OPERAÇÃO ACOLHIDA

Acolhida: Empresa é acusada de reduzir ilegalmente custos para vencer contrato milionário

ISM diz que denúncia foi arquivada no TCU, apontou falta de respaldo na representação e afirmou que processo foi conduzido dentro da legalidade

Abrigo da Operação Acolhida (Foto: Arquivo FolhaBV)
Abrigo da Operação Acolhida (Foto: Arquivo FolhaBV)

Investigada por servir comida de má qualidade em presídios do Ceará, a ISM Gomes de Mattos LTDA ganhou licitação da Operação Acolhida para fornecer marmitas para os migrantes venezuelanos dos abrigos de Boa Vista e Pacaraima, em Roraima. Com isso, a empresa cearense foi denunciada por reduzir custos de forma ilegal para vencer o processo licitatório de R$ 161.974.225,00.

Em representação de 210 páginas, a antiga fornecedora do serviço, Paladar Nutri, pediu que o Ministério Público Federal (MPF) e o Tribunal de Contas da União (TCU) recomendem a imediata suspensão do processo de contratação até que as supostas irregularidades sejam apuradas. A justificativa é que a atuação da nova empresa poderia causar prejuízos aos cofres públicos. O TCU arquivou a denúncia por não ver risco de dano ao erário e irregularidade na licitação.

A Paladar mantinha vínculo contratual com o governo federal para fornecer alimentação para os abrigos das duas cidades – o contrato de Boa Vista venceu em 27 março, enquanto o de Pacaraima termina na quarta-feira (10). A empresa mato-grossense demonstrou interesse em renová-lo e reclamou que o Ministério da Defesa não apresentou clara justificativa ao negar a prorrogação.

Procurada, a ISM encaminhou o acórdão do TCU e afirmou “inexistir respaldo técnico e fático” nas alegações da Paladar, a quem acusa de usar “subterfúgios para tentar descredibilizar processo licitatório idôneo”. Além disso, defende que o processo foi conduzido dentro da legalidade (confira a nota completa ao final da reportagem). O Ministério da Defesa ainda não comentou o assunto.

O que diz a representação

A denúncia da Paladar aponta ilegalidade no planejamento alimentar proposto pelo Ministério da Defesa, o qual foi assinado por técnica nutricionista de fora da jurisdição que inclui Roraima, e ainda por duas pessoas sem especialização na área. A empresa também considera que o plano não atende adequadamente às necessidades calóricas diárias para reverter o quadro de desnutrição dos migrantes, especialmente crianças, idosos e indígenas, ao excluir os cardápios específicos dos públicos. “Isso pode resultar em agravamento dos danos à saúde desses comensais”, enfatiza sobre violações de direitos.

A denuncia aponta que o edital do processo foi baseado em estudo limitado a um grupo de homens saudáveis de 20 e 24 anos, em que a quantidade de gramas e calorias nas refeições foi reduzida, e que alimentos essenciais, como o leite para as crianças, foram retirados.

A empresa ainda alega que o contrato com a ISM reduz o tamanho das refeições. Na nova tabela sem restrição alimentar, a quantidade de feijão cai de 130 para 50 gramas; a de salada, de 120 para 20 gramas; e a de proteína, em vez de 180 gramas, terá de 83 até 200 gramas. Enquanto no contrato anterior previa 200 mililitros de suco, o atual não especifica. O novo mantém uma sobremesa e os 150 gramas de arroz.

O atual cardápio com restrição, por sua vez, retirou o feijão e o suco, e ainda diminuiu os 180 gramas de proteína para o máximo de 50 gramas, e os 120 gramas de salada para 20. A sobremesa agora é especificada para até 300 gramas. Por outro lado, o novo vínculo aumentou a quantidade de arroz integral, de 150 para 160 gramas.

Outra ilegalidade apontada é a falta de assinatura no documento editalício e uma possível pressa do Ministério da Defesa em habilitar a ISM na concorrência. “Observa-se uma precipitação descabida na habilitação da licitante ISM e assim desconsiderando a legislação vigente”, pontuou.

Sobre a ISM, a Paladar a acusa de reduzir custos para vencer a licitação, ao diminuir a qualidade dos alimentos oferecidos sem considerar os impactos para a saúde dos migrantes, e incluir nos custos pré-operacionais de sua proposta alíquotas de PIS/Pasep e Cofins menores que as previstas pela legislação. A denunciante calcula que, neste caso, a ISM poderia sonegar anualmente R$ 2.642.872,84 em impostos.

Nota completa da ISM

“Quanto ao processo licitatório em andamento, informamos tratar-se de licitação sob a modalidade pregão eletrônico, cujo critério de seleção adotado foi o de “menor preço”. Contemplou ainda, uma divisão em 6 (seis) lotes, cujo licitantes dispunham de discricionaridade de participação em um ou mais lotes.

Respetivo processo tem por objetivo a contratação de empresas especializadas na prestação de serviços de alimentação, para atendimento as demandas da Operação Acolhida nas cidades de Boa Vista e Pacaraima.

A licitação foi conduzida pelo próprio Ministério da Defesa por meio eletrônico, através do Portal de Compras do Governo Federal, resguardada sua divulgação prévia no Portal Nacional de Contratações Públicas.

