiu, mas não conseguiu obter o vídeo que mostra várias seções dentro da mina, que tem a entrada camuflada para dificultar a ação dos órgãos de fiscalização.
Garimpeiros clandestinos usam até sentinelas na sede
Os “olheiros”, como são chamados, são responsáveis por avisar por rádio comunicador quando os órgãos federais chegam ao Município para fazer alguma operação contra o garimpo ilegal. Eles também participam de grupos locais de WhatsApp, onde falam abertamente sobre a prática criminosa e as operações federais.
“Quando há operação, o olheiro passa as informações antecipadas aos garimpeiros, que enterram os motores e desmontam o acampamento rapidamente. É por isso que os fiscais chegam lá e não encontram nada, não apreendem nada, mas quando eles vão embora, os garimpeiros desenterram os motores e voltam à atividade ilícita”, informou o indígena.
Levantamento feito por moradores da região aponta que já são mais de dez motores potentes utilizados por garimpeiros clandestinos em Uiramutã. Um dos donos do maquinário já construiu até casa de alvenaria na sede. Há também um ponto de apoio dos garimpeiros, que funciona como oficina para ao quadriciclos que circulam na região.
“Os garimpeiros chegam dizendo que vão trabalhar na Guiana, onde o garimpo é liberado, mas muitos deles estão explorando as terras indígenas do Uiramutã. Olha só como estão nossas cachoeiras, rios e outros mananciais, visivelmente poluídos. O crime ambiental é explícito, infelizmente”, lamentou o macuxi.
Da sede do Uiramutã até a fronteira com a Guiana, na comunidade indígena Uiramutã Ken, são apenas três quilômetros até o rio Maú, divisor da fronteira. Os indígenas montaram uma barreira de fiscalização na comunidade para evitar a passagem de drogas e outros ilícitos, mas no período de seca na região, o rio pode ser atravessado a pé, o que facilita a entrada de garimpeiros estrangeiros no Município.
Garimpeiro confirma atividade ilícita
Na condição de anonimato, um garimpeiro aceitou conversar com a reportagem esta semana. Com mais de 60 anos, ele contou que foi expulso pelos federais junto com outros de uma região de garimpo clandestino no rio Uraricoera, na Terra Indígena Yanomami, em Alto Alegre, ao Norte do Estado.
“Então, viemos trabalhar aqui no Uiramutã e na Guiana, pois falaram que esta região tem muito ouro e diamante. O meu trabalho é esse. Não sou bandido, sou apenas um trabalhador brasileiro que sonha em bamburrar (ficar rico com o garimpo)”.
Mas questionado sobre o garimpo em terra indígena, que é proibido no Brasil, o garimpeiro se esquivou e preferiu não responder. Ele chegou à sede do Uiramutã e se alojou na casa que serve como ponto de apoio aos garimpeiros.
Múltiplos impactos
O garimpo ilegal no Uiramutã já está causando múltiplos impactos na vida social dos indígenas. Além da degradação ambiental, a exploração clandestina de minérios preciosos na região também atinge a saúde e a cultura do povo macuxi.
“Os igarapés e rios já estão poluídos e nossas crianças adoecem porque estão bebendo água suja. Os mais jovens também estão deixando nosso modo de vida porque são aliciados pelos garimpeiros. Eles bebem cachaça e usam outras drogas no garimpo”.
Outro problema que preocupa as comunidades é o assédio sexual de garimpeiros contra jovens indígenas. Já existem relatos do crime em Uiramutã, principalmente na região do Baixo Cotingo. “É preciso combater tudo isso antes que a situação saia do controle, como ocorreu na terra dos parentes (Yanomami)”, alertou o indígena.
O que dizem as autoridades
Procurada, a Polícia Militar (PMRR) em Uiramutã disse atuar de forma ostensiva, garantindo a ordem pública e a segurança das pessoas que frequentam as cachoeiras.
Ademais, a PM disse que a poluição das águas e outros crimes ambientais são assunto de competência de órgãos federais, como a Polícia Federal (PF) e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Biodiversidade).
O ICMBio, no entanto, disse que sua atuação se limita às unidades de conservação federais.
A PF, o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério dos Povos Indígenas e a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) ainda não comentaram o assunto.
*Com colaboração de Lucas Luckezie