Cotidiano

Cenário roraimense para próximo ano não é otimista

Estado onde 50% do PIB é oriundo da administração pública, nível da crise fiscal pode ser ainda mais aguda, já que retomada das contas depende da volta do crescimento econômico do país

Por Leo Daubermann

A recessão atingiu em cheio as contas do executivo estadual e Roraima não consegue mais manter a máquina pública. Não há dinheiro nem mesmo para cumprir com o pagamento de fornecedores e da folha salarial para os servidores públicos. O cenário para 2019 não é dos mais otimistas, é necessário um ajuste fiscal eficaz. A afirmação é do economista Eloi Senhoras.

A lei de responsabilidade fiscal, de acordo com o economista, cria limites para gastos com pessoal e, no caso de Roraima, esse limite já foi ultrapassado. “Roraima é o estado que mais gasta com a folha de pagamento em relação ao orçamento, às receitas que recebe. É necessário enxugar uma série de ‘gorduras’ que estão ligadas à própria economia do contracheque, então, demissões de cargos comissionados vão se fazer cada vez mais necessárias em função da própria lei de responsabilidade fiscal”, destaca Senhoras.

Além da diminuição na folha de pagamento, o economista não vê a possibilidade de realização de concurso público em 2019. “Além de cortes de comissionados e eventualmente em cortes de funções de confiança, é de esperar, naturalmente, pelos próprios dispositivos da lei de responsabilidade fiscal a impossibilidade de se realizar concursos públicos, inclusive, aqueles que estão abertos para serem realizados no início do ano que vem, podem ser comprometidos”, ressalta.

“Um outro elemento natural e que já vem acontecendo é um forte desinvestimento em obras de infraestrutura, as poucas obras infraestruturais que nós temos hoje no estado de Roraima são oriundas de consórcio com o próprio governo federal. Não existe um investimento do orçamento público, então é de se esperar cada vez mais, também, uma série de cortes neste setor, em 2019”, salienta o economista.

Um estado onde 50% do PIB é oriundo da administração pública, vindos diretamente de transferências federais, o nível da crise fiscal pode ser ainda mais aguda, já que a retomada das contas depende da volta do crescimento econômico no país. “É importante salientar que o biênio 2019/2020 não apresenta nenhum cenário otimista para uma volta do crescimento econômico nacional, principalmente em relação aos EUA e China e com isso o Brasil, sendo um país altamente dependente do cenário internacional, acaba tendo um processo de volta do crescimento econômico comprometido também”, disse o economista.

FECOMÉRCIO – O que movimenta e aquece o mercado roraimense ainda é o salário dos servidores públicos. Com o atraso nos pagamentos cada vez mais constantes, o dinheiro não gira e o comércio é afetado diretamente. De acordo com o assessor econômico/financeiro da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Roraima, Fábio Martinez, o ano de 2018 já iniciou fraco. “No ano passado a gente teve um momento melhor para o comércio. Neste ano já foi um pouco mais fraco, e antes mesmo desses atrasos nos pagamentos a gente já havíamos percebido essa queda”, disse.

Ainda de acordo com Martinez, o comércio iniciou uma retomada do crescimento, principalmente em geração de emprego, nos últimos dois meses. “Mês retrasado foi um mês bom para o comércio, só que, depois desse momento bom, veio essa crise na administração pública, que acabou afetando diretamente o comércio. O que a gente verifica é que muitos destes que dependem da administração pública direta ou indiretamente, acabam postergando os seus gastos”, ressalta.

No entanto, Martinez destaca que existem outros segmentos, como o turismo, por exemplo, que vem crescendo em Roraima. “Só para ter noção o turismo já representa 8% da geração de empregos aqui no estado, e ainda não está sentindo muito esse impacto. Até porque, depende mais de pessoas que vêm de fora, então ele acaba não sendo tão influenciado como o comércio tradicional é, aqui em Roraima”, destaca.

FIER – Outro setor que é diretamente afetado com a atual crise financeira é o setor da indústria. De acordo com a coordenadora técnica da Federação das Indústrias do Estado de Roraima (Fier), Karen Telles, mesmo com o crescimento da participação da indústria na composição do PIB estadual, a maior parte da renda circulante em Roraima vem da remuneração do funcionalismo público. “Com o atraso do pagamento dos servidores, um efeito cascata afeta todos os setores da economia”, diz.

“Nosso parque industrial é diversificado, com mais de 20 segmentos em atuação, mas a predominância é de micro e pequenas empresas. Grande parte delas, além de transformar e beneficiar os produtos, também os comercializa diretamente para o consumidor ou para empresas do comércio local. Sendo assim, quanto menor for o poder de compra do roraimense, maiores serão os impactos negativos para as empresas”, destaca Telles.

De acordo com a pesquisa que mede o Índice de Confiança do Empresário Industrial e a Sondagem Industrial em Roraima (Fonte: CNI/Fier), existe preocupação do setor em relação a uma recuperação capaz de alavancar os negócios. Mesmo registrando 63.3 pontos, índice acima da pontuação considerada negativa (-de 50 pontos), os empresários temem que este final de ano tenha um desempenho pior do que o do ano passado.

FAERR – De acordo a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Roraima (Faerr) há segmentos na agropecuária, como o da soja ou a criação de tambaquis, com grande parte da produção comercializada em Manaus, que não são afetados diretamente pela crise fiscal do estado.

“Entretanto, a queda do poder aquisitivo de uma parcela substancial da população economicamente ativa ocupada, no caso os servidores públicos e os terceirizados, afeta o consumo, ainda que os produtos alimentares básicos sejam evidentemente priorizados nas decisões de compra, quando ocorrem situações de crise”, destaca o presidente da Faerr, Sílvio de Carvalho.

O presidente da Faerr destaca ainda que a agropecuária empresarial, familiar e indígena é o único setor da economia roraimense com capacidade de multiplicar sua participação no PIB em poucos anos, reduzindo, portanto, o peso relativo da administração pública na composição do produto interno bruto. “É o setor capaz de gerar mais riquezas, divisas e empregos, tanto diretos como, sobretudo, indiretos, pelos efeitos virtuosos que exerce sobre os demais setores da economia – indústria, comércio e serviços. Mas para que esse crescimento ocorra é necessário o comprometimento da administração pública”, completa Carvalho.