Cotidiano

Com o avanço do tráfico, prédios públicos viram morada de viciados

Antigo prédio do Centro Social do Buritis há anos vem sendo usado por viciados, onde inclusive dois corpos já foram encontrados

Moradores do bairro Buritis, zona Oeste, procuraram a Folha para denunciar a situação do prédio abandonado do extinto Centro Social do Buritis, localizado na Rua João Pedreiro, que vem sendo utilizado há alguns anos como moradia e ponto de encontro de drogas. Aquela área concentra outros prédios abandonados, inclusive particulares, que se tornam “feira-livre” de drogas quando anoitece.

No Centro Social do Buritis, onde antigamente havia cursos profissionalizantes e atividades recreativas para crianças, o cenário é de lixo acumulado, janelas e portas quebradas, garrafas de bebidas espalhadas e mau cheiro. Entre um bloco de salas para o outro, o que antigamente deveria ser uma área de convivência, quatro pessoas conversavam. Todos confirmaram a dependência química.

“Eu não vou mentir, porque vocês já sabem mesmo. A gente usa droga sim, mas aqui ninguém faz mal”, confessou um deles, de 42 anos. Entre os usuários havia uma churrasqueira improvisada com tijolos no chão e uma panela com comida. Nas antigas salas de aulas, algumas roupas penduradas em varais, um isopor, lixos e outro homem dormindo no chão.

“A gente não mora aqui, não. Aquele outro rapaz [disse apontando para o homem dentro da sala de aula] mora aqui há pelo menos uns quatro anos. Mas a gente passa muito tempo aqui. Às vezes a polícia vem, bate na gente, inclusive na mulher, expulsa, mas depois a gente volta. Uma vez veio uma viatura e os policiais foram até ‘gente boa’. Disseram que se a gente mantivesse limpo isso aqui, sem arrumar confusão com ninguém, poderíamos ficar. É o que a gente tem feito”, relatou o homem.

A mulher, de 26 anos, confirmou a história narrada pelo amigo. “Não fazemos nada para ninguém do bairro. Só ficamos aqui porque não temos para onde ir”. Quando questionada se aceitaria ajuda de terceiros para largar o vício, a mulher disse: “Sim, mas aqui ninguém quer ajudar a gente, não.”

Um dos usuários afirmou ter passado dez dias no Centro de Atenção Psicossocial (CAPs), mas não obteve resultados. “Não adianta. Lá dentro não davam nenhum remédio e nem nada que fizesse a gente esquecer a droga”, disse.

No final do corredor, uma das paredes estava completamente queimada, a sala destruída e marcas de incêndio seguiam até o teto da instituição abandonada. A Folha foi conferir de perto, acompanhada pelo usuário.

“Isso aí, quem ‘tacou’ fogo foi aquele homem que morreu esse ano. A polícia encontrou o corpo dele no meio do mato. Ele brigou com alguém, pegou um sofá e ‘tacou’ fogo. Depois foi encontrado morto. A gente não sabe do resto”, disse o homem, relatando o caso ocorrido em março deste ano.

Na ocasião, a Polícia Civil foi acionada depois de uma denúncia sobre um corpo em decomposição nas dependências do prédio. Essa não foi a primeira vez que um cadáver foi encontrado. Em novembro do ano passado, a polícia foi acionada por conta de um suicídio no mesmo local.

GOVERNO – A Folha entrou em contato com o Governo de Roraima para saber sobre o abandono do local e obteve a seguinte resposta através de nota: “A Secretaria Estadual de Educação e Desportos (Seed) informa que, em outras gestões, o prédio do Centro Social do Buritis foi cedido para o Município de Boa Vista para o funcionamento de uma escola. Logo depois, a unidade escolar passou a funcionar em instalações próprias e o prédio foi abandonado, sendo retomado novamente para Seed.”

A respeito da estrutura, o governo informou que no momento seria inviável a reforma do prédio por conta da situação financeira do Estado. “Mas está previsto no Plano Plurianual (PPA) de 2016 a 2019 a reforma de todas as unidades descentralizadas da Seed. As reformas serão feitas de acordo com a ordem de prioridades. Sobre a limpeza, a equipe de Divisão de Infraestrutura da Secretaria faz limpeza e capina no local uma vez por mês.”

Moradores dizem que estão inseguros

Após deixar o prédio abandonado, a Folha percorreu a Rua João Pedreiro e conversou com moradores. Em uma residência próxima, um rapaz afirmou que é constante a entrada de usuários de drogas no local. “Moro aqui há um ano, mais ou menos, e isso acontece todos os dias. Uma vez sumiram algumas coisas daqui de casa, mas não posso afirmar com certeza que foram as pessoas que frequentam aí dentro [referindo-se ao Centro Social abandonado], por isso, hoje temos vários cachorros em casa”, disse.

Outro afirmou que mora na rua há mais de três anos e, até hoje, não se sente seguro. “Temos crianças aqui e vivemos sobressaltados. Não nos sentimos seguros. Já sumiu bicicleta dos vizinhos, tênis e outras coisas.

Se foram os usurários de drogas, a gente não sabe. Às vezes, vemos a polícia chegando, passam horas aí dentro, mas não adianta nada. Há alguns meses, uma mulher que falava espanhol saiu de dentro do prédio afirmando ter sido levada para lá à força e ter sido estuprada em seguida. Ela correu para outra rua e depois nunca mais a vimos”, disse.

Prédio abandonado de dois pisos se torna ‘feira-livre’ do tráfico

Próximo ao Centro Social Buritis, já na movimentada Avenida Mário Homem de Melo, exatamente ao lado do prédio do 2º Distrito Policial, que está em reforma, e a poucos metros da Feira do Buritis, um prédio particular abandonado de dois pisos se tornou ponto de encontro de viciados à noite.

A ocupação do local pela “feira-livre do tráfico” começou quando o prédio do 2º DP entrou em obras há mais de dois anos. Atualmente encontra-se abandonado. O Governo do Estado não respondeu à Folha sobre a obra paralisada.

Nesse imóvel de dois pisos funcionava uma clínica e uma maternidade particular. A poucos metros dali, segundo a vizinhança, funcionaria uma boca de fumo onde inclusive um policial militar foi assassinado em um possível acerto de conta, na noite do dia 17 passado.

Conforme uma moradora que procurou a Folha para denunciar o problema, toda a noite o prédio fica tomado por pequenos traficantes e viciados. A Folha tentou contatar o proprietário do imóvel, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria, às 17h20.

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