O processo registrou a participação de um total de 41 (quarenta e uma) empresas de
diversas regiões do país, sagrando-se ao final da fase de lances, pela oferta do “menor preço” 3 (três) empresas vencedoras.

No caso, a empresa ISM GOMES DE MATTOS LTDA sagrou-se vencedora de 3 lotes e outras duas empresas sagraram-se vencedoras dos demais lotes do certame. A condução do certame avaliou de forma aprofundada as propostas e a exequibilidade dos seus preços, inclusive assistida pelos setores técnicos do próprio Ministério da Defesa.

Importante destacar que, os preços registrados no respectivo processo licitatório encontram-se abaixo dos preços atualmente praticados, situação caracterizadora da consecução do interesse público, dado a obtenção de propostas mais vantajosas para a Administração Pública.

Em síntese, o presente processo foi conduzido dentro da mais estrita legalidade em consonância para com as normas e princípios da Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos) resguardada a ampla participação de qualquer empresa nacional ou internacional, culminando ao final com a obtenção de propostas de maior vantajosidade econômica, ou seja, de menor preço que os atuais contratos.

DA INEXISTÊNCIA IRREGULARIDADES NO PROCESSO E POSSÍVEIS DANOS AO ERÁRIO

A respeito das denúncias protocolizadas pala empresa PALADARNUTRI LTDA (CNPJ 29.369.516/0001-90), reforçamos inexistir respaldo probatório fático e técnico as suas alegações.

Tratando-se o caso de irresignação da empresa, para com o resultado do certame, dado outras 3 (três) empresas terem ofertado preços mais vantajosos que a atual contratada.

Nestes termos, comunicamos que o Tribunal de Contas da União já proferiu decisão em sessão plenária, registrada sobre o ACÓRDÃO 371/2024 (TC – 002.915/2024-3) quanto a representação proposta pela empresa PALADARNUTRI, considerando-a totalmente improcedente.

Em sua avaliação, considerou os seguintes apontamentos:

Após a avaliação do Tribunal de Contas da União, conclui-se pelo não conhecimento da representação proposta pela empresa PALADARNUTRI LTDA, inexistindo veracidade aos apontamentos suscitados pela representante.

Observa-se que, ficou claro na decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União inexistir prejuízo ao erário, considerando que os preços propostos no certame ficam abaixo do valor atualmente contratado com a PALADARNUTRI LTDA.

Acerca da prorrogação dos contratos administrativos, ressaltamos que tal situação insere-se dentro do patamar de discricionaridade da Administração Pública, conforme posição já exarada pelo Tribunal de Contas da União no acórdão 2660/2021 de relatoria do Ilustre Ministro Benjamin Zymler:

Não há direito líquido e certo à prorrogação de contrato celebrado com o Poder Público, mas sim mera expectativa de direito, uma vez que a decisão sobre a prorrogação do ajuste se insere no âmbito da discricionariedade da Administração Pública. Acórdão 2660/2021-Plenário | Relator: BENJAMIN ZYMLER (grifos nossos).

Logo, a efetivação de novo processo licitatório não constitui qualquer ofensa aos preceitos legais aplicáveis as “Licitações Públicas”. Constitui-se na realidade, uma necessidade da administração de promover alterações no serviço atual, bem como, na busca por melhores propostas e preços.

No caso, identificamos que tais objetivos foram alcançados. Considerando que os preços ofertados pelas 3 (três) empresas que se sagraram vencedoras no certame, estão abaixo do preço atualmente contratado.

DAS DIRETRIZES NUTRICIONIAIS PRECONIZADAS NO PROCESSO LICITATÓRIO

Os serviços a serem contratados e executados, tem suas especificações pré-estabelecidas no termo de referência do processo, constituído com base em “Planejamento Alimentar” do Ministério da Defesa que contempla diretrizes dietéticas para diversas pessoas e condições, assegurando o fornecimento adequado de macronutrientes.

Diferentemente do que sustenta a denunciante, o planejamento alimentar constituído na fase interna do presente processo licitatório, contempla diretrizes dietéticas condizentes ao atendimento das necessidades dos indivíduos, inclusive com previsão para atendimento a condições especificas, como por exemplo “diabetes”.

Observa-se que, diferentemente do que alega a PALADARNUTRI, o planejamento alimentar que embasa as diretrizes técnicas dos serviços, preconiza o atendimento e fornecimento de dietas variadas e condizentes com diversas condições de saúde.

Acerca do fornecimento de alimentação para crianças, informamos que houve por parte de Ministério da Defesa a constituição de processo licitatório específico (Pregão Eletrônico 34/2023) para o atendimento desse grupo alimentar dentro dos abrigos, preconizando diretrizes dietéticas compatíveis com os indivíduos.

Em conclusão, a ISM GOMES DE MATTOS LTDA reafirma seu compromisso inabalável com a integridade, a ética e a transparência em todas as suas operações. O exame minucioso das nossas práticas e a subsequente validação de nossa conduta pelo Ministério Público do Estado do Ceará são testemunhos de nossa dedicação a uma atuação empresarial responsável e alinhada com os mais altos padrões de governança corporativa.

Fortaleza/CE, 05 de abril de 2024.”